Desde a antiguidade as funções mentais estão ligadas ao cérebro

por Edson Toledo

Sede da consciência, do raciocínio e das emoções, centro do conhecimento e da aprendizagem e arquivo de memórias, o cérebro é o órgão de comando que controla a atividade de todos os órgãos e sistemas do corpo. Ele é tão complexo e impõe tanto respeito com sua pequena e compacta massa acinzentada e branca que nenhum computador até hoje construído ousa desafiá-lo.

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Tanto que se perguntarmos para qualquer pessoa, certamente ela responderá que o cérebro é o órgão responsável pelas faculdades mentais e por nosso comportamento e com um pouco de esforço concluirão que fenômenos químicos estão por trás do funcionamento do sistema nervoso.

No entanto essas informações são relativamente recentes para muitos, já que durante muitos séculos as crenças sobre a maneira do funcionamento do cérebro foram radicalmente diferente das que conhecemos nos dias hoje.

As funções mentais há muito tempo são ligadas ao cérebro. Crânios com perfurações (trepanação) feitas em vida, com sinais de cicatrizações, foram encontrados em sítios arqueológicos em várias partes do mundo e alguns deles datam de até 10 mil anos atrás. Muito provavelmente, essas trepanações eram feitas com o objetivo de possibilitar a liberação de maus espíritos que estariam atormentando o cérebro de algum individuo.

É natural fazermos deduções de que os homens primitivos faziam essa ligação do cérebro e funções mentais, já que eles podiam observar que traumas cranianos levavam à perda de consciência e de memória, e que mesmos as convulsões levavam a alterações do comportamento.

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O Papiro Cirúrgico de Edwin Smith é um texto de medicina da Antiguidade egípcia de cerca de 1500 anos A.C., trata-se do mais antigo tratado de cirurgia traumática conhecido na atualidade e difere de outros tratados, pois apresenta uma abordagem racional e cientifica da medicina praticada no antigo Egito, na qual ciência e magia não entram em conflito e contêm as primeiras descrições conhecidas das estruturas cranianas, da superfície externa do cérebro, do fluído cerebral e das pulsões intracranianas.

Na cultura ocidental o filosofo e médico grego Alcmaeon de Crotona (séc. V a.C.) foi possivelmente o primeiro a desenvolver uma teoria acerca da origem e dos processos fisiológicos das sensações, sugerindo que os sentidos estariam ligados ao cérebro. Segundo escritos de sua época, foi o primeiro a relacionar o cérebro com as funções psíquicas.

Ainda no século V a.C. Demócrito, Diógenes, Platão e Teofrasto punham no cérebro o comando das atividades corporais. Também Herófilo (335-280 a.C.) dissecou e escreveu sobre o cérebro e foi o primeiro a descrever as cavidades, os ventrículos cerebrais que ele associou com as funções mentais. Essa ideia como vemos teve enorme importância na neurofisiologia dos séculos que se seguiram.

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Outro grego, Hipócrates, que viveu entre 460 e 377 a. C. escreveu sobre o cérebro: "Deveria ser sabido que ele é a fonte de nosso prazer, alegria, riso e diversão, assim como de nosso pesar, dor, ansiedade e lágrimas, e nenhum outro que não o cérebro. É especificamente o órgão que nos habilita a pensar, ver e ouvir, a distinguir o belo do feio, o mau do bom, o prazer do desprazer. É também o cérebro a sede da loucura e do delírio, dos medos e sustos que nos tomam, muitas vezes à noite, mas também às vezes de dia; faz a causa da insônia e do sonambulismo, os pensamentos que não ocorrerão, deveres esquecidos e excentricidades".

É uma espantosa e clarividente declaração, tão moderna quanto a que qualquer neurocientista do século XXI poderia fazer. É de se surpreender, portanto, que os filósofos e os médicos posteriores a Hipócrates, por muitos e muitos séculos, tenham regredido notadamente ao deslocar a sede da mente para o coração, mas essa história ficará para um próximo texto… Portanto aguarde!