por Roberto Goldkorn
Fui a uma empresa outro dia e vi que a porta do banheiro estava emperrada, não fechava a não ser na base da ignorância. Depois percebi que a cadeira da recepcionista estava quebrada no espaldar e com sinais de deterioração. Pensei: Essa empresa deve estar passando por algum tipo de dificuldade.
Mais tarde, entrevistando um dos diretores, ele me confessou que a empresa atravessava uma crise não só pela guerra entre os dois sócios, mas também por causa de uma queda brusca no faturamento. Uma coisa talvez sendo causada ou reforçada pela outra. Expliquei a ele o que havia observado e das minhas conclusões. Ele ficou impressionado e confessou que tinha tudo a ver.
Na maioria dos casos esses detalhes de descaso e desleixo são índices de problemas maiores que não aparecem à vista desarmada, como a febre alta pode ser sintoma de algum processo interno infeccioso ou inflamatório.
As "doenças" do ambiente são reflexos de problemas dos ocupantes ao mesmo tempo em que reforçam esses problemas criando um círculo vicioso que só tende a se agravar se não for interrompido. E vai além; muitas vezes esses detalhes disfuncionais são metáforas concretas das "doenças" da empresa ou dos habitantes.
Certa vez fui fazer um diagnóstico em uma empresa no interior de São Paulo. Os sócios eram marido e mulher e era ela quem me guiava na inspeção pelos cantos do imóvel. Em um depósito avistei um rato morto, estava seco, ou seja, já estava ali por algum tempo. Disse a ela que aquele cômodo era um reflexo do corpo doente da empresa inclusive com animais mortos. Ela, que não tinha visto o bicho morto, negou que isso fosse possível, até que a levei a ver o rato. Perguntei a ela, que ainda estava perplexa diante do que estava vendo, o que estava morto e não enterrado ali? Imediatamente ela respondeu: Meu casamento!
Outra empresa de grande porte "guardava" algumas peças de mobília quebradas amontoadas num canto escuro em frente a sala onde ficava o departamento de marketing. Perguntei quem deveria cuidar daquilo ou a razão daquele lixão numa área nobre da empresa. Ninguém soube responder. Mais tarde comentado o ocorrido com o dono da empresa ele desabafou: "Sempre desconfiei que havia uma "caveira de burro" naquela sala do marketing, porque não se passa um mês sem que alguém ali fique doente ou sofra algum tipo de acidente e tenha de se afastar do trabalho. Nunca entro em campo com o time completo!"
Por isso tenho aconselhado às empresas que visito a destacar alguém para observar aquilo que ninguém mais vê, simplesmente porque não está na sua lista das "coisas que devem ser vistas."
Os ambientes que ocupamos são coisas "vivas" e vivem justamente porque nós os animamos, nós os impregnamos com o resultado de nossas ações e energia. Assim como o corpo precisa de cuidados e correções de rumo, os ambientes sejam eles domésticos ou profissionais, precisam ser cuidados. Uma empresa que ocupa um determinado imóvel vai projetar nesse imóvel mesmo num curto espaço de tempo sua "impressão", sua alma. Se houver algo de errado (leia-se nas pessoas que compõem a empresa ou em sua formulação) isso fatalmente se plasmará no ambiente físico, nos permitindo não apenas curar o sintoma e assim aliviar sua origem, mas também analisar o seu significado – o que aquele sintoma quer dizer.
Recentemente fui a um bonito restaurante e vi que a porta do banheiro masculino fechava com dificuldade e na hora de abrir quase me deixou trancado. Depois minha mulher relatou que no banheiro feminino acontecia a mesma coisa. Por uma daquelas "coincidências" o dono do restaurante veio desabafar comigo dizendo que a situação estava muito difícil que seu crédito havia sido cancelado no banco e não tinha como conseguir dinheiro para capital de giro. Os seja, portas se fecharam para ele.
Mas ele estava tão focado nos grandes problemas, que a reles porta do banheiro que não fechava direito, estava fora de seu raio de visão.
Às vezes quando aponto para esses detalhes significativos os contratantes me dizem: "Isso não é nada. Tem coisa muito pior acontecendo! " Eles não conseguem fazer esse link entre causa e efeito e vice-versa.
Conflitos pessoais entre pessoas ou grupos na empresa podem causar frequentes e recorrentes problemas no sistema elétrico – lâmpadas queimam, aparelhos eletroeletrônicos pifam, como se a parte elétrica estivesse respondendo a tensão nervosa no ar.
Muitas vezes podemos ver sinais de "doença mental" no que denominei de empresa esquizofrênica, quando existe uma discrepância radical entre a missão e a administração da empresa. Vou dar um exemplo: Uma empresa de engenharia comandada por um budista, se envolveu com pagamento de propinas e uma outra série de falcatruas, como sonegação de impostos e corrupção ativa e passiva. Ora o dono, que até mantinha um altar budista em sua sala e meditava, estava na contramão de seus valores espirituais e morais ao se embrenhar em práticas venais e imorais. Os sintomas apareciam em forma de roubos constantes, sabotagem interna, computadores e sistemas em constante pane, rachaduras nas paredes, problemas no encanamento. Uma empresa de engenharia com problemas internos de engenharia?
Um Gerente de Detalhes poderia ver o que ninguém mais vê ou se vê não dá a devida importância. Um Gerente de Detalhes, por exemplo, teria visto o que vi numa empresa do ramo de alimentação que visitei. Eles contrataram uma consultoria que lhes convenceu (ou apenas ratificou o que o chefe queria ouvir), que em três anos ela poderia triplicar o seu faturamento. Observando o imóvel vi sinais claros de deterioração. Poltronas rasgadas, paredes do refeitório descascadas, reclamações ao pé do (meu) ouvido de funcionários dizendo que a empresa não cumpria a sua parte em seus pactos trabalhistas. Logo percebi que aquilo ali não iria muito longe, muito menos triplicaria seu faturamento em três anos. Mas o presidente e alguns diretores com quem falei não quiseram me ouvir- estavam tão embriagados pelo delírio megalomaníaco que desprezaram minhas observações e recomendações. A empresa fechou em menos de um ano, colocando na rua mais de dois mil funcionários.
Quando Freud nos ensinou que o Inconsciente "fala" numa linguagem cifrada, seja nos sonhos, ou através de lapsos de linguagem, esquecimentos, tropeços… abriu as portas para que estendêssemos esse conceito.
Assim os ambientes que ocupamos para morar ou para cumprir alguma missão profissional também, como o boneco do ventríloquo, falam, expressando em sua linguagem própria o que acontece na mente corporativa formada pelos que ali se abrigam.
Precisamos de alguém que ouça, leia e decifre essa linguagem para que aumentemos nossas chances de vencer a corrida do sucesso.