Egoísmo sim, e daí?

por Aurea Caetano    

Ninguém gosta de ser chamado de egoísta. No mundo do politicamente correto, esta palavra virou quase um palavrão. Para que isso não se torne mais um clichê, é importante compreender o que há por trás dessa questão. A palavra vem do conceito de Ego, que é compreendido como o centro da consciência, ou o que de forma comum definimos como o Eu. Ego ou Eu, estas palavras podem ser utilizadas de forma intercambiável para falar do centro daquilo que reconhecemos ou intuímos como nossa totalidade.

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Ora, para que eu possa falar de mim mesmo preciso ter um ponto de partida, ou um ponto de referência, e este é o ego ou eu. A construção do espaço no qual “reside” este conceito é feita desde o início da vida – em processos constantes de nomeação e reconhecimento. Explicando de maneira muito simplificada: este processo começa em um movimento que acontece mais a partir da mãe ou cuidador que vai apontando e nomeando o bebê, seu corpo, suas atividades e assim construindo uma relação na qual a criança começa a ter uma individualidade, uma identidade. E, em um outro movimento que surge aos poucos a partir deste eu, recém-formado, inaugurando um processo de reconhecimento de si mesmo e seus quereres na relação com o outro e com o mundo externo e/ou interno que o cerca.

Em muitos casos o reconhecimento de si mesmo e de nossos desejos é comprometido pela necessidade que temos de ser aceitos. Esse processo funcionaria assim, mais em direção à adequação a um mundo externo ou interno imaginário. O conhecimento ou a percepção de quais são os verdadeiros desejos, ou o que de fato preciso para meu crescimento, fica assim prejudicado dando origem a vários comportamentos que, de verdade, atrapalham um desenvolvimento mais pleno.

Pretensa generosidade

E então o egoísmo: costumamos chamar de egoísta uma pessoa autocentrada, que deseja tudo para si, que vê tudo a partir de seu ponto de vista e que não abre espaço para o outro com quem está em relação. Acontece que muitas vezes nos deparamos com a questão oposta: em nome de um “não egoísmo” ou de uma pretensa generosidade não conseguimos entrar em contato e fazer valer nossos desejos e necessidades mais importantes.

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Então: pessoas com essa dificuldade tendem a ser mais permeáveis aos desejos dos outros (muitas vezes ao que imaginam ser os desejos do outro), fazendo tudo o que o outro quer ou precisa, acreditando ser essa a postura correta. E, sofrem muito! Ao serem questionados a respeito de suas atuações nos trazem a clássica pergunta: “Dra. mas isso não é egoísmo?”

Esquecemos muitas vezes que egoísmo é necessário e saudável, que para poder estar bem com o outro é importante antes de tudo reconhecer e validar nossos próprios sentimentos e desejos. É mandatório reconhecer quem somos verdadeiramente e o que é necessário fazer para viver de forma mais integra e plena.

Aposto que ao poder fazer esse exercício estaremos também contemplando, aí de forma autêntica, os reais desejos e necessidades do outro com quem estou me relacionando.

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