por Dulce Magalhães
Há muitas e boas oportunidades na vida, porém a principal delas é a sempre presente oportunidade de escolher o que fazer e como fazê-lo. A questão é que a maioria das pessoas não acredita nisso porque tem a firme crença que a vida é inteiramente definida por fatores externos, contexto, situação, pessoas e a variável da sorte. Claro que todos esses fatores afetam e interferem em nossa vida, contudo não a definem, esta é uma prerrogativa que nos pertence.
A decisão de como vamos reagir, do que vamos aprender, de como vamos funcionar, do que precisamos mudar, tudo isto está sob nosso poder. Estamos no leme de nossa existência e nossa trajetória é regida e gerida por nós mesmos. E ainda podemos ir além, podemos nos tornar guardiões do farol, habitar a torre de orientação e servir de guia para que outros não se percam ou vivam percalços evitáveis. Podemos nos tornar educadores, líderes, mentores, pais e mães que se empenham em desenvolver seres humanos de alto quilate e intenso brilho. Contudo, é fundamental que possamos entender algumas premissas básicas, princípios que nos farão verdadeiros lighthouse keepers – guardiões de faróis.
Não pertence ao guardião do farol a tarefa de decidir o destino do outro, apenas apontar os possíveis caminhos e alertar dos perigos. Cada um tem o sagrado e inalienável direito de decidir por si mesmo, inclusive o direito de errar. É importante que nos demos conta disso para permitir que as pessoas ao nosso redor tenham a chance de aprender as lições que lhe cabem, seja na empresa, na família ou na comunidade. Errar não é algo indesejável, aliás é um resultado esperado na vida, em algum momento vamos errar, ninguém acerta 100%. Portanto, não há nenhum mal no erro, a questão é como lidamos com o erro e o que aprendemos a partir dele.
Quanto mais aprofundamos o entendimento das lições que a experiência nos permite, melhores guardiões do farol nos tornamos, pois desenvolvemos a noção exata do valor da experiência para a aprendizagem e podemos orientar sem querer controlar, sem angústia por desejar um determinado e único resultado e sem buscar julgar a partir de nossa própria visão. Maturidade não é algo que se transfere, é algo que se contrói. Ao entendermos esse princípio básico saberemos criar espaços para que o outro possa desenvolver sua maturidade experimentando a vida, errando e acertando, testando suas visões e corrigindo as perspectivas. Como orientadores nos cabe a tarefa única de sinalizar os perigos e iluminar os caminhos, respeitando a decisão alheia e honrando sua passagem como algo raro, especial e precioso. Como guardiões do farol nos cabe a perseverante tarefa de estar sempre lá, disponíveis vinte e quatro horas por dia e, mais especialmente, nas noites turbulentas e nebulosas da existência. É nesses momentos de crise que a luz do farol tem maior importância, onde sua razão de existir se consolida e mostra sua relevância.
Todos temos nossas passagens pela “noite escura da alma”, como denominava o místico cristão São João da Cruz. Esse tempo de dificuldades e conflitos internos, é um tempo de tormenta pelo paradoxo de viver ao mesmo tempo o medo e o desejo de mudança. Porém, são essas as experiências mais iluminadoras, tal qual os estertores da crisálida que fazem nascer borboletas de asas fortes. É preciso uma noite escura para engendrar um novo amanhecer. Contudo, nenhuma escuridão é tão vasta e impenetrável frente à luz do farol guia. Estar ao lado, saber percorrer o caminho sustentando o caminhante, sem querer caminhar no lugar dele. Deixá-lo seguir e apoiar. Essa é a tarefa de um guardião do farol, de um professor nas trilhas da vida.
Por vezes a posição mais difícil de se viver é a daquele que apoia, pois o respeito ao passo e ritmo do outro é o fundamento que sustenta e mantém a caminhada. Ser um guardião do farol é ser um observador ativo do progresso alheio e torcer a favor, orientar sem oprimir, iluminar sem cegar, indicar sem decidir. Posição para a qual recebemos pouco ou nenhum treinamento e da qual todos já estivemos necessitados em algum tempo da existência. O mais relevante nessa tarefa é não deixar aquele que precisa à deriva, poder iluminar as opções e permitir-lhe seguir em direção a si mesmo, buscando o norte da própria trajetória.
E apesar da posição de guardião do farol parecer passiva e tão efêmera na passagem do outro, ela é a garantia que o caminho está sinalizado e pode ser percorrido. Ser guardião é uma posição que exige humildade, senso de serviço e verdadeiro desejo de ajudar na travessia do outro. Contudo, quem se dispõe a exercer essa tarefa cedo ou tarde vai notar que é a posição que ocupa o ponto mais elevado e que essencialmente sua função é emanar luz. Existirá posição melhor?