Bem-vindo a bordo ou salve-se quem puder

por Roberto Santos

Parodiando aquele famoso comercial da Década de 80 sobre sutiãs, os primeiros dias em uma nova empresa, a gente nunca se esquece. E, infelizmente, para a maioria das pessoas, a experiência não costuma ser inesquecível por boas razões. Por melhor que seja a embarcação, subir a bordo sempre traz inseguranças e dúvidas sobre se poderemos contar com a tripulação para atingirmos nosso destino sãos e salvos.

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Já se comprovou em pesquisas que muitas vagas que levaram meses para serem preenchidas, depois de encontrado o candidato que se crê ideal, desocupam-se novamente nos primeiros sete meses de serviço. A causa mais provável desse acidente de percurso e desperdício de investimento em recrutamento e seleção é a escassa atenção à integração dos novos tripulantes.

Enganam-se os gestores e o pessoal de RH, com a ilusão de que findo o demorado e árduo processo de contratação, tudo conspirará a favor da pronta adaptação do estranho no barco. Engana-se o novo colaborador que se via como visitante e agora passa a integrar a tripulação, com altas expectativas da parte de todos, achando que todos colegas e chefes estarão dedicados a facilitar seu período de aculturação e treinamento.

Batalhas inglórias de alguns heróis e heroínas de Recursos Humanos que entra década e sai outra, tentam viabilizar um processo de integração de novos funcionários que facilite a vida do marinheiro mais novo e a retenção de seu talento. As famosas “palestras de integração” em audiovisuais modestos com os quase extintos slides do início de minha carreira, passaram para vídeos, DVDs e chegaram à intranet globalizada em altas produções, movidas a tecnologias interativas sofisticadas.

Ainda assim, os fracassos dessas iniciativas se sucedem nas empresas – prioriza-se a cascata de informações e se esquece do apoio e engajamento humanos. Planos mirabolantes e complexos de padrinhos, tutores e mentores são criados pelas organizações que também acabam morrendo na praia em muitos casos.

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O novo tripulante precisa, sem dúvida, saber da história e das dimensões da nau que o embarcou; ajuda, de fato, saber das atrações especiais e onde fica o salva-vidas, para casos de emergências. No entanto, são as sutilezas da cultura, aquelas não escritas nos manuais de operação daquele equipamento que podem ser subestimadas por ambas as partes. O chefe de cada departamento e seus subordinados diretos são os responsáveis pelo processo de garantir uma abordagem e uma viagem prazerosa e produtiva para todos.

Então, o que é que cabe a cada parte envolvida nesse processo – comandante e tripulação de um lado e o novo colaborador de outro?

Comandante e equipe

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Uma das missões indelegáveis de um gestor é a responsabilidade (ainda que “terceirize” certas tarefas desse processo) pela facilitação do processo de integração de um novo membro na equipe e isso inclui, pelo menos:

• Rever com o novo contratado suas atribuições de cargo, incluindo os indicadores de desempenho bem-sucedido, as prioridades para os seis primeiros meses e as interfaces de clientes e fornecedores internos para realização de seu trabalho;

• Apresentar os novos colegas (que idealmente deveriam ter sido envolvidos na fase final de seleção…) e provocar trocas de expectativas e contribuições potenciais de ambos os lados para um “contrato relacional” eficaz ajuda a limpar canais de comunicação ainda no começo da relação. Como sabemos, discutir a relação mais tarde é sempre mais trabalhoso e frustrante;

• Fazer um “check-list” sobre as regras, procedimentos, políticas, benefícios, etc que poderão ser cobrados e/ou usufruídos nas primeiras semanas do recém-chegado é um ótimo preventivo de mancadas que depois afetarão a imagem de forma negativa;

• Conversar sobre aquelas sutilezas culturais e regras do que pega bem e o que é inaceitável na organização pode parecer perda de tempo e algo subestimado mas pode salvar o novo marinheiro a ser colocado na prancha como o Capitão Gancho com destino às presas dos crocodilos famintos;

• Acompanhar o processo de aprendizagem e integração diariamente na primeira semana, passando a semanal, mensal e depois conforme a necessidade.

Em outras palavras, o Chefe deve passar a certeza ao novo membro de sua área de trabalho de que ele(a) não é um(a) clandestino(a) e poder ficar tranquilo de que essa atenção dedicada ao processo de boas vindas a bordo acabará por resultar em engajamento e resultados.

