Para onde vamos?

Por Roberto Goldkorn

Não sei se todos vocês sabem, mas a raça humana nunca esteve tão perto de virar pó. Mesmo olhando com os olhos mais otimistas e cor-de-rosa possível, mas com suficiente informação, vamos chegar à conclusão de que no mínimo corremos risco de chegarmos ao fim do jogo com o time bem desfalcado. Escolha a hipótese que lhe aprouver: meteoro gigante, aquecimento global, pandemias sucessivas, guerra bacteriológica, ou tudo isso junto. As evidências estão aí para quem quiser ver: nos jornais, na TV, nos livros, a gente até pode tropeçar nelas nas ruas. Mas principalmente no excelente e perturbador livro do filósofo John Gray – Cachorros de Palha (Editora Record) -, que fala da descartabilidade do ser humano com uma frieza de dar arrepios.

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Mas pergunto a você leitor, a sua vizinha perde o sono por causa disso? Ou por acaso o seu chefe já marcou reuniões para decidir ações para criar alternativa ao holocausto global? Você, sim, você mesmo que está aí me lendo neste momento. O que mais o preocupa: o sonho que teve na semana passada, a grana curta para todos os compromissos, ou os efeitos da devastação da Amazônia para o futuro da biosfera? Noventa por cento das mensagens que recebo via Internet, são de pessoas desesperadas por causa dos seus relacionamentos, curiosas acerca de seus sonhos (aquilo que fazemos quando dormimos), preocupadas com a sua assinatura ou com o Feng Shui da sua casa.

Será isso uma espécie de baile do Titanic? Estaríamos todos nós (ou quase todos) fazendo como o avestruz folclórico que ante a aproximação do grande perigo enfia a cabeça no buraco, achando que é malandro e que assim vai se safar? O mundo vai mesmo acabar e enquanto eu me descabelo fazendo compras na José Paulino? Quem está do lado certo? Os cientistas apocalípticos que dão como certo o débâcle da espécie humana, ou nós que somos legiões, que ainda fazemos pecúlio para sacar daqui a vinte anos, ou quarenta? Qual seria a atitude mais saudável? Militar insanamente em ONGS e Partidos Verdes do mundo para tentar reverter essa corrida em direção ao abismo? Continuar a fazer compras na Daslu ou na José Paulino? Ou nenhuma das respostas anteriores?

Eu Quixote que sou desde menininho, estarei sempre de lança em punho, morrerei lutando, como sempre disse. Mas cada vez mais me convenço da impotência radical da nossa espécie, para mudar um milímetro do seu destino seja ele qual for. Cada vez mais me convenço que a nossa importância como espécie foi um grande logro, um golpe de marketing de proporções universais que deu certo. Nós não temos importância alguma. A Terra é um cisco perdido no imenso universo galáctico. A nossa galáxia é ridícula perto de outras, em extensão e em número de estrelas. Como diz John Gray: “O homo rapiens (homem rapinante como ele chama os atuais humanos), é apenas uma dentre muitas e muitas espécies, e não obviamente merecedora de ser preservada. Mais tarde ou mais cedo será extinta. Quando tiver partido, a Terra se recuperará. Muito depois de terem desaparecidos os últimos traços do animal humano, muitas das espécies que ele está empenhado em destruir ainda continuarão aqui, juntamente com outras que ainda irão despontar. A Terra esquecerá a humanidade. O jogo da vida seguirá.”

Apesar disso tudo, ele pode estar errado, e nós que fazemos compras, nos preocupamos com a nossa vida sexual, compramos um pecúlio de longo prazo, e nos desesperamos porque a tintura de cabelo saiu errada, podemos estar certos. Ou ambos podemos estar errados. Afinal, como o mesmo John Gray disse, a verdade não conta: “Na luta pela vida , um gosto pela verdade é um luxo, ou então uma incapacidade.”

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Sendo assim acho mais que legítimo a minha preocupação com o peru de Natal (não sei se compro vivo ou faço como todo mundo), e a sua em saber se o seu namorado a ama mesmo ou não. É Natal, é Réveillon, vamos beber o décimo terceiro, falar mal da vida alheia, fingir que acreditamos no ‘espírito natalino’ dos comerciantes, e com o canto do olho olhamos o livro Cachorros de Palha, nem um pouco ameaçador caído sobre a mesa.

