Busca espiritual ativa diferentes regiões do cérebro, indicam estudos

por Elisandra Vilella G. Sé

A busca espiritual é tão antiga quanto a raça humana, mas ultimamente pesquisadores têm-se interessado em investigar o sentimento religioso presente nas pessoas. Ou seja, querem saber se existe no cérebro uma .região responsável pelo processamento da fé.

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Para isso pesquisas com neuroimagem procuram desvendar quais áreas do cérebro ficam mais ativadas quando pessoas idosas relembram momentos de muita religiosidade que vivenciaram durante a vida, quando vivenciaram sensações místicas e também quando estão orando ou meditando. Para isso uma nova disciplina a “neuroteologia” surge com objetivo de aprofundar esse assunto.

Sabemos que essas experiências ou sensações místicas, estados de espiritualidade e meditação profunda sempre foram relatadas desde os primórdios da humanidade em todas as sociedades e culturas, mas estudar a base neural da experiência religiosa é algo novo. Assim, cientistas questionam se o sentimento religioso pode ser processado em alguma região específica do cérebro.

Segundo o pesquisador Persinger da Universidade Laurentian – Ontário no Canadá, a noção popular de que tais vivências são boas é uma consequência natural do condicionamento psicológico, uma vez que alguns rituais religiosos são ligados a experiências agradáveis. Por exemplo, rezar antes de realizar uma tarefa importante (uma competição uma prova) pode trazer tranquilidade e diminuir a ansiedade em relação ao desempenho.

Mas nem todas as pesquisas sobre este assunto possuem o mesmo procedimento metodológico e as mesmas perguntas. Algumas surgem do fato de se seguir uma tradição religiosa específica, como investigar a calma que os católicos sentem quando rezam. Outros estudos procuram investigar a percepção que o sujeito tem do contato com o divino e outras pesquisas se referem aos estados místicos. Dessa forma, é possível que apareçam resultados diferenciados sobre os sentimentos religiosos, isto é que eles possam surgir em áreas distintas do cérebro e também devido às diferenças individuais.

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Para algumas pessoas podem ser ativadas áreas do lobo temporal, enquanto em outras pessoas podem ser ativadas outras áreas do cérebro. O neurocientista Andrew Newberg da Universidade da Pensilvânia utilizou a ressonância nuclear magnética, um tipo de exame de neuroimagem que rastreia o fluxo de sangue oxigenado por meio de suas propriedades magnéticas, destacando áreas cerebrais que estão mais ativas, para tentar descobrir quais circuitos estavam em funcionamento durante práticas religiosas. Ele estudou a meditação budista, por conter um conjunto de rituais destinados a alcançar estados espirituais definidos.

Os pesquisadores apontaram para o envolvimento de outras áreas cerebrais fora a do lobo temporal, a área especializada da linguagem. Descreveram uma grande queda da atividade da parte anterior e superior do lobo parietal durante o transe meditativo dos budistas que já praticavam a meditação há alguns anos. Também encontraram um aumento da atividade no córtex pré-frontal direito.

O córtex pré-frontal é responsável pela atenção e planejamento de tarefas cognitivas e seu recrutamento no pico da meditação pode refletir o fato de que tal contemplação exige que a pessoa se concentre intensamente num pensamento ou objeto. Outros pesquisadores também encontraram os mesmos resultados com pesquisas com budistas. O córtex pré-frontal esquerdo foi o mais ativado, refletindo a capacidade de experientes praticantes de meditação se concentrarem. Os voluntários mais experientes apresentaram níveis mais baixos de ativação.

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Um outra pesquisa interessante foi de uma pesquisador canadense que procurou investigar o estado mental de 15 freiras carmelitas de Montreal através do padrão de ativação cerebral durante a experiência de oração e durante lembrança de comunhão com o divino; uma memória espiritual (invocar uma memória de união com uma força divina); descobriu-se seis regiões estimuladas apenas durante a lembrança de comunhão. Houve um aumento na atividade do núcleo caudado, uma pequena região central do cérebro, os circuitos da memória e o chamado sistema límbico, regiões atribuídas à capacidade de aprendizado, memória e do processamento de emoções. E também a atividade ampliada do lobo parietal inferior e o córtex pré-frontal medial que também têm a função de determinar o prazer de uma experiência e ajudar a controlar a percepção consciente de um estado emocional. Isso pode estar associado ao sentimento incondicional de amor fraterno vivenciado pelas freiras, explica o neurocientista Newberg (2006)1.

Esses achados mostram que a quantidade e a diversidade de regiões do cérebro envolvidas na experiência religiosa das freiras apontam para a complexidade do fenômeno da espiritualidade.

1.Why we believe what we believe. A Newberg e M. Robert Waldman. Free Press, 2006.