Fúnebre vingança dos ecochatos

por Roberto Goldkorn

Tenho 66 anos, nem parece, dizem sempre os mais gentis. Mas sou de 1950, uma década que será lembrada, pelos que sobrarem, como um tempo inocente e onde éramos felizes e não sabíamos. Mas já na década de 70, comecei a ficar chato. Minhas leituras e elaborações me diziam que estávamos caminhando para um abismo global. Em 1980 já participei de um seminário no Rio de Janeiro (Parque Lage) chamado 'Seminário de Orientação para a Sobrevivência', cuja sigla era a singela S.O.S.

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Meus pais, quando eu começava a minha arenga ecológica em casa praticamente me escorraçavam. Meus amigos foram rareando, porque quando eu chegava diziam entre dentes: "Lá vem aquele chato com aquela conversa apocalíptica.” Nos churrascos em que os raros incautos me convidavam, eu não perdia a viagem para falar do preço altíssimo que as florestas estavam pagando para abrir espaços para as suas picanhas, chuletas e maminhas. Minha mulher coitada se exasperava com a diminuição flagrante do nosso círculo de amigos. Quando fui conquistando mais projeção notei que esses temas não davam ibope. Minhas filhas, não comiam carne, não bebiam refrigerante, nem comiam açúcar branco, eram vistas com comiseração pelas mães de coleguinhas, vizinhas e outras. “Coitadas dessas crianças. O que esse pai desnaturado as fazem passar.”

As tentativas de sabotagem das minhas convicções vinham de toda a parte. Eu havia me tornado uma pessoa inconveniente, tentando trazer temas desagradáveis à discussão, tentando mobilizar as pessoas a mudarem suas atitudes do dia-a-dia. Com a idade fui amaciando o meu espírito de paladino, aprendi a refrear a minha “chatice”, afrouxei os laços do controle sobre mim e sobre a minha família, até porque sabia que a vaca iria pro brejo de uma forma ou de outra. Mas o que mais me aborrecia e me inquietava era a frase que eu repetia para mim mesmo: “Quando chegar a hora o justo pagará pelo pecador.” Hoje sei que pagará o justo e o pecador, não sei que tipo de justiça divina é essa mas, quem sou eu para querer saber sou apenas um ex-ecochato aposentado.

No último texto nesta coluna, falei do vidente Jucelino da Luz, que previu algumas catástrofes ecológicas monumentais, e a derrota do Lula. Ele errou essa predição, mas isso não quer dizer que podemos respirar aliviados e continuar com a nossa insana relação destrutiva achando que sairemos impunes. O relatório de outro “vidente” o ex-diretor econômico do Banco Mundial, é também muito chato, ele prognostica coisas bem chatas para o futuro de curto prazo da humanidade.

O que podemos fazer?

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Economizar água. Simplificar a nossa vida, as nossas necessidades tanto físicas quanto emocionais. Cuidar melhor da nossa saúde, para não depender tantos dos médicos e dos remédios que estarão muito ocupados com “outros” problemas. Buscar a autosuficiência, aprender a lidar com a terra, fortalecer as pernas em longas caminhadas, e acima de tudo fortalecer a força do espírito, sem elas estaremos mais perdidos que os mais perdidos. Mas vou parar por aqui, não quero que você me ache um eco-catastrófico-chato.