A calcinha da Demi Moore vale um milhão?
por Alexandre Pill – psicólogo componente do NPPI Ashton Kutcher X CNN – “A começar pelo palco da disputa, a própria internet, que como uma trepadeira penetra em nossas vidas, emaranhando-se no cotidiano de forma virtualmente irreversível. Ou o próprio twitter, cujos detratores têm como um dos símbolos máximos da irrelevância das novas maneiras de nos relacionarmos uns com os outros”
O twitter, para quem não sabe, é uma das mais recentes redes sociais a despontar no ciberespaço. Tendo como base os SMS de celular, os scraps do orkut e aquelas manchetes editáveis que acompanham os apelidos do MSN, o twitter divulga “o que você está fazendo agora” a quem quiser saber.
Para tanto, você posta mensagens curtas (de até 140 caracteres), que são enviadas aos seus “seguidores” (pessoas que assinaram o serviço para receber atualizações suas) e você recebe as atualizações de pessoas e serviços que você escolheu acompanhar.
Se nasceu com o intuito de divulgar polaroids em forma de texto do seu dia-a-dia aos seus amigos, quebrando (ou revelando) a monotonia da rotina hipermoderna, o twitter se popularizou em três frentes que extrapolam a concepção original.
Durante crises ou emergências, o serviço tem sido usado para divulgar flashes em tempo real dos acontecimentos, uma vez que se pode postar através de qualquer celular através de SMS.
Os canais tradicionais de notícias vêm se adaptando constantemente às inovações e com o twitter não tem sido diferente: CNN, The New York Times e BBC estão entre os serviços mais acompanhados dessa rede social, enviando manchetes das principais notícias do dia.
E por fim, a “invasão” consentida de privacidade proporcionada pelo twitter encontrou no culto às celebridades o casamento perfeito: milhares de pessoas acompanham diariamente as microdivagações de Britney Spears, Shaquille O’Neal e Ashton Kutcher.
E desses desdobramentos nasceu uma aposta singela, no mínimo: o ator Ashton Kutcher desafiou a CNN para uma corrida de popularidade, em que o vencedor seria aquele que chegasse primeiro a um milhão de “seguidores” no twitter.
É a mais nova versão do mito de Davi e Golias, só que o gigante foi substituído por um octopus das comunicações com mil tentáculos e Davi, imortalizado por Michelangelo, é agora alçado ao status de jovem estrela de cinema e da TV.
Se Golias tem o aparato de um conglomerado bilionário trabalhando a seu favor, Davi tem um séquito de jovens fãs que acompanham cada passo seu. Se a CNN contou com âncoras como Larry David e Anderson Cooper fazendo campanha em seus programas, Kutcher se valeu de outdoors, live feeds na internet e chegou até a postar uma foto que tirou escondido de sua mulher, Demi Moore, de calcinha.
Muitos analistas previam uma fácil vitória para a CNN, mas a disputa foi bastante acirrada e, como na história bíblica, Kutcher saiu vitorioso. Por mais irreverente que a história toda tenha sido, ela suscita uma série de questões.
A começar pelo palco da disputa, a própria internet, que como uma trepadeira penetra em nossas vidas, emaranhando-se no cotidiano de forma virtualmente irreversível. Ou o próprio twitter, cujos detratores têm como um dos símbolos máximos da irrelevância das novas maneiras de nos relacionarmos uns com os outros.
Mas o que me chama a atenção é a própria simbologia bíblica do embate. Não é meu intuito simplificar ou reduzir a questão, mas parece-me que boa parte da vitória de Kutcher se deu por propiciar, a cada novo “seguidor” de seu twitter, a sensação de ser o próprio Davi a lançar uma pedra de sua *funda no gigante Golias/CNN, símbolo máximo do establishment.
Algo que já assistimos no embate Linux vs. Windows, Firefox vs. Internet Explorer ou até na campanha informal, difundida pela rádio peão (a mais antiga rede de comunicação da humanidade) de alçar o Brasil ao primeiro posto em número de usuários do orkut. O ciberspaço tem se tornado, cada vez mais, o espaço em que o indivíduo sente que pode fazer a diferença, ainda mais quando levamos em conta o contexto mundial que atravessamos no momento.
Logado no @mteolimpo, Hermes assiste a tudo isso, descalça suas sandálias e sorri.
*arma de arremesso constituída por uma correia, ou corda dobrada, em cujo centro é colocado o objeto que se deseja lançar; atiradeira, catapulta, estilingue, fundíbulo. Fonte: Dicionário Houaiss