Por que aposentadoria tornou-se responsabilidade individual

por Eliana Bussinger

Existe um assunto que é recorrente na mídia e que funciona para a maioria das pessoas como o alarme das luzes amarelas intermitentes que vemos à porta de algumas saídas de garagens. Atenção, dizem as reportagens. Olhe o risco de falência das previdências públicas; veja os escândalos de fundos de pensões repentinamente esvaziados e que deixaram milhares de pessoas a ver navios; comova-se com o desamparo dos idosos nas filas dos hospitais e postos de saúde.

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O que estamos presenciando ao redor mundo – e no Brasil não é diferente – é um forte movimento de individualização da previdência, que retira, aos poucos, dos ombros dos governos e das empresas, e transfere para cada indivíduo, a responsabilidade pelo acúmulo das reservas financeiras que serão utilizadas na velhice.

Portanto, a tirania é essa: porque o futuro existe e chega – ao menos para a maioria de nós – torna-se necessário administrá-lo paralelamente ao presente. A responsabilidade pelo tipo de vida que iremos viver já é nossa, dado que parece ser de mais ninguém.

Tanto alarde nos levaria a crer que as pessoas já se aperceberam com clareza de que é preciso se adequar às mudanças e se precaver financeiramente para a aposentadoria. No entanto, isso está longe de ser a realidade. Se de fato houvesse um entendimento público de que milhões de pessoas estarão muito vulneráveis no envelhecimento, alguns em curto espaço de tempo, as estatísticas de poupança e endividamento não seriam tão preocupantes.

A verdade é que ainda são raras as pessoas que sabem que terão de ser investidoras vitaliciamente e que essa condição é indiscutível para garantir as contribuições necessárias que irão reduzir as vulnerabilidades lá na frente.

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Dilema: administrar presente e futuro de uma vez só

Muitos nada fazem simplesmente porque não ganham o suficiente para administrar o presente e o futuro de uma vez só. Outras se endividam muito além do que deveriam, roubando do próprio futuro ao pagar juros exorbitantes. Algumas outras poupam, mas de maneira episódica e desordenada.

Mesmo os que adquirem os planos de previdência privada, do tipo PGBL por exemplo, nem sempre perseveram. A utilização das reservas colocadas nesses fundos é constante. Trinta ou quarenta anos é horizonte demais para quem está acostumado a pensar em salários mensais ou em administração do dia seguinte.

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Além de cultura e de treino de visão de longo prazo, falta ao brasileiro o conhecimento que é preciso para avaliar os produtos de previdência disponíveis, tais como tempo, taxas de administração e carregamento, rentabilidade e segurança das instituições.

Ainda assim, muitas pessoas já aceitaram que precisarão sacrificar a realização de outros sonhos e a qualidade de vida no presente ou jamais acumularão a pequena fortuna que será necessária para um envelhecimento de qualidade e de independência. Mas muitas pessoas não sabem o que fazer ou como se prevenir.

Portanto, por mais polêmica que a questão previdenciária seja, apenas tornar público a existência do problema não é suficiente. O objetivo de curto prazo dos governos e de seus parceiros privados deveria ser aumentar as habilidades do público para lidar com isso.

Alertar as pessoas é bom, mas é preciso ir além. É necessário aumentar os níveis de confiança com relação ao planejamento de seus futuros, através de sérias campanhas de escopo nacional, que busquem a conquista da cidadania financeira! Os governos, as escolas e os agentes financeiros precisam promover a democratização do conhecimento financeiro, para que todos possam aprender a enfrentar os desafios de tantas mudanças sociais.