Pratique a contemplação tântrica

por Nicole Witek

Meditação. Tudo bem. Tântrica? Por quê? Pode parecer que o processo, o método, seja igual para várias correntes psicológicas ou filosóficas, mas as metas e os temas expressam visões diferentes do mundo. Às vezes opostas.

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Para começar, vamos falar dos pontos em comum entre todas as técnicas: a postura imóvel, estável, através da qual podemos voltar toda atenção para nosso mundo interior. Depois, vem a contemplação: escapar da tirania do intelecto e da consciência de vigia para transcender esse nível de nossa mente e ter acesso a recursos profundos de nosso ser… e até do universo.

Essa razão faz com que a contemplação seja mais ‘eficiente’. Nem sei se posso falar de eficiência porque essa palavra parece muito ‘sócio-econômica’ para o assunto tratado. Vou substituir pela palavra ‘proveitosa’.

‘Contemplar’ também é melhor, porque ‘meditar’ traz um sentido de reflexões, de intelecto que queremos colocar de lado durante um tempinho. As metas são totalmente diferentes: as três correntes religiosas na Índia são: O Vedanta, o Budismo e o Tantra.

Para o Vedanta, o corpo não é real, o mundo dos fenômenos é ilusório, pois tudo que é captado pelos cinco sentidos é uma porção só de uma certa realidade, uma ilusão que a mente elabora a partir das percepções. Precisamos mergulhar no absoluto para encontrar a Felicidade. Logicamente as meditações correspondem a essa visão.

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Para o Budismo, a contemplação se torna praticamente o essencial do culto. Quem medita visa o vazio, o nirvana, que por mais paradoxal que pareça, traz liberação do ciclo dos renascimentos e do karma, a lei da ação e reação.

Para o Tantra, é tudo ao contrário! O universo é muito real, as galáxias, as estrelas emergem constantemente da união de dois princípios cósmicos: Shiva (consciência) e Shakti (energia) com esse axioma: “tudo que está aqui, está em outros lugares, se não estiver aqui, não está em lugar nenhum”.

A filosofia tântrica não nega nem foge do mundo real. Essa filosofia permite a integração total no universo, seja ele ‘externo’ ou ‘interno’ ao corpo, com seus bilhões de células como bilhões de estrelas no cosmos.

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Usando seu corpo-universo você vai sentir essa fusão de princípios cósmicos que vitalizam e banham cada célula de inteligência e consciência. Essa vivência não tem nada intelectual, e só… sentir.

A contemplação que vou propor é neutra, porque ela não recorre a ingredientes religiosos. Religiosos ou ateístas podem praticar sem moderação.

A postura

Varia do que é praticado habitualmente: essa posição do corpo favorece a conexão com o universo e o mar e a filiação com o universo. Essa postura é essencial: o corpo sabe, já conhece e já experimentou essa forma quando ele estava feto no mundo das águas.

O tema

Paisagem noturna, a lua que de uma lâmina crescente se reflete na superfície do mar e passa a ser um disco. Essa imagem nos desvincula do tempo linear para nos colocar no tempo cíclico, esses ciclos profundos, de nossos ritmos biológicos. As estrelas estão iluminando o céu azul profundo.

O ar é tranquilo e minha respiração se torna uma onda do mar… inspiro… expiro, paro uns segundos minha respiração e inspiro de novo com a próxima onda. Imagino a música das ondas… “OM” som do mar eterno, da musica da água, da criação do universo. E fico embalado pelo som, pelo movimento das ondas, até sentir que eu me integro perfeitamente nesses ritmos das ondas, da maré. Que o mar é o berço da vida.

Aos poucos o disco do sol se eleva na linha do horizonte, muda de cor: de rosa ele passa para a cor laranja, gloriosa. De disco, o sol se transforma em esfera, irradiando calor, bem-estar, me transmitindo sua força, vitalidade, serenidade. Ao mesmo tempo as ondas dão o ritmo a minha respiração. Eu sinto felicidade pura, e quando minha atenção começara a enfraquecer, simplesmente, eu sentarei, abrirei os olhos… sem pressa.

Os mecanismos

Essa contemplação tem uma riqueza simbólica extraordinária. O elemento simbólico é o mar. Caminhando no tempo passando de mãe para mãe, você encontrará o primeiro ser unicelular que nasceu das águas primitivas. Isso é verdade e não vem em oposição às minhas crenças religiosas ou filosóficas. Minhas células estão palpitando de vida desde o começo dos tempos há bilhões de anos.

Sou mamífero terrestre que respira ar, mas não posso esquecer que meu corpo é composto de ¾ de água, sou um aquário inteiro. Minhas células sabem disso. Vivi nove meses nas águas do útero e as células profundamente sabem dessa época quando eu não tinha nome, nem ego, com todas minhas potencialidades intactas, talvez meu ser consciente não saiba disso, mas algo em mim sabe.

Luar

Para o Tantra, o elemento água é relacionado a todos os líquidos do corpo. Sabemos hoje que podemos até medir a maré numa xícara de chá. A água capta todos os ritmos cósmicos. A lua é nosso satélite, que comanda e atua sobre todas as águas… sem distinção. A lua mexe toneladas, massas enormes de águas ciclicamente. Da mesma forma que o sol. Só que o sol está passeando a oito minutos/luz da gente e a lua 480 vezes menos! Isso quer dizer que a influência da lua sobre nossos ritmos físicos é enorme.

A lua influencia todos nossos ritmos corporais e se nos não temos essa consciência, cada uma de nossas células sente a ação da lua. Algo dentro de você sabe disso. As fases da lua são bem conhecidas de quem vive em contato com esses ritmos: semear, colher… depende dos ritmos da lua.

Sol e lua

Sem o sol nossa vida seria muito diferente. Nem sabemos se nós existiríamos. As plantas emergiram do oceano primitivo e começaram essa troca gasosa, soltando oxigênio. É desse oxigênio, da fotossíntese das plantas que vem boa parte do ar que respiramos. Nosso corpo, na profundidade de cada célula sabe disso.

Reunir em alguns minutos de contemplação o sol e a lua realiza uma fusão maravilhosa, ainda mais quando estamos na postura do feto. Estamos nos ligando à Vida. Ultrapassamos o raciocínio, o intelecto, realizando uma plenitude integral… propiciando felicidade para nosso ser profundo.

No momento da contemplação, esqueça tudo isso. Meu texto valeu só pelo prazer de “vender o peixe” da contemplação tântrica e levar meu leitor a vivenciar simplesmente, a sentir, essa fusão com as forças cósmicas.