Falamos muito mais do que é realmente necessário

por Emilce Shrividya Starling

A Filosofia do Yoga nos orienta a ter discernimento entre o que deve ser dito e o que é melhor não dizer. Antes de conseguir isso, precisamos descobrir o que realmente pensamos. Muitas vezes, nem mesmo sabemos o que existe em nossa mente.

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Como há uma íntima relação entre a mente e a palavra, o Yoga nos recomenda a purificar a mente com exercícios de concentração para estar com a mente presente quando falarmos. E manter uns quinze minutos de silêncio, diariamente, praticando a meditação ou relaxamento, para o apaziguamento da mente e autodomínio sobre a fala.

Muitas pessoas causam conflitos e problemas por causa das palavras. E depois apenas dizem: "Eu não pensei antes de falar".

Contemple e reflita!

Com que cuidado você escolhe suas palavras?

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Qual o tom da sua voz quando você fala?

Quando você faz uma crítica necessária, existe agressividade em sua voz?

Como a sua voz soa quando responde a uma crítica?

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Você pensa antes de falar?

Você escuta as pessoas ou quer falar o tempo todo?

Você interrompe a fala das pessoas ou tem a habilidade em escutar o que dizem?

Você se interessa pelas pessoas ou somente quer falar sobre si mesmo?

O escritor recentemente falecido Rubem Alves disse no artigo Escutatória: "Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém irá se matricular".

Há alguns anos atrás, participei de um retiro de silêncio de uma semana em um ashram de Yoga nos Estados Unidos. Fiquei fascinada com essa experiência e com a calma que senti. Além de ter meditações muito profundas, a tranquilidade continuava comigo o dia todo. Quando ouvia as palestras do retiro, minha mente estava totalmente presente. Quando cantávamos os mantras, eu mergulhava na alegria do Ser interior.

Nesses dias de silêncio, eu percebi, com clareza, o que minha mente pensava, como ela julgava as pessoas, como surgiam os pensamentos negativos. E como era fácil mudar para pensamentos positivos e ter domínio sobre a minha mente.

Fiquei mais presente para sentir a natureza, apreciar a beleza das flores e das árvores, a me maravilhar com as cores do nascer do dia e do pôr-do-sol.

Quando o retiro terminou, fiquei ainda algumas horas sem falar, saboreando a completa conexão com a paz na minha mente. Foi uma experiência muito transformadora e inesquecível.

Quando retornei para minha vida diária, comecei a perceber antes de falar, que muita coisas não deveriam ser ditas, pois poderiam causar conflitos ou discussões. Comecei a distinguir melhor o que devia dizer e o que não devia. E como desperdiçava minha energia falando sobre as pessoas, ou sobre assuntos desnecessários ou reclamando.

Passei a dar mais valor ao silêncio, intensifiquei minhas praticas diárias de meditação para aquietar minha mente e ter mais sabedoria na fala.

Geralmente, as pessoas não querem ouvir, só querem falar compulsivamente. Falam ao mesmo tempo e não querem escutar o outro. Emendam um assunto no outro. Mesmo que percebam que devem perguntar algo sobre você, elas nem ouvem direito sua resposta, e logo começam a falar sobre si mesmas.

O Yoga nos recomenda a pensar antes de falar e que as palavras deveriam ser ditas com grande discernimento.

Como disse o santo-poeta Tulsidas: "As complicações são criadas pelo falar. Os problemas são resolvidos pelo falar. Ao se falar com discernimento, pode-se ganhar bênçãos".

Precisamos desenvolver concentração e contemplação antes de falar. Mas, isso não significa que temos que conseguir isso para falar. Devemos aprender com os erros e aceitar os conselhos dos outros.

Em vez de ficarmos na defensiva, negando que falamos algo inapropriado, precisamos admitir e não nos fechar com ressentimentos a alguma critica verdadeira.

Para termos mais harmonia com nossa família, com os amigos e em nosso trabalho, precisamos desenvolver a gentileza na fala e mudar a qualidade abrasiva da voz. Falar a verdade, com bondade, amabilidade. Distinguir a necessidade de falar certos assuntos que poderiam criar problemas.

Reflita sobre esta parábola de Sócrates:

Um rapaz procurou Sócrates e disse que precisava contar-lhe algo. Sócrates ergueu os olhos do livro que lia e perguntou:

– O que você vai me contar já passou pelas três peneiras?

– Três peneiras?

– Sim. A primeira é a da Verdade. O que você quer contar sobre os outros é um fato? Caso seja verdade, deve então passar pela segunda peneira: a da Bondade. O que você vai me contar é coisa boa? Ajuda a construir ou destruir o caminho e a fama do próximo?

Se o que você quer contar for verdade e é coisa boa, deverá passar ainda pela terceira peneira: a da Necessidade. Convém contar? Resolve alguma coisa? Ajuda a comunidade? Pode melhorar sua vida?

E continua Sócrates:

– Se passar pelas três peneiras, conte! Tanto eu como você e seu irmão nos beneficiaremos. Caso contrário, esqueça e enterre tudo. Será uma fofoca a menos para envenenar o ambiente e levar discórdia entre irmãos e colegas. Devemos sempre ser a estação terminal de qualquer comentário infeliz.

Lembre-se: Pessoas inteligentes falam sobre ideias. Pessoas comuns falam sobre coisas. Pessoas medíocres falam sobre pessoas.

Esta sábia parábola mostra a importância do pensamento correto, da palavra correta, da ação correta. É praticar a Ética do Yoga, o dharma, o dever, a Verdade, a Bondade, o Bem comum.

Vamos continuar cultivando ideias e ideais. Desenvolvendo sabedoria, discernimento e disciplina na fala. Que possamos evoluir cada vez mais rumo ao caminho da Luz, com compreensão e compaixão. Namaste! Deus em mim saúda Deus em você! Fique em paz!