Café da manhã e almoço são as piores refeições dos adolescentes

por Jocelem Salgado

Período que vai dos 12 anos aos 18 anos é chamado genericamente de adolescência. Pode haver uma variação de até dois anos, numa ponta ou noutra. Mas como referência, as instituições internacionais de saúde chamam de adolescência a faixa que vai dos 12-13 anos aos 18-19 anos.

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Meninos e meninas vão passar, nesse período, por um rápido crescimento, depois de uma relativa calmaria vivida nos anos escolares, entre 6 e 12 anos. É também nessa fase que os adolescentes sofrem uma maior interferência hormonal, associada a grandes mudanças no corpo e ao desenvolvimento sexual. É igualmente nesse período que eles se angustiam mais com seus papéis sociais. Tendo de passar da dependência da fase de criança para uma autonomia do período adulto.

O estirão ou o rápido desenvolvimento físico limita-se a um período de três a quatro anos, mas as transformações psicológicas costumam persistir ao longo de toda a adolescência. É a fase em que a aceitação pelo grupo e a maneira como enxergam seus próprios corpos passam a ter grande importância, muitas vezes deixando-os angustiados.

Todas essas alterações e acontecimentos estão relacionados diretamente à alimentação. O jovem passa a necessitar de maior quantidade de calorias, uma média de 2.500 Kcal/dia, ao mesmo tempo que, especialmente as meninas, defrontam-se com as pressões sociais, que cobram um corpo mais magro.

Muitos estudos e relatos demonstram que essa é a fase das piores práticas alimentares, com os rapazes pulando refeições, comendo fora de hora e dando preferência a alimentos com açúcar ou a sanduíches com excesso de calorias. Muitas meninas, por sua vez, tentarão comer o mínimo possível, correndo o risco de cair em perturbações graves, como a anorexia e a bulimia.

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É o período em que passam a comer fora de casa com mais frequência, afastando-se dos cardápios alimentares dos pais para adotarem as práticas do grupo.

Alimentação na adolescência

O crescimento mais rápido e o ganho de força muscular, especialmente entre os meninos, exigirão mudanças nos padrões alimentares. Os adolescentes sentem mais fome e seus organismos exigem uma maior quantidade de energia, proteínas, minerais e vitaminas.

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A quantidade de energia consumida é fundamental nessa época. Particularmente por conta das necessidades advindas do próprio crescimento e da queima provocada pela atividade física, geralmente bastante intensa.

Essas necessidades costumam variar de indivíduo para indivíduo e costumam ser menores nas meninas. Em média, elas necessitam de 2.200 Kcal/dia, enquanto os meninos requerem quantidades que vão de 2.500 a 3.000 Kcal/dia.

Em geral, os adolescentes não costumam ter dificuldades para preencher essas quantidades requeridas de energia. Porém, maus hábitos alimentares podem levá-los a consumir maior quantidade de açúcar e de gordura, ficando em débito com as proteínas essenciais.

Essa fase também exige um aumento na quantidade de proteínas ingeridas pelos dois sexos, especialmente os meninos, quando acontece um aumento da massa muscular. Pelas recomendações clássicas, as meninas necessitam de 44 a 46 g/dia de proteína, enquanto os meninos requerem 45 a 59 g/dia de proteína para manterem a necessidade diária e as reservas de nitrogênio.

O consumo de energia e de proteínas passa a ser uma exigência rigorosa do organismo nessa fase da adolescência. Ou seja, se o organismo não receber a cota necessária, reagirá de alguma forma e muito rapidamente. Essa espécie de alarme deve fazer com que os pais ou aqueles que convivem com o adolescente tomem uma atitude, procurando ajuda médica e nutricional, buscando eliminar a base do problema.

Isso não acontece com a deficiência de minerais e vitaminas, nutrientes essenciais para o desenvolvimento do organismo, mas cuja falta muitas vezes demora para se manifestar. O cálcio é um desses minerais. A adolescência é um período muito importante no fortalecimento da massa óssea, especialmente para as meninas, que sofrem nessa fase a influência dos hormônios sexuais. A exigência de cálcio em média para todos os adolescentes é de 1.200 mg/dia.