O novo tripulante

Marinheiros de primeira viagem em uma nova embarcação precisam estar alertas aos perigos na hora de abordar e em alto mar para que não sofram as náuseas da carreira despencando logo no começo:

• Querer mostrar serviço para que ninguém tenha dúvida de que você era o(a) melhor candidato(a) que poderia ter passado no processo seletivo, antes de que tenha entendido o que, como e por que fazer ou não fazer pode ser uma iniciativa arriscada;

• Achar que se deve ter resposta a todos os problemas é um risco complementar ao anterior, pois queremos assegurar a nossos interlocutores de que somos inteligentes e experientes. Entretanto, o que eles mais querem é mostrar o quanto eles sabem mais do que você, pelo menos no contexto da sua empresa. Aqui, você é o ignorante. Assumir essa condição com humildade e perguntar sobre como tudo funciona ali, é a postura mais sábia a adotar em seu primeiro mês, pelo menos;

• Segundo o princípio Danuza Leão, geralmente não se tem uma segunda chance de causar uma primeira impressão. Por isso, não se engane, quando você acaba de chegar a qualquer grupo novo, você estará todo o tempo na vitrine, até que já faça parte da paisagem do lugar. Portanto, cuide de sua imagem, do que faz, do que diz ou deixa de dizer;

• Falar demais do emprego anterior é outro pecado comum de calouro corporativo. Nem sempre falamos do último emprego para uma comparação depreciativa em relação ao novo empregador, mas para quem está recebendo o estranho em sua casa, não se quer saber dos próprios podres ou de que há melhores paragens além-mar. Fazer comentários gratuitos sobre como a grama de seu ex era mais verde pode ser arriscado; porém, responder à curiosidade dos colegas, com descrições parcimoniosas e factuais sobre a outra empresa, é uma forma bem mais segura para não se ferir susceptibilidades;

• Assumir rancores e desilusões alheias, seja sobre pessoas, projetos ou políticas, pode ser uma tentação, mas comprar o peixe do jeito que querem lhe vender, pode fazer com que você acabe com alguma podridão gratuita em seu colo. Espere para ter a sua experiência com aquelas pessoas ou situações para tirar as suas próprias conclusões;

• Outra tentativa de sedução de sereias do ambiente de trabalho é o convite para fazer parte das famosas panelinhas. Sobre esse tema, escrevi outro artigo “Panelas e Frigideiras Corporativas”(clique aqui e leia). Na busca de agradar alguns interlocutores entramos precocemente para o clube dos “contra-o-gerente-do-outro-departamento” e compramos brigas que não são nossas. O risco de escorregar da panela direto para uma frigideira é muito grande. Por isso, manter-se imparcial como um astuto lobo do mar, é a atitude mais segura na viagem que acaba de iniciar.

Ambas as partes podem contribuir para que a carreira de uma pessoa ou a reputação de uma empresa como um bom lugar para se trabalhar esteja marcada para o naufrágio ou para a chegada celebrada ao destino almejado do navio. A tripulação precisa mostrar ao novato onde ficam os botes salva-vidas e ambas as partes devem se esforçar para que nunca precisem ser usados.

Bem-vindo a bordo ou salve-se quem puder

por Roberto Santos

Parodiando aquele famoso comercial da Década de 80 sobre sutiãs, os primeiros dias em uma nova empresa, a gente nunca se esquece. E, infelizmente, para a maioria das pessoas, a experiência não costuma ser inesquecível por boas razões. Por melhor que seja a embarcação, subir a bordo sempre traz inseguranças e dúvidas sobre se poderemos contar com a tripulação para atingirmos nosso destino sãos e salvos.

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Já se comprovou em pesquisas que muitas vagas que levaram meses para serem preenchidas, depois de encontrado o candidato que se crê ideal, desocupam-se novamente nos primeiros sete meses de serviço. A causa mais provável desse acidente de percurso e desperdício de investimento em recrutamento e seleção é a escassa atenção à integração dos novos tripulantes.

Enganam-se os gestores e o pessoal de RH, com a ilusão de que findo o demorado e árduo processo de contratação, tudo conspirará a favor da pronta adaptação do estranho no barco. Engana-se o novo colaborador que se via como visitante e agora passa a integrar a tripulação, com altas expectativas da parte de todos, achando que todos colegas e chefes estarão dedicados a facilitar seu período de aculturação e treinamento.

Batalhas inglórias de alguns heróis e heroínas de Recursos Humanos que entra década e sai outra, tentam viabilizar um processo de integração de novos funcionários que facilite a vida do marinheiro mais novo e a retenção de seu talento. As famosas “palestras de integração” em audiovisuais modestos com os quase extintos slides do início de minha carreira, passaram para vídeos, DVDs e chegaram à intranet globalizada em altas produções, movidas a tecnologias interativas sofisticadas.

Ainda assim, os fracassos dessas iniciativas se sucedem nas empresas – prioriza-se a cascata de informações e se esquece do apoio e engajamento humanos. Planos mirabolantes e complexos de padrinhos, tutores e mentores são criados pelas organizações que também acabam morrendo na praia em muitos casos.

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O novo tripulante precisa, sem dúvida, saber da história e das dimensões da nau que o embarcou; ajuda, de fato, saber das atrações especiais e onde fica o salva-vidas, para casos de emergências. No entanto, são as sutilezas da cultura, aquelas não escritas nos manuais de operação daquele equipamento que podem ser subestimadas por ambas as partes. O chefe de cada departamento e seus subordinados diretos são os responsáveis pelo processo de garantir uma abordagem e uma viagem prazerosa e produtiva para todos.

