por Renato Miranda 

Quando a pessoa flui em uma atividade isso quer dizer, entre outras características, que a mesma tem o controle absoluto das ações, há uma fusão entre a ação e atenção como se fosse parte de um mesmo fenômeno e, portanto, há concentração intensa naquilo que se está a fazer e, além disso, há satisfação na realização da tarefa.

Tais características, detectadas por várias experiências pelo precursor da teoria do fluir (flow-feeling) Mihaly Csikszentmihalyi, são notadamente verificadas pelo comportamento autotélico da pessoa e sua alegria em realizar algo que para ela mesma é gratificante.

No esporte esse fenômeno é observado com certa facilidade ao percebermos as atitudes de atletas em treinamentos e competições. Atitudes tais expressadas quando de um comportamento altamente significativo no esporte e em qualquer outra atividade: envolvimento!

A experiência autotélica é aquela em que o fim (objetivo) da experiência (tarefa) está em si mesmo. Ou seja, realizar a tarefa é a própria recompensa. No caso do esporte, mesmo reconhecendo que os objetivos externos: vencer, ser reconhecido, prêmios e outros, sejam relevantes e obviamente os mesmos não são descartados, o atleta envolvido na atividade vivencia o fluir e inconscientemente (intrinsecamente!) percebe alegria em estar controlando as ações e vivenciando as emoções daquela atividade; seja no treino ou em competições.

Portanto, um "atleta autotélico" embora considere sua evolução de desempenho como meta, antes disso, se envolve completamente nas atividades que o conduzirão o patamar desejado de rendimento. A distinção da experiência autotélica (fluir) reside na liberação de energia psíquica (atenção) na atividade específica e não nas conseqüências.

Nesse quesito (atenção), é que o fenômeno da concentração intensa é manifestado em direção àquilo que tem que ser feito e não naquilo que ainda está por vir (resultados!). O atleta então, vivencia o presente com o máximo de seu potencial psicofísico (energia mental, emocional e física são equacionadas) sem preocupações e tensões exacerbadas com o futuro.

Para o atleta desejar ser campeão, é importante impulsioná-lo nos treinamentos, mas aquilo que o mantém treinando, é a satisfação de atuar, assim sendo, alegremente ele estará envolvido em uma atividade autotélica.

É necessário, no entanto que treinamentos de qualidade estimulem atletas a perceberem o mais rápido possível o quanto os mesmos podem vir a ser gratificantes e uma experiência de recompensa e alegria. A partir do momento em que é possível o atleta verificar uma interação que dá retorno em termos de aptidões psicofísicas, os treinamentos passam a ser intrinsecamente gratificantes.

A alegria espontânea é uma forte característica do atleta que flui (autotélico). Tudo aquilo que é externo é uma consequência natural e, portanto, não precisa ocupar a sua mente. Experiências que fazem parte da competição, por exemplo: estresse, ansiedade, emoções variadas etc são absorvidos de forma equilibrada e consciente em relação às pretensões do atleta.

Ou seja, o atleta aprende a reconhecer o esporte como algo que não o reprime em função de expectativas por resultados, ao contrário, o liberta das pressões das expectativas, pois saberá que seus esforços (dedicação, trabalho, garra) em alta qualidade e com alegria ao vivenciar as atividades serão aquilo que providenciará sua satisfação.

A busca do sucesso deve seguir o caminho naquilo que o atleta pode controlar (treinamento, comportamento, envolvimento, outros), mas que fatores não controláveis (contingências) ou não palpáveis (intangíveis) também fazem parte desse cenário, como: alguns tipos de lesões, influência externa (arbitragem, por exemplo), "um lance de sorte do adversário" e outros.

O atleta que flui aprende também que o esporte existe para fazer bem às pessoas, para tornar suas vidas mais alegres. Em consequência, o atleta é aquele que, por seus atributos psicofísicos e sua dedicação, oportuniza momentos de felicidade a todos aqueles que apreciam o esporte.

Dedicação, envolvimento e treinamento de qualidade permitem o aprimoramento da qualidade de ações, promovem a fluidez e possibilitam o melhor tipo de sucesso no esporte: a alegria do prazer em praticá-lo!