Quando somos induzidos a fazer parte do todo

por Samanta Obadia

Após dois longos anos de trabalho, tive uma semana de férias, contemplada com uma viagem para *Aruba, bem planejada.

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Todavia, ao chegarmos ao aeroporto, um contratempo: não haviam reservado os acentos juntos, para mim e para meu marido. Como ele tem medo de viajar de avião, eu me preocupei por não estar ao seu lado durante o voo. Ficamos chateados, mas não havia o que fazer. Sentar-nos-íamos relativamente perto, e eu procuraria lhe dar assistência de alguma maneira.

Assim que os outros passageiros chegaram dentro da aeronave, percebi que muitos precisaram trocar de lugar, pois havia problemas diversos nas reservas feitas. Atrasaram em quarenta minutos o horário previsto para a decolagem até que todos se ajeitassem.

Nesse meio tempo, meu marido começou a sentir dores renais, precisou tomar um remédio relativamente forte, que lhe deu sonolência, o que foi positivo, pois não dormira na noite anterior, devido à ansiedade provocada pelo voo.

Durante a viagem passamos por uma turbulência demorada e a moça que estava ao meu lado era extremamente nervosa e tinha muito medo de viajar de avião. Percebendo o seu temor e as suas mãos geladas, procurei acalmá-la, conversando com ela. Quando ela soube que eu era psicanalista, ficou mais à vontade e atribui minha tranquilidade a este fato. Mas eu lhe corrigi, esclarecendo que essa característica é proveniente de minha fé em Deus.

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É interessante como o espaço físico provoca certa intimidade. O interior de um avião pequeno aproxima as pessoas, invariavelmente. Essa relação temporária une o grupo, nos induzindo a fazer parte do todo. Ainda que eu lesse ou cochilasse em alguns momentos, eu estava ali, levantando para que os outros passassem, pedindo licença para me locomover. A boa convivência era indicada para que pudéssemos seguir de maneira mais feliz o nosso caminho.

Aterrissamos. Cada grupo seguiu o seu destino. Mas como a ilha é pequena, nos encontrávamos algumas vezes, no hotel, nos passeios e nas ruas.

A felicidade de fazer parte preencheu-me durante a semana de férias. Livre de horários e obrigações, distante do celular e do carro que tanto me individualiza em minha rotina, criei uma ausência de mim mesma, ou daquilo que fiz de mim ao longo desses dois anos.

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A língua portuguesa, a nacionalidade brasileira unia pessoas diferentes a cada encontro, a cada troca de experiências. Isso simplesmente acontece quando se tem algo em comum, nesse caso, a língua e o Brasil.

Durante a estadia, descobrimos que a maioria de nós voltaria no mesmo voo, e como já nos conhecíamos não nos preocupamos com os nossos acentos no avião, pois já éramos um grupo e sabíamos que nos ajeitaríamos sem problemas.

A semana foi ótima, o lugar é lindo, eu e meu marido numa nova lua-de-mel, compras alegres e presentes, passeios divertidos, e, claro, novos amigos adicionados no ‘Facebook’.

Certamente, a maior dádiva dessa viagem foi ser tocada de forma contundente como parte da humanidade, de maneira que quando retornei à minha casa, não quis perder esta aquisição, ainda que a rotina me puxe para o individualismo cruelmente.

Fazendo parte descobri uma relação feliz com o outro humano, seja ele quem for. Diversa daquela que temos com nossos familiares, amigos, vizinhos e colegas de trabalho. Pois quando experimentada em sua realidade comparece de modo simples e profundo, sem interesse ou escolha prévia.

* Aruba ilha ao sul do Caribe próxima à costa da Venezuela.