Insistir em se impor à vida pode custar caro

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por Roberto Goldkorn

Conheci um sujeito que sonhava em ter uma factoring (espécie de minibanco dedicado a fazer empréstimos financeiros). Muita gente ainda tentou dissuadi-lo da ideia, mas ele sempre foi um rapaz de “personalidade”. Tentou várias vezes, nada dava certo, mas ele tinha “opinião” e continuou tentando.

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Finalmente ele conseguiu, achou um sócio perfeito que contribuiu para concretizar o negócio. Quando o conheci, ele estava fugindo do país, porque sua família foi ameaçada, sua casa depredada e sua vida se tornou um inferno.

O que aconteceu? Seu sócio perfeito deu um desfalque e ele não pôde pagar aos investidores, que como se pode imaginar, não ficaram nada felizes.

Tenho colecionado casos de pessoas que insistiam em se impor à vida, com egos monumentais, cabeçudas e que quando tinham sucesso, acabavam mais tarde descobrindo o porquê de a vida estar bloqueando aquele aspecto.

Conheci uma mulher cujo maior sonho era ter filhos, mas como isso não era possível, decidiu adotar. Seu marido foi contra, sua mãe também, pelos motivos que cada um apresentou na época. Mas ela insistiu, sempre foi conhecida como uma mulher de personalidade forte. Acabou vencendo. Adotou uma criança que foi abandonada. Sua mãe que lhe dava apoio na criação dessa criança morreu três anos depois, e seu marido que exercia o papel da autoridade diante do menino já pré-adolescente também se foi.

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Ela funcionária pública já sentia muita dificuldade em lidar com o menino agressivo, rebelde, que trazia todos os dias más notícias da escola e era cada vez mais uma grande dor de cabeça. Quando ela me procurou, seu filho agora com dezesseis anos, praticamente um homem forte, alto, havia acabado de lhe agredir pela décima vez e agora com demonstração de perversidade. Ela me contou acuada e chorando: “Eu não aguento mais isso”.

O menino destilando ódio contra-atacou: “Não quis me adotar, não era isso que mais queria na vida? Agora tem de me aguentar sim!”

Muitas vezes a Vida bloqueia alguma realização porque quer nos proteger, não me perguntem como isso acontece, qual o tipo de Inteligência que executa essa “sabotagem do bem” que não sei lhes responder. Alguns consignam essa “defesa” aos Anjos, outras a Deus, aos espíritos, ou ao Inconsciente dependendo da orientação e da formação de cada um. O fato é que ninguém sabe ou pode garantir nada.

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A solidão muitas vezes tão dolorosa, tão temida, às vezes é um escudo protetor contra algo bem pior. Tenho presenciado mulheres (a maioria) e homens que investem com obstinação contra sua solidão, driblando os obstáculos que parecem brotar como grama. Com tanta persistência, acabam conseguindo alguém que vai se mostrar seu algoz, vai tornar sua vida bem miserável.

Atendi a um político anos atrás e a conclusão dos instrumentos consultados foi a de que ele não deveria investir em cargos executivos. Ele me respondeu que nunca abriria mão disso, que esse era o objetivo maior e único de sua vida, ser o melhor governante que sua cidade já teve.

Não ouviu nada do que foi dito e foi em frente. Conseguiu finalmente seu objetivo e por alguns anos, até pensei que os instrumentos de prospecção estavam errados. Mas o tempo passou. Um dia leio nos jornais que um escândalo daqueles terríveis estava estourando envolvendo o tal político. Foi arrasador, ele perdeu o cargo, sua família foi comprometida e sua carreira política encerrada em meio a denúncias graves de corrupção. Imagino o que ele deve ter passado, na verdade nem consigo imaginar, mas pelo que me lembro de sua consulta, aconteceu o que foi previsto.

Também não escapei dessa embriaguez do Ego, já desprezei avisos para mudar de direção mas decidi ir em frente acreditando “no meu taco”. Quebrei a cara, e não foi apenas uma vez.

Alguns podem usar essa constatação para defender o “livre-arbítrio”: “Deus é bom, mas no fim somos nós que decidimos nossos rumos”. Outros usam essas constatações para defender a existência do Destino – tudo está traçado, e quando decidimos reescrever esse script tomamos na cabeça.

Agora a pergunta mais temida: Quando podemos saber se aquele bloqueio, aquela dificuldade sistêmica é uma proteção, e quando é algo natural que precisa ser superado pela resiliência para que possamos conquistar patamares superiores da existência?

É uma pergunta pertinente embora seja muito difícil de responder de forma honesta.

Acredito que quando o bloqueio é grande, sistemático, geral, devemos parar para examinar de forma mais serena e objetiva nossos motivos. Precisamos ter a inteligência e a humildade (atributos que necessariamente andam juntos) para aceitar que a Vida sabe mais que a gente, pode mais e tem sua dinâmica poderosa.

Muitas pessoas motivadas por mentes totalizadoras, egos magnificentes, acham que podem se alçar acima das Leis da Vida, que podem forjar seus próprios destinos a ferro e fogo. Não escutam a voz da Vida ou de Deus se preferirem e são guiados apenas pela sua própria voz interior que lhes diz “Vá em frente, atropela, passe por cima!”

No fim a Vida sempre tem o trator mais potente e é ela quem passa por cima, e mais – a Vida não tem pressa, ela sabe esperar, sabe deixar o caldo fermentar.

Na verdade somos nós que formamos os atoleiros em que vamos em seguida nos enfiar. Para observadores isentos, o desastre é um sinistro anunciado – só a gente não percebe, e não percebe porque um Ego exacerbado não enxerga um palmo adiante de seu nariz.

Nossa cegueira mental nos deixa deficientes quanto ao que está oculto e ao futuro, sem falar do passado que tem um enorme peso no desenho de nosso caminho, mas que em tese desconhecemos. Ainda assim insistimos saber o que é melhor para nós, brigamos contra o bom senso, zombamos dos conselhos da “vovó”, e quase sempre o resultado é a dor e o arrependimento. Depois, todo estropiado vamos nos desculpar dizendo: “Ah isso é assim mesmo, a gente tem de ter a própria experiência. Temos de pagar para aprender.”

Não é verdade. como dizia um grande mestre: “O homem comum só se move com o chicote no lombo. Já o homem superior basta a sombra do chicote”. (OSHO)

Toda vez que criamos ou estamos diante de padrões, de situações ou comportamentos que se repetem com resultados ruins, devemos entender que essa é a forma da Vida falar (ou gritar) conosco. Parar e dar um passo atrás é a maneira dos seres superiores de dizer: Entendi o recado!