Forma de viver influencia desempenho de memória ao longo da vida

por Elisandra Vilella G. Sé

As pesquisas no campo das Neurociências Cognitivas têm avançado bastante nos últimos anos, sobretudo no que diz respeito aos processos da memória com estudos cada vez mais organizados e sistematizados para a aplicação prática e orientações preventivas. Sabemos que a memória é uma função mental importante e que muda ao longo dos anos.

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Com o avançar da idade o uso preciso da memória não é mais o mesmo, a velocidade do processamento e tempo de reação das respostas torna-se mais lentos e selecionamos o que é mais significativo e relevante para nosso dia-a-dia. Ela é essencial na vida do ser humano, é a linha dos pensamentos, nossa identidade e, portanto, não é à toa que a falha dela, o esquecimento, a dificuldade da busca da palavra ou da imagem nos assombra, parecendo um mal que nos rouba os nossos conteúdos.

E assim, as pessoas seguem com o medo enorme da perda da memória e buscando explicações para os atos falhos num conflito constante entre o medo do patológico e o que é simplesmente um erro comum da memória. E só nos damos conta desse medo de esquecer e ser um esquecimento patológico quando algo a ser lembrado, repetido, evocado e aprendido exige nossa atenção. E também quando o discurso científico-filosófico sobre a mente humana na contemporaneidade nos mostra os desvios e perdas que podemos experimentar; aí acontece de não confiarmos mais na nossa memória na primeira falha importante que teve quando precisou dela.

E com o envelhecimento da população, a preocupação tem se tornado mais evidente e conforme aumenta a prevalência de doenças neurodegenerativas, como a Doença de Alzheimer, as pessoas convivem mais com a inquietude frente aos medos do esquecimento e do “apagamento” como ser humano. Quanto mais se sabe sobre a doença, maior é o medo de ter a vida dominada por ela.

Estilo de vida pode afetar memória

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Para entendermos melhor o que acontece com a memória com o passar dos anos, primeiro é importante ressaltar que tudo depende do seu estilo de vida que poderá afetar sua memória. Fatores tais como hábitos, valores, emoções, estresse, fadiga, alimentação, prática de exercícios físicos e mentais podem influenciar de forma significativa o desempenho da memória.

Segundo, é interessante lembrar-se dos “Sete pecados da memória” caracterizados como omissão mencionados pelo neurocientista Daniel Shactrer da Universidade de Harvard, que são eles:

1. a transitoriedade, relativo ao enfraquecimento da memória com o passar do tempo;

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2. a distração, relativo a uma ruptura entre a atenção e a memória;

3.o bloqueio que afeta a busca da informação no momento da evocação;

5. o cometimento, relativo ao equívoco, engano em relação a uma informação, são os atos falhos, por exemplo quando trocamos uma palavra por outra;

5. a sugestionabilidade, realtivo às lembranças criadas quando tentamos lembrar algo do passado;

6. a distorção, relativo à influência do nosso conhecimento atual e opiniões sobre o modo como nos lembramos do passado

7. a persistência, relativo à recordação de informações significativas ou perturbadoras que preferimos ou não lembrar, que insistem permanecer presentes, está relacionado também a dificuldade de inibir informações.

Todas essas falhas classificadas em pecados da memória ocorrem com freqüência em qualquer ser humano e que podem ou não trazer conseqüências, e que tem relação direta com nossas práticas de linguagem e sociais e que afetam nossa percepção no mundo. Se cometermos todos os pecados da memória citados por Shacter provavelmente seria como não ter a mente saudável, normal, deprovida de razão? A resposta é não. A verdade é que esses sete pecados da memória nos coloca no limite do que é considerado normal e patológico, no limite do esquecimento e daquilo que é ter boa memória.

A grande preocupação é o que podemos admitir como normal e como patológico.

Todo desempenho da memória está sujeito ao que você sempre fez, realizou ao longo da vida, ao seu estilo de vida e de usar o conhecimento. Usar a mente e o corpo cria novas trilhas neuronais e fortalece as já existentes. Quanto mais você faz isso mais vai lembrar o que você fez. O desafio é sempre comparar numa organização temporal o que você sempre foi capaz de fazer e hoje não consegue realizar com tanta precisão como antes, o que sempre esteve nítido e bem acordado na mente e hoje surge adormecido e obscurecido. Esse é o grande desafio dos diagnósticos diferenciais das simples falhas de memória que todos estamos sujeitos a cometer, dos graves brancos que temos receios.

Na verdade os esquecimentos são pouco toleráveis pela nossa sociedade e vivemos numa cobrança constante da precisão e da quantidade de informação a ser armazenada. Mas é preciso lembrar que o esquecimento faz parte da memória, é um processo adaptativo, por isso a memória é seletiva, memorizamos e lembramos no momento da emergência, aquilo que é relevante, significativo. A vitalidade da memória se revigora nas práticas sociais, cotidianas, culturais, afetivas, contextuais, discursivas, em especial esta, as práticas com linguagem.

Temos que cuidar da fragilidade da memória sem entrar em conflitos e medos, sabendo sempre de que memória estamos falando. Os guardiões da nossa memória não são apenas os discursos científicos e nem tampouco as indústrias de suprimentos para a memória, mas sim você mesmo, seus familiares, seus amigos, vizinhos e professores e companheiros de viagem. Seja você mesmo o domador da sua memória, de seu aprendizado e de seus conhecimentos acumulados ao longo da história.