Crianças podem ficar sozinhas em casa?

por Ceres Araujo

Pais costumam perguntar quando as crianças podem ser deixadas sozinhas em casa para que eles possam sair. A resposta mais acertada, possivelmente é a mais radical: nunca! Perguntam também, quando uma criança maior, irmão ou irmã pode ser responsabilizada por tomar conta dos menores. A resposta é a mesma: nunca!

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Criança, em todas as idades, precisa de atenção, cuidado, proteção, em suma, olhos em cima dela! Apenas a partir da adolescência ela poderia, e mesmo assim em alguns casos, ser convidada a cuidar dos pequenos.

A criança convidada, seduzida ou paga para cuidar dos irmãos pode se sentir valorizada até pela incumbência, mas ela não tem recursos internos, ainda, para assumir tal responsabilidade. Ela não tem a estabilidade afetiva, a regulação emocional, o controle sobre os impulsos adquiridos em um nível que possa garantir o poder tomar conta de crianças. Tenderá a se distrair, envolver-se em outra atividade, o que é próprio da idade e aí os riscos de acidentes aumentarão muito. Ela própria ainda precisa de olhos em cima dela, mesmo que seja mais à distância, em se comparar com os olhos em cima de uma criancinha.

Dar tal responsabilidade a essa criança mais velha, não é estimular autonomia ou crescimento. É dar uma responsabilidade para a qual ela ainda não é capaz e que pode ter consequências ruins. Caso algum acidente ocorra, uma culpa descabida cairá sobre essa criança. Fatores de risco em casa são abundantes, as crianças normais são altamente curiosas e adoram situações novas, o que aumenta muito o risco de problemas sérios, ferimentos, quedas, intoxicações, incêndios e mortes.

Quem toma conta de crianças são adultos que possam ser responsáveis. Escolhê-los bem é uma função não alienável dos pais. O contrário é negligência!

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Outra questão pode, então, ser formulada: vale deixar os adolescentes sozinhos, em casa?

Os cuidados ou receios dos pais quanto aos adolescentes não dizem tanto receio a acidentes, mas giram ao redor do que eles poderão fazer sozinhos. Falta completa confiança, em geral.

As crianças não podem ser deixadas sós, pois elas não sabem tomar conta de si mesmas, não sabem o que serve para elas, o que lhes faz bem e o que lhes faz mal. Quem sabe isso por elas, são seus pais. Elas não têm ainda adquirida a ética pessoal, que é a possibilidade de saberem tomar conta de si mesmas. Porém, tal aquisição é um processo gradual, que se inicia na infância e continua na adolescência, devendo estar pronto no final dela. Os pais são os principais mestres no encaminhar desse processo de aquisição de uma ética pessoal segura, estável e ao mesmo tempo flexível e adaptativa.

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Assim, criança na fase escolar já começa a precisar fazer escolhas a respeito do que ela gosta e do que, ao mesmo tempo, lhe faz bem e não faz mal ao outro – condições indispensáveis dessa forma de ética. Isso constitui um passo importante para aprender a tomar conta de si, para aprender a se responsabilizar sobre seu bem-estar e sobre uma conduta digna.

Autonomia

Outra condição fundamental nesse tema é o ganho de autonomia. A criança desde bem pequena necessita aprender a se entreter sozinha. Não pode ficar dependente o tempo todo do adulto para poder brincar. Ao brincar sozinha ela cria o mundo do faz de conta, no qual tudo é possível e pode desenvolver muito a função da imaginação, base importante para a criatividade e a inteligência. Além de se entreter, para desenvolver autonomia, os filhos devem conseguir, o mais precocemente que puderem, a independência nas atividades de vida diária. Quão poderosa a criança se sente ao conseguir fazer sozinha uma atividade que até então precisava das mãos dos adultos da casa! Para a criança normal cada ganho na autonomia é motivo de satisfação e orgulho e ela precisa ser muito valorizada por isso. Sozinha, saber comer, ir ao banheiro, se limpar, tomar banho, adormecer, dormir no próprio quarto a noite toda, etc. são sempre ganhos inesquecíveis para o filho.

Dessa forma, a aquisição de uma ética pessoal e o ganho da autonomia verdadeira, garantem aos pais, quando o filho já é adolescente, a sensação de segurança de que ele está pronto para tomar conta de si. A sensação de que ele é responsável, é confiável e que ele sabe que seus pais sabem disso. Portanto, ele poderá ficar só por algum tempo, poderá frequentar casa dos amigos, lugares públicos até, pois tem dentro de si as condições básicas que irão lhe garantir a integridade pessoal, física e psíquica.

Finalmente, cumpre lembrar que, nos nossos tempos, a alta tecnologia empresta aos pais auxílios incomparáveis. Os celulares e as redes sociais garantem formas múltiplas de comunicação, o que ajuda muito o controle da ansiedade de separação dos pais em relação aos filhos. Saibam, porém, que uma quantidade de ansiedade, originada pela separação, é sempre normal nos pais, quando pais e filhos se afastam e é natural que isso ocorra desde a hora do nascimento deles!