A tal da Síndrome do Pânico – Parte V

por Luís César Ebraico

O tratamento medicamentoso da síndrome do pânico sem se levar em conta o transtorno em que essa síndrome aparece, é meramente paliativo, podendo, em alguns casos, ser perfeitamente dispensável.

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No texto anterior (clique aqui), apresentei os sintomas da síndrome do pânico.

Desses sintomas, Emmet, logo ao entrar em terapia comigo, reconheceu os seguintes como seus:

1. ataques paroxísticos de angústia;
3. taquicardia
7. sentimentos de irrealidade
7.2. ou ao ambiente (desrealização)
8. medo de
8.1. morrer
8.2. perder o controle
9. tremores
12. dispnéia (dificuldade de respirar)
13. problemas digestivos (azia)
14. suor excessivo (hiperidrose) ou ataques de suor
14.1. frio
15. mãos e pés frios
20. necessidade frequente de urinar
21. prisão de ventre
27. insônia,
28. agorafobia (medo de ficar em lugares onde seria difícil receber ajuda, no caso de um ataque de pânico).

Destes sintomas, apenas os tremores não me foram relatados, mas o contato com Emmet me fez ver que estavam presentes. Os *ataques paroxísticos de angústia, a taquicardia, o medo de morrer e de perder o controle, a dispnéia e a agorafobia eram extremamente intensos, capazes de produzir um nível de incômodo suficiente para PARALISAR A VIDA de Emmet, levando-o, por exemplo, a ter que ser acompanhado por alguma pessoa – preferencialmente a mãe – em suas tentativas de ir à rua.

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Estamos com três meses de psicoterapia. Meu contato com ele sugeriu que sua SP (= Síndrome de Pânico) era devida a um Transtorno Fóbico-Ansioso, seja, a uma descarga de ***hipertonia simpática devida a um alerta ciberneticamente produzido (= produzido por INFORMAÇÃO). Cabia, portanto, tentarmos chegar ao tipo de estímulo que, desencadeava a Síndrome do Pânico.

Aparentemente, conseguimos. Isso ocorreu a partir da investigação do desencadeante de seu primeiro ataque de angústia, ocorrido cerca de cinco anos atrás, quando tinha dezoito anos e estava em seu segundo ano de uma terapia que durou cinco.

O primeiro ataque de pânico de Emmet ocorreu após ele haver assistido a um filme cujo conteúdo essencial era a luta de seu protagonista para reverter a ação sobre ele próprio de um novo processo científico, a que espontaneamente se submetera, que o faria esquecer de tudo que dizia respeito a uma sua relação amorosa, traumaticamente encerrada.

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O eixo essencial de conflito do protagonista era, portanto, entre (1) MANTER-SE LIGADO e (2) DESLIGAR-SE e ver o filme ativou fortemente o mesmo conflito em Emmet, o que desencadeou o ataque.

Um detalhe. Emmet nasceu de cesariana. Esse tipo de parto, em que a passagem do útero para o mundo externo é, por vezes, feito de forma extremamente inesperada e abrupta, deixa em seu rastro uma matriz agorafóbica, que pode atingir, ao longo da história do sujeito, níveis mórbidos ou não.

Pois bem, em Emmet, esse nível mórbido foi atingido e DESLIGAR-SE tende a provocar agorafobia, o que ativa, em contrapartida, um forte impulso reativo de LIGAR-SE de forma excessivamente radical, o que lhe deixa claustrofóbico. Quando algum evento (= **momento traumático secundário) ativa, para além de certo nível, o conflito entre essas duas tendências, desencadeia-se o ataque de pânico.

Levantada essa hipótese, pedi-lhe que, entre uma sessão e outra (à razão de duas vezes por semana até meados de março presente, e à de uma vez por semana a partir de então), voltasse sua atenção para situações em que reconhecesse a presença desse conflito. Logo começaram a jorrar lembranças, sonhos e associações.

Um dos materiais mais significativos dentre os que ele, a partir dali, produziu dizia respeito a um anel (= símbolo de compromisso), que havia comprado para si e para uma ex-namorada, a de quem se separara de forma traumática, analogamente ao que ocorrera com o protagonista do filme.