Então, o que é que cabe a cada parte envolvida nesse processo – comandante e tripulação de um lado e o novo colaborador de outro?

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Uma das missões indelegáveis de um gestor é a responsabilidade (ainda que “terceirize” certas tarefas desse processo) pela facilitação do processo de integração de um novo membro na equipe e isso inclui, pelo menos:

• Rever com o novo contratado suas atribuições de cargo, incluindo os indicadores de desempenho bem-sucedido, as prioridades para os seis primeiros meses e as interfaces de clientes e fornecedores internos para realização de seu trabalho;

• Apresentar os novos colegas (que idealmente deveriam ter sido envolvidos na fase final de seleção…) e provocar trocas de expectativas e contribuições potenciais de ambos os lados para um “contrato relacional” eficaz ajuda a limpar canais de comunicação ainda no começo da relação. Como sabemos, discutir a relação mais tarde é sempre mais trabalhoso e frustrante;

• Fazer um “check-list” sobre as regras, procedimentos, políticas, benefícios, etc que poderão ser cobrados e/ou usufruídos nas primeiras semanas do recém-chegado é um ótimo preventivo de mancadas que depois afetarão a imagem de forma negativa;

• Conversar sobre aquelas sutilezas culturais e regras do que pega bem e o que é inaceitável na organização pode parecer perda de tempo e algo subestimado mas pode salvar o novo marinheiro a ser colocado na prancha como o Capitão Gancho com destino às presas dos crocodilos famintos;

• Acompanhar o processo de aprendizagem e integração diariamente na primeira semana, passando a semanal, mensal e depois conforme a necessidade.

Em outras palavras, o Chefe deve passar a certeza ao novo membro de sua área de trabalho de que ele(a) não é um(a) clandestino(a) e poder ficar tranquilo de que essa atenção dedicada ao processo de boas vindas a bordo acabará por resultar em engajamento e resultados.

O novo tripulante

Marinheiros de primeira viagem em uma nova embarcação precisam estar alertas aos perigos na hora de abordar e em alto mar para que não sofram as náuseas da carreira despencando logo no começo:

• Querer mostrar serviço para que ninguém tenha dúvida de que você era o(a) melhor candidato(a) que poderia ter passado no processo seletivo, antes de que tenha entendido o que, como e por que fazer ou não fazer pode ser uma iniciativa arriscada;

• Achar que se deve ter resposta a todos os problemas é um risco complementar ao anterior, pois queremos assegurar a nossos interlocutores de que somos inteligentes e experientes. Entretanto, o que eles mais querem é mostrar o quanto eles sabem mais do que você, pelo menos no contexto da sua empresa. Aqui, você é o ignorante. Assumir essa condição com humildade e perguntar sobre como tudo funciona ali, é a postura mais sábia a adotar em seu primeiro mês, pelo menos;

• Segundo o princípio Danuza Leão, geralmente não se tem uma segunda chance de causar uma primeira impressão. Por isso, não se engane, quando você acaba de chegar a qualquer grupo novo, você estará todo o tempo na vitrine, até que já faça parte da paisagem do lugar. Portanto, cuide de sua imagem, do que faz, do que diz ou deixa de dizer;

• Falar demais do emprego anterior é outro pecado comum de calouro corporativo. Nem sempre falamos do último emprego para uma comparação depreciativa em relação ao novo empregador, mas para quem está recebendo o estranho em sua casa, não se quer saber dos próprios podres ou de que há melhores paragens além-mar. Fazer comentários gratuitos sobre como a grama de seu ex era mais verde pode ser arriscado; porém, responder à curiosidade dos colegas, com descrições parcimoniosas e factuais sobre a outra empresa, é uma forma bem mais segura para não se ferir susceptibilidades;

• Assumir rancores e desilusões alheias, seja sobre pessoas, projetos ou políticas, pode ser uma tentação, mas comprar o peixe do jeito que querem lhe vender, pode fazer com que você acabe com alguma podridão gratuita em seu colo. Espere para ter a sua experiência com aquelas pessoas ou situações para tirar as suas próprias conclusões;

• Outra tentativa de sedução de sereias do ambiente de trabalho é o convite para fazer parte das famosas panelinhas. Sobre esse tema, escrevi outro artigo “Panelas e Frigideiras Corporativas”(clique aqui e leia). Na busca de agradar alguns interlocutores entramos precocemente para o clube dos “contra-o-gerente-do-outro-departamento” e compramos brigas que não são nossas. O risco de escorregar da panela direto para uma frigideira é muito grande. Por isso, manter-se imparcial como um astuto lobo do mar, é a atitude mais segura na viagem que acaba de iniciar.

Ambas as partes podem contribuir para que a carreira de uma pessoa ou a reputação de uma empresa como um bom lugar para se trabalhar esteja marcada para o naufrágio ou para a chegada celebrada ao destino almejado do navio. A tripulação precisa mostrar ao novato onde ficam os botes salva-vidas e ambas as partes devem se esforçar para que nunca precisem ser usados.