Há também a perda de ferro relacionada à menstruação, citada em estudos. As perdas de ferro, especialmente na menina em início da adolescência, podem levar a uma anemia simples, episódio muito frequente mesmo na classe média, que dispõe de informação e de alimentação.

O importante nessa fase é ficar atento às reações dos nossos meninos, mas especialmente das nossas meninas. A menstruação é um indicador importante e deve ser acompanhado de perto pelos pais. Meninas que se dedicam muito à prática de exercícios podem ter seu ciclo de ovulação alterado. Algumas chegam a ter a menarca (a primeira menstruação) retardada, outras têm muito sangramento nas suas menstruações. Em todos esses casos, conversas entre mãe e filha são fundamentais e a visita ao médico, mais importante ainda.

Quanto às vitaminas, o importante é dizer que o consumo das vitaminas do complexo B, especialmente para os meninos, deve ser aumentado, pois elas satisfazem as demandas do metabolismo energético e do desenvolvimento do tecido muscular.

Adolescência e hábito alimentar

Enquanto as crianças pré-escolares e as escolares são mantidas sob rígido controle dos pais, os adolescentes ganham a liberdade, passando a maior parte do tempo fora de casa.

Por conta dos compromissos escolares ou de trabalho e por conta dos encontros com a turma, o adolescente sente-se senhor das suas escolhas. Muitas vezes, ele se aproveita dessa “liberdade” para fazer exatamente o contrário do que os pais insistem. É uma espécie de “rebeldia” que ocorre em todo o universo do adolescente, e que não poderia deixar de acontecer com a alimentação.

Por causa desse histórico e dos fatos que todos nós conhecemos o adolescente mantém a fama de cultivar os piores hábitos alimentares.

Em primeiro lugar, é preciso dizer que o adolescente, pelo menos a maioria deles, não está consciente da quantidade de calorias e energia que seu organismo necessita nem preocupada com isso. Ele não está pensando se tal alimento é fonte de energia ou tem os nutrientes que seu corpo necessita. Para ele, os alimentos que importam são aqueles que lhe agradam e que lhe tiram a fome. Com o dinheiro contado no bolso, muitas vezes, ele vai se satisfazendo com um “cachorro-quente” ou um hambúrguer da carrocinha na esquina.

Nessa fase, o grupo tem muita importância. Se os amigos na hora do almoço, juntam-se no “dogão” da esquina (o carrinho de cachorro-quente), ele vai se sentir melhor comendo ao lado deles. Lambuzar a salsicha com maionese, catchup e mostarda faz parte do cardápio.

Não será proibindo as carrocinhas de cachorro-quente nas proximidades da escola – ou dos locais de trabalho – que vamos alterar as práticas alimentares de nossos adolescentes. Se o “dogão” não estiver lá, eles vão encontrar na cantina da escola ou nas gôndolas do supermercado o salgadinho ou o lanche que querem devorar. Eles não precisam nem procurar muito, basta lembrar as propagandas vistas na TV na noite anterior, oferecendo todas as delícias nas prateleiras do supermercado mais próximo.

Quem já experimentou sabe que são mesmo uma tentação. Por conta dessa realidade, minha sugestão é que pais e educadores não tentem mudar os hábitos de seus adolescentes discordando dos “prazeres” que a mídia oferece. Temos de mostrar alternativas práticas, convidando-os a comer juntos e de forma criativa, alimentos como verduras, legumes e frutas.

É claro que essa relação será menos conflituosa em lares em que as crianças se acostumaram a uma alimentação variada desde a infância, quando o leite deixou de ser a base de sua alimentação, mas, mesmo entre aqueles adolescentes que nunca apreciaram um prato de saladas ou uma abobrinha refogada, a importância da boa alimentação pode ser cultivada com uma relação paciente entre pais e filhos na hora do almoço ou do jantar.

Esse pode ser um cenário imaginário para muitos pais, mas são mudanças que podem ser construídas, devagar, em qualquer período da vida. É possível que seu filho, um militante rebelde contra alfaces e rabanetes, transforme-se em um discípulo da alimentação saudável na sua vida adulta. Tudo pode depender de um encontro, de uma leitura mas, na maioria das vezes, as práticas dependem da convivência em casa.

