por Ceres Araujo
Etimologicamente, amizade é uma palavra derivada de amicus, que possivelmente se derivou de amore. É uma forma de relacionamento tipicamente humana, caracterizada por fidelidade, confiança e amor. Ao amigo de verdade, tudo se perdoa.
A maioria de nós se lembra do primeiro melhor amigo e da importância que ele teve nas nossas vidas. Não é sem sentido que, em inglês, best friend é padrinho de casamento.
As primeiras relações que a criança estabelece são relações chamadas endogâmicas, isto é, relações dentro da família, relações com parentes. Assim, as interações: filho-pais, irmão-irmãos, neto-avós , sobrinho-tios, primo-primos são as relações interpessoais iniciais na vida. Importantes aprendizados são derivados delas.
No primeiro ano de vida, em geral, o bebê é o centro de interesses da casa e o receptor das atenções dos familiares. A partir do segundo ano, a criança começa a perceber que a outra pessoa, com quem ela se relaciona, é um ser dotado de pensamentos, necessidades e desejos. Ela ganha como consequência a possibilidade de intuir o que se passa com o outro, a possibilidade de sentir o que o outro sente, isto é, desenvolve a capacidade para empatia.
Progressivamente a criança aprende, com a ajuda de quem toma conta dela, a fazer trocas afetivas. Tudo isso é experimentado e vivido no ambiente familiar.
Ao entrar na pré-escola, a criança começa a conviver com os coleguinhas. Mas, não tem ainda a possibilidade de brincar com eles de forma cooperativa, pois não admite dividir seus brinquedos. Ao contrário, para defender suas propriedades, se serve de vários recursos, como por exemplo, tapas, empurrões, mordidas e puxões de cabelo. Porém, logo depois, começa a apreciar o brincar junto e a se divertir com a companhia dos colegas. Chega o momento, no qual o colega se transforma, de fato, no amigo, aquele que é o preferido para brincar, para convidar para ir em casa e para ir na casa dele.
Dessa forma acontecem as fases precursoras do aparecimento da categoria “o melhor amigo”. O melhor amigo ou a melhor amiga é uma escolha por uma identidade de sexo. Raramente o primeiro melhor amigo tem sexo diferente. É uma relação homoafetiva que tende a perdurar, às vezes, por muitos anos, principalmente se as crianças compartilham o mesmo ambiente escolar.
O melhor amigo é o “irmão escolhido”. Com a vantagem de não se compartilhar os mesmos pais, pois, com os irmãos reais se compartilha os pais e se tem ciúmes. O melhor amigo é uma ponte para um mundo de relações exogâmicas, isto é, para relações fora da família a que se pertence.
Acompanhada pelo melhor amigo, a criança se sente segura para se propor a novas experiências. Esse amigo é o companheiro de aventura, que dá força e segurança para ousar, testar novos limites, mas com quem também pode se dividir culpas.
O melhor amigo é uma conquista absolutamente individual da criança. Pais não devem se tornar muito amigos dos pais do melhor amigo do filho, o que com frequência, infelizmente, tende a acontecer. Isso, quando ocorre, traz a perda da relação exogâmica, isto é a relação com alguém de fora, alguém independente de outros relacionamentos da família, tão fundamental para o desenvolvimento da capacidade de autonomia da criança.
É evidente que os pais precisam conhecer bem as famílias com as quais seus filhos se relacionam, mas devem respeitar o fato de que o melhor amigo e mesmo o laço com os pais dele, foi uma conquista de seu filho e que deve continuar assim.
O melhor amigo caracteriza um grau de amizade, onde conhecimento, mútua confiança, lealdade e altruísmo são necessários. Desavenças e rompimentos, entretanto, tendem a acontecer e acarretam muita dor em todas as idades. A sensação de traição é muito forte. As crianças, entretanto, usualmente utilizam uma defesa muito saudável frente a tal situação: elas têm o primeiro melhor amigo, o segundo melhor amigo, o terceiro melhor amigo… e isso é publicamente verbalizado.