por Regina Wielenska
Este artigo poderia ser escrito por um advogado, mas na condição de psicóloga quero discutir a importância do planejamento e relembrar porque poucos tomam medidas preventivas na vida. Escolhi um tema bem específico: sociedades, casamentos e congêneres.
Minha avó costumava dizer que num casamento se a miséria entra pela porta, o amor sai pela janela. De fato, dificuldades materiais testam a tolerância e o amor de um casal num piscar de olhos.
Uma cliente, cujo casamento estava em seus estertores, me disse: “Preciso tomar providências porque na hora da separação ele pode querer de volta até o ouro de alguma obturação”. Frase de efeito, mas que representou bem o que ele tentou fazer depois, não estivesse a moça muito bem protegida pela lei.
Desde 1963, há na minha família um caso na Justiça que ainda está por se encerrar para reconhecimento de paternidade (causa ganha) e refacção de partilha (causa ganha, mas em execução). A parte diretamente interessada faleceu no começo da década de oitenta, e a causa continuou a rolar pelos tribunais, à espera do falecimento de uma das partes devedoras, para que seus bens possam ser passados a quem de direito (no caso, receberão sua parte do latifúndio talvez os dois filhos idosos e um neto da mulher que se rebelou contra sua condição de bastarda e peitou os meio-irmãos na Justiça).
Conversei com um amigo neozelandês sobre o recente abalo sísmico, o segundo em um ano, ocorrido em Christchurch. Inconformado, ele dizia que conhecia pessoas que poderiam ter sólidas apólices de seguro, mas que agora tiveram que refazer suas habitações por duas vezes e estavam em apuros.
Esses exemplos, e tantos outros, possuem em comum o fato de uma ou mais pessoas se omitirem de fazer o que se recomenda no momento certo, de forma a minimizar eventuais problemas futuros. Reconhecer um filho, fazer seguro, ter um contrato pré-nupcial bem costurado, pequenas medidas que teriam poupado dissabores pra muita gente.
Ninguém se casa na certeza de um divórcio litigioso, ou compra imóvel na certeza de perdê-lo para um acidente natural. Pelo contrário, tendemos a subestimar a probabilidade dos eventos desagradáveis e hiperestimar a dos eventos pelos quais ansiamos. Além de distorcer probabilidades, há que se reconhecer o esforço de encontrar soluções preventivas. Procurar advogado para orientar na execução de um testamento ou planejar a sucessão dos administradores de uma empresa familiar, gastar um dinheirão com apólices de seguro (talvez eu fique duro e não possa viajar, por exemplo) ou conversar com o “namorido” sobre dinheiro e bens são exemplos de comportamentos que entram em competição com outros que podemos apresentar quando em contato com o aqui e agora dos prazeres mundanos.
Sob influência de ódio e da mágoa ou depois do trágico acontecimento, só nos restará sofrer por um tempo, que pode ser longo demais. A escolha é planejar melhor. Perder um pouquinho hoje pode evitar a maior das perdas amanhã.
Recomendo duas leituras que bem ilustram o tema:
– Autoengano, de Eduardo Gianetti, Ed. Companhia das Letras
– Falo ou não falo? , organizado por Fátima Cristina de Souza Conte e Maria Zilah da Silva Brandão, Ed. Mecenas.
Boas reflexões a todos!