Por que o fenômeno stigmata só ocorre em adeptos da cultura cristã

por Roberto Goldkorn

“No fim das contas é a nossa cultura religiosa – no sentido mais amplo do termo – que vai determinar não somente a interpretação do fenômeno, mas a própria forma de manifestação do fenômeno em si”

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Uma reportagem na TV mostrou a saga do Padre Pio na Itália, sua fama sem precedentes até a sua canonização pelo Papa João Paulo. As curas milagrosas atribuídas ao padre foram muitas, e como podem imaginar… muito bem documentadas, pois no processo de canonização a Igreja faz uma investigação super-rigorosa.

Mas não foi esse aspecto da figura de padre Pio que me atraiu. O religioso foi um dos mais famosos stigmati do mundo. Para quem ainda não está familiarizado com o termo, stigmata, são os ferimentos nas mãos e pés (mas aparecem na testa e em outras partes do corpo) que reproduzem as supostas feridas nos membros de Jesus após a sua crucificação, ou seja, as chagas de Cristo.

Muitos investigadores se lançaram ávidos para desmascarar os estigmatizados mais famosos. Para sua alegria a maioria foi mesmo desmascarada. Em quase 70% dos casos se descobriu que consciente ou inconscientemente as pessoas se autoinflingiam os ferimentos. Mas muitos casos ficaram sem a tão almejada explicação lógica/científica.

Há muitos e muitos anos, fui chamado para investigar (e socorrer) uma família que era constantemente mordida por “fantasmas”. Todos estavam apavorados, principalmente as crianças que não entendiam nada e choravam muito de dor e medo. As mordidas eram brutalmente reais em todas as partes do corpo e algumas de tão fortes até sangravam.

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Infelizmente não tive condições de dar continuidade à minha investigação e tive de me afastar.

Esse fenômeno se for comprovadamente genuíno pode ter duas explicações. A primeira e mais comum, é a ideoplástica ou teleplástica. O Inconsciente do indivíduo que possui uma convergência de potenciais psíquicos e emocionais explode e se materializa plasmando na pele do sujeito as formas de estigmas, queimaduras, desenhos, etc.

Sabemos por experiência e constatação científica que existem indivíduos com uma grande capacidade telecinética, que são capazes de mover objetos à distância. A teleplástica ou ideoplástica é uma capacidade psíquica derivada da telecinesia.

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O que é poltergeist?

Um dos fenômenos mais investigados no universo paranormal é o do Poltergeist, ou mais apropriadamente SRPK (Spontaneous Recurrent Psycho Kinetics da sigla em inglês).

As investigações mostraram que o fenômeno de objetos se deslocando sozinhos nos ambientes, telefones discando sem a intervenção humana, pedras sendo atiradas, fogo espontâneo, etc… quase sempre cessavam quando se retirava do local um adolescente da família. Constatava-se quase sempre que essa criança vivia conflitos internos poderosos que não os exteriorizava. Coincidentemente tratava-se de um indivíduo dotado de capacidade paranormal. Essa capacidade era deflagrada de forma caótica pelas emoções turbulentas, e assim se produzia o fenômeno, que foi originalmente atribuído a fantasmas (Geist) “brincalhões” ou malandros (Polter) um termo alemão.

Voltando aos stigmati minha opinião é a de que um fenômeno correlato ao do SRPK nos casos genuínos está em curso. Isso pode ter como deflagrador uma personalidade profundamente mística cuja religiosidade foi apenas um desaguadouro cultural. Explico: nunca se observou o fenômeno das chagas de Cristo em muçulmanos, nem em budistas ou ateus. O misticismo (e a consequente opção pela religião) é fruto de uma percepção equivocada de uma mediunidade/paranormalidade. Em consequência a opção religiosa seria a materialização natural desse processo. A escolha da via religiosa então teria dupla finalidade: ao mesmo tempo seria uma arena onde o fenômeno poderia se manifestar com uma aura de legitimidade/santidade e onde a instituição supostamente protegeria o médium de si mesmo e da incompreensão pública.

A religião proveria sentido para esses fantasmas internos (que eu imagino fariam um grande estrago) nessas crianças assim que manifestados.

A esse propósito me lembro de um padre alemão cujo nome não me recordo bem, que percorria o interior do Brasil, “curando” crianças e jovem “possuídos”. Na verdade o que ele fazia era identificar esses indivíduos causadores de fenômenos incompreensíveis que perturbavam a vida das famílias de gente simples, e através de um processo de hipnose “fechava o poço”.

O padre alemão em sua ignorância castrava o potencial mediúnico de dezenas de crianças e jovens, fazendo uma espécie de “lobotomia espiritual”. Nessa constatação não vai nenhuma crítica, porque nas condições dadas (tanto do lado dos “pacientes” quanto do “médico”) era o que se podia fazer, embora nesse caso talvez a não ação se mostrasse melhor no longo prazo. Talvez.

Assim o fenômeno das Chagas de Cristo (quando não é farsa) é produzido por médiuns de materialização. A forma do fenômeno se manifestar é dada pela cultura do médium, no caso gente de formação cristã.

Assim, para concluir, os chamados fenômenos mediúnicos ou paranormais, ainda que cercados de ceticismo por parte dos materialistas, e de fervor religioso pelos que ainda buscam explicar o mundo pela religião, é legítimo.

A cultura dominante, porém, pode modelar esses fenômenos de forma poderosa, mostrando o quanto ainda somos controlados por aquilo que Jung chamou de “transe cultural”.

Não consigo imaginar, por exemplo, os pastores de Fátima tendo a visão da Deusa Ísis, nem os dervixes volteadores do Cairo tendo êxtases místicos envolvendo a figura de Jesus.

No fim das contas é a nossa cultura religiosa – no sentido mais amplo do termo – que vai determinar não somente a interpretação do fenômeno, mas a própria forma de manifestação do fenômeno em si.