Beliscar

Mesmo com tantas considerações, é importante lembrar alguns quesitos nos quais os adolescentes são mestres. Um deles é o “beliscar”, geralmente salgadinhos, a qualquer hora do dia. Muitas pesquisas mostram que o consumo desses salgadinhos eleva a quantidade de gorduras necessárias, enquanto mantém abaixo dos níveis a absorção da vitamina A, do cálcio e do ferro.

Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo mostrou que 100% dos adolescentes entrevistados “beliscavam” algum alimento entre as refeições. Outro problema ligado ao “beliscar” entre as refeições é o fato de os adolescentes transformarem os lanches rápidos em refeições. Na hora do almoço, mesmo que a cantina da escola ou do restaurante da esquina ofereça uma opção de pratos por quilo – geralmente barata e variável – eles vão preferir as casas ou os carrinhos que vendem sanduíches.

Foi graças à “fome” e à “impaciência” dos adolescentes – que trocam pratos nas mesas por sanduíches em pé – que as redes de fast-food fizeram e fazem tanto sucesso na maioria dos países.

Nada contra o fast-food, se essa modalidade de lanchonete obedecesse recomendações dietéticas mínimas. Na maioria das vezes, oferece pratos e sanduíches com excesso de calorias, gorduras saturadas e sódio, sem o teor suficiente de cálcio e de vitamina A. Outro problema comum entre os adolescentes é a prática de suprimir refeições. Os pré-adolescentes costumam “enganar” no café da manhã, disfarçando a quantidade de alimentos que ingerem. A causa, em geral, está no fato de acordarem muito cedo para as aulas e de se sentarem à mesa completamente sonolentos.

Entre os adolescentes, pesquisas em vários países indicam que a refeição mais “saltada” é o almoço. Eles costumam tomar um bom ou razoável café da manhã, mas por conta do “beliscar” no meio das aulas e da ansiedade pelas atividades do grupo, acabam comendo quase nada na hora do almoço. Um sanduíche para disfarçar a fome, nada mais. A fome maior vai se manifestar no início da noite, quando a família prepara o jantar. Famintos e cansados com as atividades do dia, esses adolescentes tendem a comer mais do que deveriam. Nada grave nessa fase de crescimento, mas o problema é que sentirão sono em seguida e não conseguirão fazer as lições de casa, geralmente rigorosas nessa fase. Outro fato é que “dormir de barriga cheia”, como já diziam nossas avós, não é um hábito saudável. “Engorda e provoca pesadelos”

O ideal, portanto, é tentar incentivar os adolescentes a comerem bem na hora do almoço. Com um café da manhã saudável e um almoço completo com proteínas, carboidratos, legumes, verduras e frutas, o jantar poderá se limitar a um lanche ou a um prato leve.

Se conseguirmos convencer nossos filhos a adotarem hábitos alimentares saudáveis, já estaremos garantindo boa parte de sua saúde no futuro. E se nosso filho tiver alguma tendência para a obesidade, essas práticas saudáveis farão com que sofra menos no seu esforço de se manter no peso desejado.

Uma parte dos adolescentes, ainda não estimada pelos estudos, vai acabar ou sofrerá com enfermidades que só nas últimas décadas foram percebidas. Trata-se de anorexia e da bulimia. Nos dois casos, o adolescente acha-se mais gordo ou fora dos padrões estabelecidos pela mídia e pela sociedade. Esse sentimento provoca vômitos, quando é obrigado a ingerir algum alimento.

Essa manifestação doentia atinge principalmente as meninas adolescentes. A reação de desagrado com o corpo provoca nelas um sofrimento que raramente é compreendido pelos adultos que estão à sua volta. O resultado é um sofrimento ainda maior. Casos de bulimia e de anorexia – esta última identificada pela excessiva magreza das modelos – estão sendo diagnosticados também em crianças, meninos de 8 ou 9 anos. O Hospital das Clínicas em São Paulo já tem um serviço dedicado especialmente às crianças. Cabe aos pais, com a ajuda do médico, identificar se a falta de apetite não é um caso de anorexia que necessita de cuidados especiais.