Transcrevo, a seguir, palavras do próprio Emmet sobre o episódio do anel.

“Oi, Ebraico, lembrei-me de outro fator que pode ser interessante. … Lembro que na época em que namorei com X. Eu comprei o tal do anel de compromisso … [Quando passei a usá-lo,] comecei a me sentir mal e preso com ele. Acredito mesmo que a sensação de sufocamento produzida pelo uso do anel foi um dos motivos que me fizeram terminar o relacionamento com ela.

Mas tem um detalhe … interessante, eu mesmo depois que tinha terminado, fiquei com o anel no dedo, mas, em vez deixá-lo no anelar, passei o anel para o dedo indicador e comecei a sair com outra mulher por um bom tempo, com o anel no dedo indicador. Eu gostava daquilo,Não sei por que diabos eu não me lembrei disso antes.”

Como não se trata, aqui, de fazer relato de caso, a referência ao episódio do anel foi aduzida apenas para ilustrar o tipo de material que passou a vir para a consciência de Emmet, após havermos voltado nossa atenção para o eixo LIGAÇÃO-DESLIGAMENTO e para as correlações desse eixo com

(a) claustrofobia;
(b) agorafobia; e
c) pânico.

Vale notar como, no episódio relatado, Emmet “conciliou” as tendências a ligar-se e desligar-se, continuando a usar, não no “dedo de compromisso”, o “anel de compromisso”…

Do relatado, para nossos atuais propósitos, interessa fundamentalmente o seguinte:

Emmet começou terapia comigo no início de dezembro, quando:

(1) tomava 3mg de Lexotan (bromazepan) ao acordar e mais 3mg antes de deitar e
(2) os ataques de pânico ocorriam à razão aproximada de duas vezes por semana.

Conforme foi voltando sua atenção para o eixo conflitual mencionado:

(1) o ritmo de ocorrência dos ataques se foi reduzindo e, desde o INÍCIO DE MARÇO que NÃO SOFREU MAIS NENHUM, isso a despeito de
(2) haver por iniciativa própria reduzido a dosagem de ingestão de bromazepan ao deitar para 1,5mg.
VI

Os casos de Pedro e de Emmet, por mim trazidos à baila, ilustram o conteúdo da ladainha relativa à Síndrome de Pânico, que, até que me convençam de que estou errado, não me canso de repetir:

O tratamento medicamentoso da síndrome do pânico sem se levar em conta o transtorno em que essa síndrome aparece, é meramente paliativo, podendo, em alguns casos, ser perfeitamente dispensável.

*Ataques paroxísticos de angústia: Refere ao clímax de qualquer experiência psicológica. Um ataque "paroxístico" de angústia significa que ela chegou a um ápice em que todos seus sintomas – angústia, taquicardia, sudorese, expectativa de morte, etc. – atingiram um nível máximo. Ou seja, "intensos surtos de angústia", por exemplo.

** Momento traumático secundário: Se uma mulher, por exemplo, é estuprada por um grupo de homens vestidos de camisa vermelha, a visão posterior de pessoas com camisas vermelhas ativa a lembrança da experiência do estupro (evento traumático primário) e a isso chamamos de "momento traumático secundário".

*** Hhipertonia simpática: O sistema nervoso – isso, a maior parte das pessoas sabe – se divide em voluntário (o que, por exemplo, me permite comandar minha mão para digitar o que estou digitanto) e involuntário (o que comanda, por exemplo, o ritmo de meus batimentos cardíacos e a quantidade de suco gástrico liberada em meu estômago). Esse último ramo do sistema nervoso, o involuntário, se subdivide em simpático e parassimpático. O parassimpático é o sistema que deve comandar, por assim dizer, em "situações normais de temperatura e pressão"; o simpático é o que deve tomar comando em situações emergência. Quando há uma "hipertonia simpática" o sujeito vive em clima de emergência, mesmo quando não há emergência real. Não é, certamente, o melhor dos mundos.