Perder ilusões é essencial ao crescimento

por Cristina Balieiro

Quando era criança, amava com veneração quase absoluta o Papai Noel! E não era só por causa dos brinquedos que ele trazia para mim que eu amava aquela figura, mas acima de tudo por sua magia!

Continua após publicidade

Na minha cabecinha infantil, ele ocupava o lugar de um deus imensamente rico. Afinal, ele trazia brinquedos para todas as crianças do mundo: de enorme bondade e poder… tudo podia. Ele me encantava profundamente, me fazendo sentir pertencer a um mundo extraordinário.

Perder a ilusão de sua existência foi uma das minhas primeiras grandes dores. Eu devia ter uns seis ou sete anos, quando acordei de madrugada e vi meu pai carregando minha bicicleta tão aguardada. Fiquei imensamente triste: parte da minha tenra meninice morreu ali.

Mas não pensem que sou contrária a acalentar sua lenda para as crianças. Falei dele e contei suas histórias para minha filha e hoje faço o mesmo com meu neto. Acho que a magia do mundo e a fantasia devem fazer parte essencial da infância. São alimentos da alma!

Muitas ilusões não são más em si e podem ser até valiosas em uma etapa da vida; muitas delas fazem parte do mundo imaginativo. E perder ilusões, apesar de doer muito, é parte essencial do processo de crescer.

Continua após publicidade

E não acho também que para isso se precisa cair num mundo árido, desesperançoso, cinzento e triste. De maneira alguma!

O que precisamos, ao crescer e amadurecer, é transformar a ilusão em símbolo, em metáfora, em Sentido.

A busca do príncipe ou da princesa encantada precisa ser transformada na busca da gente mesmo, da nossa alma, pois como diz Fernando Pessoa: “Conta a lenda que dormia – Uma Princesa encantada – A quem só despertaria – Um Infante, que viria – De além do muro da estrada… Ergue a mão, e encontra hera, E vê que ele mesmo era – A Princesa que dormia”.

Continua após publicidade

Ou seja, a gente se encontra com a gente mesmo, com partes da gente não integradas e, depois, Inteiro, pode de fato perceber e encontrar o Outro: Inteiro.

Aqueles pais perfeitos desejados precisam virar a consciência de que a gente tem que se tornar pai e mãe da gente mesmo e “nos parir” como adultos. Ter consciência que nossos pais reais são seres falíveis e que nos deram o que puderam dar. Perceber que nunca é tarde para se ter uma infância feliz e que cabe a nós cuidarmos de nossa criança ferida.

A crença numa vida sem sofrimento e perda, tem que virar a crença que tudo pode virar aprendizado e crescimento e que é no enfrentamento das dificuldades que construímos nossa força. E assim por diante… Sempre tirando o sentido literal e concreto de nossas crenças e transformando-as em símbolos. Isso é tornar-se um ser humano adulto, construindo a própria identidade e virando protagonista de sua história. E ao mesmo tempo habitando um mundo com significado.

Então, continuando nessa reflexão, vejo no cerne da crença no Papai Noel (pelo menos na minha crença) uma visão otimista de viver, focada na abundância e não na escassez e sim no prazer de estar vivo!

Para mim o Papai Noel é a metáfora infantil para a fé na vida!