Vamos dar vozes às grávidas?

por Joel Rennó Jr.

Comemoramos mais um Dia Internacional da Mulher, mas teríamos o que festejar, principalmente no que tange à assistência e ao tratamento das milhões de mulheres grávidas com transtornos mentais?

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Trabalho há mais de duas décadas na área de psiquiatria perinatal e observo que aqui a psicofobia (preconceito ou discriminação contra quem sofre de transtorno mental) é infinitamente superior a de outros períodos de vida da mulher. É mais fácil, conveniente, seguro e cômodo ignorar a doença mental na grávida do que avaliar com rigor e estudos bem embasados todos os riscos e benefícios do tratamento versus o não tratamento de transtornos mentais moderados e graves nessa população – e que são altamente prevalentes.

Hoje temos evidências científicas robustas de que uma doença mental não adequadamente tratada pode criar um ambiente hormonal hostil intraútero (ou prejudicar a nutrição e os cuidados pré-natais das mulheres) levando a alterações genéticas que se manifestam anos ou décadas mais tarde na forma de distúrbios neuropsiquiátricos que afetam saúde mental da prole – é o que denominamos de epigenética.

Portanto, se sabemos que muitas grávidas têm diagnósticos e tratamentos negligenciados e sofrem caladas, por que nós não tomamos uma atitude? E esse desmazelo seria exclusividade apenas do Brasil e de outros países em desenvolvimento? Sob a égide de proteção da mulher ou gravidez totalmente segura (o que não existe em nenhuma condição no ciclo gravídico) nega-se, por vários fatores, até mesmo o direito ao tratamento de um transtorno mental que atinge essa mulher grávida no período mágico de sua vida e que se transforma em uma experiência de muita dor e isolamento.

E quando falo em tratamento não necessariamente precisa ser farmacológico, temos outros tratamentos eficazes com as psicoterapias interpessoal e cognitiva comportamental, além de estudos promissores envolvendo a estimulação magnética transcraniana – todos com eficácia comprovada. O tratamento escolhido dependerá da gravidade clínica de cada caso. Mas mesmo o tratamento medicamentoso, quando necessário, é possível em muitos casos, desde que haja uma avaliação médica rigorosa e detalhada de todos os aspectos da doença mental e dos riscos X benefícios do tratamento escolhido.

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