Estilo de vida influencia capacidade cognitiva

por Elisandra Vilella G. Sé

O envelhecimento é um processo de mudanças no funcionamento biológico, psicológico e social do indivíduo, determinado pela interação contínua de fatores genético-biológicos, psicológicos e comportamentais, do ambiente natural, fatores socioculturais e históricos.

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O contexto sócio-histórico-cultural é o que oferece ao ser humano a oportunidade dessa interação contínua de todas as variáveis que contextualizam o processo de envelhecimento, e que é fundamental à socialização e manutenção das potencialidades.

Portanto, a velhice é uma experiência heterogênea, que comporta ganhos e perdas e é determinada por um amplo espectro de variáveis em interação.

No processo de envelhecimento, os aspectos linguísticos-cognitivos podem estar não só relacionados à idade, mas principalmente às relações das pessoas idosas com o contexto em que vivem, uma vez que as mudanças linguísticas e cognitivas na vida adulta e na velhice não significam necessariamente descontinuidade da capacidade adaptativa e incompetência cognitiva em utilizar e manter as experiências e conhecimentos acumulados ao longo da vida.

Fatores intrínsecos, como genética e gênero, por exemplo, não podem ser controlados e não são modificáveis, mas fatores extrínsecos, como estilo de vida, hábitos, práticas culturais, engajamento social e ocupacional podem ser modificados e têm grande influência na capacidade cognitiva.

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Estudos: linguagem do idoso

Um dos estudos pioneiros sobre a linguagem de idosos no campo da linguística, realizado pelo linguista Dino Preti, afirma que "a fala do idoso não pode ser tomada numa perspectiva isolada".

Segundo o autor, as características da fala de uma pessoa idosa, nos diversos níveis de análise, aponta que as diferenças básicas entre essa linguagem e a dos falantes mais jovens reside mais na "intensificação" repetições, pausas, hesitações e desvios de tópicos que são mais evidenciados na idade avançada. Segundo PRETI, as ocorrências como: excesso de pausas e sua presença em locais absolutamente inesperados do discurso; repetições; abandono de segmentos; maior desorganização sintática; e falta de fluência compõem um quadro absolutamente normal. Essas ocorrências devem-se ao fato de a língua falada não possuir um planejamento prévio, é planejada localmente, ou seja, no momento da conversa, no contexto da interação.

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A intensificação desses elementos na linguagem das pessoas mais velhas se deve a fatores naturais, psicofísicos (maior lentidão das reações na comunicação ativa ou receptiva, os problemas de audição e memória) e a outros de natureza sociocultural, como a situação estigmatizada dos velhos na sociedade contemporânea, o que lhes acarreta uma insegurança manifestada em todos os atos de sua vida e, muito particularmente, no seu discurso.

Mas essas variações dos processos de repetição e nas autocorreções que interferem na fluência do discurso de pessoas mais velhas – mecanismos estratégicos que elas utilizam para compensar problemas de "disfluência" que ocorrem ao nível prosódico (melodia da fala) – lhes permitem sustentar o andamento, isto é, apesar de tudo, seu discurso é levado adiante.

Na fala dos idosos é frequente as narrativas pessoais, devido à experiência acumulada ao longo da vida. A melhor qualidade nas histórias dos idosos está no fato dos tópicos serem guiados pelo interesse pessoal, talvez mais do que pelo interesse de seu interlocutor.

Suas narrativas possuem certo grau de originalidade. Quanto mais os fatos se apresentam como inusitados, tanto maior a atenção do ouvinte do discurso narrativo.

Alguns estudos mostram que em idade avançada (80-90 anos) as pausas tendem a aumentar, enquanto o tempo de articulação tende a decrescer, o que de certa forma significa que na velhice não só os aspectos motores, mas também os cognitivos do comportamento verbal se tornariam enfraquecidos, como por exemplo, o surgimento das falhas de memória recente.

Uma função linguística relacionada à memória muito comum nos idosos são as dificuldades de recuperação da palavra, o fenômeno chamado "ponta da língua", que diz respeito às dificuldades de encontrar palavras.

Os lapsos de memória constituem um dos problemas mais importantes para a perda do ritmo normal na fala de pessoas mais velhas. No entanto, a rememoração se torna mais fácil com acontecimentos ocorridos há mais tempo, do que com acontecimentos mais recentes. Dessa forma, percebe-se que as pessoas mais velhas constroem boa parte de seu discurso, relacionado com um passado sobre o qual ainda têm pleno domínio de memória; ao qual ainda de certa forma ainda estão muito "presas"; e dentro do qual estão acontecimentos, lugares, coisas, pessoas e frases que fazem parte dessa história e da maneira de analisar o tempo presente.