por Patricia Gebrim
De onde foi que tiramos essa ideia de que precisamos chegar a um consenso em tudo? Me peguei pensando, após uma semana na qual, aqui e ali, presenciei várias discussões absolutamente desnecessárias entre as pessoas.
Foi como se um filme estivesse sendo exibido bem diante de meus olhos, repetidas vezes, quase como se alguém sussurrasse:
– Veja isso! Escreva sobre isso!
É incrível a enorme quantidade de energia que as pessoas desperdiçam em discussões absolutamente supérfluas onde o que parece estar em jogo é provar ao outro que “eu sei mais”, “eu sou melhor”, “eu entendo das coisas”. É uma batalha a favor do ego, com o único intuito de provar que uma pessoa é melhor do que a outra, ou ainda, de provar que o outro é pior ou inferior.
É claro que os conflitos são necessários, eu mesma já escrevi sobre isso, aqui mesmo no Vya Estelar. Em certas situações, visando o bem do todo, é preciso que lutemos pelo que acreditamos, para defender algo precioso, para seguir na direção mais saudável para a maioria. É saudável que uma mãe enfrente seus filhos que só querem comer batatinhas fritas, esse é um tipo de conflito guiado pelo amor. O mesmo eu diria de um pai que impede que seu filho saia dirigindo se esse ingeriu bebidas alcoólicas. Ou de um funcionário que enfrenta um colega de trabalho para evitar que uma injustiça seja feita. Isso não tem nada a ver com provar a si mesmo, com enaltecer o ego, ganhar status ou melhorar a autoestima à custa de diminuir o outro.
Mas se vocês prestarem atenção, perceberão que não é disso que se trata a maioria dos conflitos. No íntimo de nossos lares, desde muito cedo, as crianças brigam para decidir quem sentará na poltrona maior, os pais brigam enquanto dirigem seus carros porque cada um acha que o seu caminho é o melhor, amigos discutem porque acham injusto o juiz de futebol ter dado aquela falta naquele momento do jogo.
– Arf… Quanta energia jogada fora!
– Será que essas coisas são assim tão importantes a ponto de justificar a destruição da harmonia de um momento, ou de um relacionamento? Para quê? Para provar que "EU" estou certo e você errado?
O pior é que isso não acontece apenas no contexto dos nossos lares. Socialmente criamos conflitos e até mesmo guerras porque queremos que todos aceitem nosso Deus, obedeçam nossas ordens, concordem com nossas ideias, como se existisse algo como a “verdade única”.
O grande equívoco está na falta de percepção de que cada pessoa enxerga o mundo de acordo com as lentes de sua história de vida, assim sendo, o mundo enquanto realidade objetiva é a ilusão que alimenta a maioria dos atos de desrespeito e agressão.
Se pudéssemos compreender que é possível discordarmos em harmonia, se compreendêssemos a sabedoria que existe em permitir a diferença, sem classificá-la como uma ameaça, a paz nos abraçaria na maior parte dos momentos de nossa vida. A diferença torna nosso mundo maior, mais amplo, mais rico. Por que temos que concordar em tudo? Isso nos torna muito menos do que podemos ser. Por que não podemos aceitar que o outro pense diferente de nós? Por que não podemos concordar em fazer um caminho diferente? Em comer algo diferente? Em visitar um lugar diferente? Por que não podemos aprender também a ceder?
– De vez em quando eu faço do seu jeito, de vez em quando você faz do meu, e celebramos juntos o nosso vínculo de respeito e crescimento mútuo – me parece tão mais simples e respeitoso agir assim.
O grande desafio, a meu ver, é aprendermos a identificar as “batalhas do bem”, as batalhas lícitas, pelo bem maior, as batalhas que valem a pena ser travadas. E aí sim, vale lutarmos com todas as forças, sabendo que o bem maior virá junto com a nossa vitória, e que a nossa vitória será a vitória de todos.
Precisamos nos abster de entrar em batalhas absurdas cuja única intenção é tornar nosso ego um pouco mais brilhante. Não temos que, como Dom Quixote, lutar contra qualquer moinho de vento. É preciso que reservemos nossas forças para lutar contra os dragões reais da separatividade que nos dizem que uma pessoa possa ser feliz à custa da dor ou prejuízo alheio. A alma, sábia que é, nunca entraria em uma batalha desse tipo. As batalhas da alma são aquelas em que não há perdedores e vencedores. Nas batalhas da alma todos ganham.
Pense nisso na próxima vez em que for lutar por algo e pergunte-se:
– Quem em mim quer lutar? A alma ou o ego? – e escolha, conscientemente, para quem você irá entregar suas armas.