 

Para onde vamos?

por Dulce Magalhães

Nos idos de 1500, nossos patrícios portugueses se lançaram numa das mais fascinantes aventuras humanas, a descoberta do Novo Mundo. Podemos imaginar a coragem daqueles navegadores que enfrentavam as dificuldades de mares desconhecidos, com suas frágeis Caravelas, e buscavam concretizar a "fantasia" de alcançar novas e verdejantes terras.

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Hoje, 500 anos depois das primeiras descobertas, o ser humano está se lançando numa viagem ainda mais fascinante, também repleta de perigos e que pode mudar completamente, mais uma vez, o rumo da História.

Estamos cruzando os limites da produção e manutenção da vida. A clonagem de animais já abre possibilidades para clonagem de órgãos humanos. Muito mais adequados, os órgãos clonados seriam do próprio paciente e não correriam o risco de rejeição. Transplantes de cabeça (!), por exemplo, já são tratados como possibilidades científicas e não mais como ficção. Uau! Essa taquicardia e inquietação que nos afeta ao vermos e ouvirmos sobre tais notícias são um misto de curiosidade mórbida e horror esperançoso.

O fato de não vislumbrarmos o que vem depois desse horizonte próximo, nos dá vertigem. Parece que estamos subindo rápido demais pela montanha da longevidade; entretanto, o cume não está à vista e retornar se mostra mais arriscado ainda. Mudanças poderosas nos assustam. Desde a descoberta do fogo, o ser humano vive em sobressaltos graças à sua própria curiosidade progressista. Nosso histórico moral não garante que todas as descobertas trarão benefícios à humanidade. A energia atômica foi utilizada para cura do câncer e para dizimar milhares de pessoas.

Estaremos cruzando uma fronteira ética? Devemos avançar pelo desconhecido e inóspito caminho que se apresenta? Quem sabe! Percepção e instinto não garantem nenhum tipo de resposta e o conhecimento só será possível após o avanço. Assim vivemos um paradoxo entre o progresso e a moral. Há muito o que se descobrir sobre a Natureza, o Planeta, o Universo. Contudo, há muito mais a descobrir sobre nós mesmos. É duvidável que se possa responder a eterna pergunta Quo Vadis? (aonde vais?) em uma busca externa. O tempo se mostra tão escasso, há tanto a saber. Estaremos fazendo as perguntas certas? Parece que o dedo apontando para fora, exigindo mudanças ao redor, não apresenta a solução esperada.

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Uma reflexão humana sobre a ética que conduz nossas relações. Um olhar prolongado sobre os valores que estamos repassando para nossas crianças. Uma projeção do futuro a partir de mudanças significativas em nossa organização social e distribuição de oportunidades. Todos esses pensamentos somados, a partir de um amplo plano pessoal de mudança e de sua aplicação, vão gerar respostas poderosas para o processo de ser cada vez mais humano.

Parece ilógico que o Ser Humano precise aumentar o seu nível de Humanidade. Entretanto. é isso o que realmente nos falta para cruzarmos sem medo qualquer fronteira. Podemos nos lançar no mar da incerteza, navegando nas Caravelas do Progresso. Podemos descobrir Novos Mundos, novas dimensões ou novas formas de viver nesse nosso Velho Mundo. Apenas devemos pensar que os fins não justificam mais os meios. A maneira que escolhermos trilhar o progresso vai definir o resultado alcançado. A eficiência vem substituir o reinado da eficácia. Vencer a qualquer custo tem cobrado um preço alto demais.

O Homem já conseguiu deixar a marca de seus passos no solo lunar. A telefonia chega aos confins da Terra. Máquinas poderosas podem até voar. Só não sabemos ainda como cavar um poço no ressequido Nordeste brasileiro ou diminuir a violência no trânsito. Talvez com todos esses avanços, o ser humano esteja um pouco mais próximo de Deus. EntendÊ-lo, conhecÊ-lo, certamente nos fará melhores. Entretanto, o grande risco será de tentarmos substituir Deus. Será que se pode clonar almas?!

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