por Fernanda Escaleira – psicóloga do NPPI
Os denominados Transtornos Alimentares já se constituem como uma verdadeira "epidemia" no mundo moderno, principalmente entre adolescentes e adultos jovens. Em paralelo, a procura desesperada pelo corpo dos sonhos encontrou um lugar privilegiado para a sua propagação e apoio na Internet.
A freqüência aos já conhecidos sites Pró-Mia (Bulimia) e Pró-Ana (Anorexia) cresce a cada dia, bem como o surgimento de novos casos desses transtornos em todo o mundo. "Ana" e "Mia" são apelidos supostamente carinhosos que as meninas dão para suas “aliadas”. Em um desses sites existem duas cartas, contendo o tipo de apresentação da bulimia e da anorexia, evidentemente na versão das suas “simpatizantes”:
“Olá, meu nome, é Bulimia, mas para nos tornarmos mais íntimas, pode me chamar de Mia. Eu serei sua amiga de emergência, aquela que nas horas que o cinto apertar, você poderá contar comigo”.
“Querida leitora, permita me apresentar, meu nome, ou como sou chamada, pelos também chamados 'doutores' é Anorexia, mas você pode me chamar de Ana. No decorrer do tempo, eu vou investir muito tempo em você, e eu espero o mesmo de você. Pois agora, eu realmente estou dentro de você. Eu sou sua cabeça, seu coração e sua alma”.
Depoimentos pessoais, frequentemente ilustrados por fotos chocantes para os internautas menos avisados, constituem a maior parte do conteúdo desses sites que têm como objetivo principal encorajar e dar força cada vez maior para o “cultivo” dessas patologias.
Preservando suas identidades – através de nomes falsos ou nicknames – essas meninas relatam em seus depoimentos as estratégias e recursos de que se utilizam para emagrecer, além de trocarem “receitas” visando perder peso constantemente. Umas incentivam às outras a continuarem nessa jornada rumo ao peso zero, custe o que custar. Em um dos sites pesquisados existe um verdadeiro manual contendo instruções sobre como adquirir a doença. Dentro dele existem dicas do tipo:
“Observe as outras pessoas, especialmente os gordos quando estiverem comendo, e sinta-se superior por não estar comendo nada e ter seu corpo limpo, a obesidade é horrível e os gordos são inúteis lembre-se disso”.
O fácil acesso a esse tipo de informação, via Internet, pode estar propiciando aos jovens condições que levem ao agravamento dessas citadas formas distorcidas de manipulação dos seus corpos. Cabe colocar aqui mais um dado, que apenas acentua a gravidade desse quadro: até pouco tempo, tais distúrbios eram tidos como tipicamente femininos. Porém, em tempos mais recentes os profissionais que atuam na área vêm relatando o surgimento de casos de anorexia também entre rapazes. Quando acessados por jovens predispostos a tais patologias estas páginas podem ainda não apenas reforçar suas dificuldades, como dificultar a busca de ajuda, ou a adesão aos recursos de tratamento oferecidos. Em outro site encontramos o seguinte aviso:
“Este é um site pró-Anorexia. O conteúdo deste site é totalmente voltado ao apoio e incentivo da Anorexia. Se você é pró-Anorexia, seja bem-vindo ao nosso paraíso! Aqui você vai encontrar apoio e todo o incentivo que você precisa ter para ser perfeita e feliz!”.
Como bem sabemos, a Internet é um espaço que viabiliza e facilita a divulgação de todos os tipos de manifestações, incluindo-se aqui aquelas claramente ilegais ou ilícitas (incitação ao racismo, à pornografia, pedofilia, hackerismo, etc.). Porém, parece-nos que sites do tipo aqui abordados não se enquadram necessariamente nessas categorias, por mais perniciosos ou bizarros que possam ser seus conteúdos. E vem daí uma dificuldade adicional quanto ao seu controle ou eventual tentativa e erradicação.
Porém, tais sites são verdadeiras armas nas mãos dessas meninas, pois acabam funcionando como uma roleta russa. A psiquiatria já nos colocou um forte alerta: A anorexia é talvez o único transtorno psiquiátrico que implica em real risco direto de morte ao paciente afetado. Nesse sentido, nenhum outro distúrbio mental pode ser considerado tão grave!
“Há uns 10 minutos atrás recebi a péssima notícia de que a Aninha morreu ontem, com uma parada cardíaca por causa da mia… a sua melhor amiga a traiu e depois levou ela embora…”.
Nossa intenção neste artigo não é assustar aos pais, mas, sim, enfatizar a importância daquela tese que temos defendido em vários outros momentos, qual seja: a importância de que a família participe da vida virtual de seus filhos. De que forma pode se dar essa participação ? Procurado saber que tipo de sites eles acessam, com quem conversam, e, principalmente, procurando observar que tipo de repercussão o acesso à internet vem trazendo para a vida presencial dos nossos jovens!
Enfim, frente a mais este risco dos tempos atuais, nossa sugestão às famílias não é diferente daquela que faríamos sobre as demais questões referentes ao processo de educação: Estar realmente atento aos seus filhos em mais esta área de nossas vidas, a vida virtual.