Da Redação
O estudo também aponta que a gravidade das agressões é maior quando há ingestão da droga. O uso de armas e o abuso sexual (tanto ameaça quanto consumação), ocorreram, respectivamente, numa proporção dez e quatro vezes maior, quando comparados aos domicílios nos quais o agressor não estava sob efeito do álcool.
A crença de que o álcool é responsável pelas agressões diminui a culpa do agressor e aumenta a tolerância da vítima.
A droga lícita mais utilizada no Brasil – com estimativa de 74,6% de uso na vida e 12,3% de dependência, de acordo com dados do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid) da Unifesp – não somente está associada à violência como também parece favorecer o seu prolongamento.
Apresentado como dissertação de mestrado pelo psicólogo Arilton Martins Fonseca, o levantamento comparou a recorrência das agressões e verificou que, nos domicílios com agressores embriagados, a violência ocorre três vezes mais em períodos de um a cinco anos; seis vezes mais, entre 6 e 10 anos e, quatro vezes mais, quando as situações ultrapassam uma década.
De acordo com Fonseca, a crença de que o álcool é responsável pelas agressões diminui a culpa do agressor e aumenta a tolerância da vítima, podendo favorecer novos episódios. "Além disso, o padrão crônico de beber pode ser importante fator na reincidência das agressões e agravado quando a dependência já está instalada", afirma.
Independentemente de sinais de embriaguez, os agressores são, em sua maioria, homens. Entretanto, quando o álcool está presente nessas situações, o sexo masculino é responsável por quase 90% dos casos de violência, contra 53% quando o homem está sóbrio. Entre as vítimas mais atingidas estão as esposas (35,7% quando há embriaguez e 17,9% nos episódios com sobriedade).
Medo, vergonha e despreparo
Procurar ajuda ainda é um obstáculo a ser superado, tanto por quem apanha quanto por quem agride. Oitenta e seis por cento das vítimas de agressores alcoolizados e 89% dos agressores sóbrios nunca procuraram ajuda. Entre os agressores alcoolizados, apenas 11,4% procuraram apoio especializado para diminuir ou parar o uso da droga.
Segundo o psicólogo, fatores como medo, vergonha da família e perante a sociedade fazem com que muitas mulheres deixem de denunciar seus agressores e de procurar ajuda em serviços de saúde básica.
Apesar de ainda muito pequena, a procura por ajuda é cinco e sete vezes maior, respectivamente, nos serviços de segurança e nos serviços de saúde quando as vítimas são de agressões pelo álcool. "A busca, em maior número, pelos serviços de saúde pode estar associada à maior severidade da violência que ocorre quando o agressor está embriagado", afirma o pesquisador.
Fonseca explica que, embora a violência doméstica venha ganhando cada vez mais espaço em estudos, ainda são poucos os serviços organizados para atender a esses casos. "Os profissionais de saúde não contam com instrumentos de reconhecimento e registro dos casos atendidos nesses serviços, além de não estarem preparados para orientar essas vítimas sobre seus direitos e encaminhá-las aos demais serviços de apoio existentes", afirma.
Para ele, esses profissionais ainda têm dificuldades em reconhecer a violência doméstica como problema de saúde pública. "O uso de álcool e a violência doméstica são fenômenos complexos e, para que haja uma compreensão da questão álcool e violência é preciso que esses profissionais somem esforços para se estabelecer redes inter e multidisciplinares", explica.
Dados mais detalhados da pesquisa
Características sociodemográficas:
58,4% dos entrevistados eram mulheres;
44,6% eram casados;
51,3% tinham mais de 35 anos;
28,3% eram analfabetos ou tinham o ensino fundamental incompleto;
42,2% pertenciam à classe baixa. Entre os agressores alcoolizados, esse índice subiu para 49,8%, contra 17,2% dos agressores alcoolizados de classe alta e, 33%, de classe média.
Histórico de violência:
34,9% relataram algum episódio violento, em, 17,4% houve a presença de álcool associada;
61,4% dos agressores alcoolizados tinham entre 31 e 59 anos. Apenas 11,4% deles procuraram ajuda para diminuir ou parar o uso da droga;
35,7% das vítimas de agressores alcoolizados são esposas. Esse índice cresce duas vezes quando comparado a agressores não alcoolizados;
86,4% das vítimas de agressão por álcool não buscaram ajuda em serviços especializados;
A recorrência de violência é seis vezes maior quando o álcool está envolvido num período entre seis e dez anos e, quatro vezes, quando ultrapassa uma década.
A proporção de agressão física quando há presença de álcool foi duas vezes maior; o uso de armas, 10 vezes, e, o abuso sexual, quatro vezes.