Da Redação
Este texto visa ampliar a questão da traição, realizando uma pequena dissertação enfocada, principalmente, no motivo do traidor. A traição é uma dimensão inescapável da vida. Toda vez que somos frustrados em nossas ilusões e, toda a vez que não correspondemos às expectativas dos outros, estamos sendo traídos e traidores.
Nesse sentido, a traição não se limita apenas ao contexto amoroso: se uma mãe não trai as expectativas de seu filho, ele terá problemas em lidar com frustrações; se um filho não trai as expectativas de seus pais, não poderá encontrar um caminho próprio na vida; se uma pessoa não trai as convenções sociais, não terá individualidade, e assim por diante. Levamos em conta, nos casos supracitados, que estas expectativas contrariam, de alguma maneira, a vontade do outro, afetando o curso da vida.
O contrário da traição é a fidelidade. Quem trai, está sempre maculando algum pacto de fidelidade. Responsabilizar-se pela traição é assumir o rompimento desse pacto. Nesse sentido, a traição implica sempre em um sacrifício. Trata-se de um problema de escolha e, portanto, de consciência.
Ao rejeitar a consciência daquilo que está sendo sacrificado em uma traição, a parte do sacrifício embutida em toda a traição é ignorada. Optar e assumir uma opção, é sacrificar algo em função da fidelidade a alguma outra "coisa".
A "verdadeira" traição consiste em posicionar-se de todos os lados e, ao mesmo tempo, de nenhum. Este modo da traição apresenta-se também na incapacidade de trair. Aquele que recusa-se a frustrar expectativas é igualmente incapaz de reconhecer o sacrifício. De modo semelhante ao "traidor permanente", quem nunca trai expectativas, acaba geralmente dividido entre expectativas opostas, incapaz de trair uma possibilidade em função de outra. Certamente, trairá a ambas por não ser fiel a nenhuma. Estranha contradição que une fidelidade e traição no mesmo signo.
Em todo caso, há uma dignidade em fazer uma opção. É justamente esta dignidade que, na traição, consiste em "fazer o sacrifício". É preciso no entanto deixar amadurecer a contradição, para que uma opção possa ser realizada e o dilema da traição resolvido. Durante esse período, o melhor a fazer é aceitar a contradição, sem rejeitar, a priori, qualquer uma das possibilidades. A fantasia de traição é pois um chamado para o sacrifício.
O problema é que hoje em dia, a palavra sacrifício tornou-se um tanto piegas. A busca pelo "prazer a qualquer custo" não aceita a frustração e quer "ter tudo". Perde-se assim a dimensão da fidelidade, pois esta implica na possibilidade de escolha e, geralmente, as escolhas envolvem uma certa dose de traição e sacrifício. Envolvem também fé, esperança e certeza.
Autores: Carla Regino, Fernanda Menin, Helena Girardo de Brito, João Paiva, Lilian Loureiro, Luiz André Martins, Mariana Leite, Marina Winkler, Priscila Parro e Thiago Pimenta – sob a coordenação da profa. Dra. Noely Montes Moraes