por Renato Miranda
Já afirmamos (veja aqui) que quando o atleta é capaz de ficar totalmente absorto em suas ações de tal forma parecer haver uma fusão entre a ação e atenção, há uma motivação intrínseca (inconsciente) para realização das tarefas, percepção de equilíbrio entre a dificuldade da tarefa com as habilidades do atleta, tudo isso são características de que o mesmo está fluindo.
Há outras características, como por exemplo, um sentimento de perda da noção do tempo: o atleta não registra a passagem do tempo como convencionalmente é feita pelos ponteiros do relógio. Ou seja, pode-se perceber que ao praticar uma hora de esporte essa atividade significou apenas alguns minutos. Esse estado é que o estudioso Mihaly Csikszentmihalyi denominou de flow-feeling (percepção ou sentimento de fluir em uma tradução livre).
Ao saber da possibilidade de fluir e aproveitar de todos os benefícios acima, atletas podem perguntar, mas como usufruir do controle do fluir?
A melhor resposta para essa pergunta é: procurar a incerteza do desafio! Ou seja, quando o atleta sai da posição segura do êxito garantido para o ambiente incerto de um grande desafio, surge a dúvida do resultado e com isso se proporciona o exercício do controle.
De outra maneira, quando o atleta se arrisca em alcançar resultados superiores e deixa o conforto de lado, ele terá a consciência que para obter progresso terá que treinar ainda mais tudo aquilo que envolve o sistema de treinamento: preparo físico, técnico, tático e psicológico, pois só assim poderá ter chances de obter êxito.
Isto quer dizer que o atleta que se ocupa sempre em se manter entre os melhores, necessita fundamentalmente treinar e competir como se fosse a primeira vez. É como se o atleta precisasse a todo instante ter de provar o quanto é capaz de fazer melhor ou como se dependesse (de fato!) de cada treino para continuar em sua profissão. Esse pensar parece demasiado, mas é exatamente isso que o atleta que pretende estar muitas vezes no topo precisa encarar.
Em muitos casos, atletas que tentam agir dessa maneira acabam por ficarem muitos anos com ótimos desempenhos e quando há uma queda de rendimento, ela não é tão acentuada e logo o atleta recupera seu nível de atuação. Mesmo em equipes de esporte coletivos (principalmente em seleções nacionais) a dinâmica da busca do fluir é possível.
Mas então, surge outra pergunta: É possível controlar o estado do fluir (fluxo!) para utilizarmos como quisermos?
Resposta objetiva: Não!
Não é possível provocar fluência à vontade. Parece desanimador. Ora, se o atleta faz tudo àquilo que foi dito anteriormente em termos de treinamento, se dedica ao máximo e mesmo assim ele não pode usufruir do fluxo à vontade, então o que fazer?
O atleta não conseguir fluir à vontade, mas com dedicação ao treinamento constante e busca de altos desafios pode perfeitamente vencer obstáculos e gerar condições para facilitar a fluência ao “preparar o cenário” para a mesma. Ou seja, o atleta pode preparar todas as reais condições para que ele possa ter grandes chances de fluir.
“A preparação do cenário” está ligada aos elementos do treinamento que são representados pelos condicionamentos físicos, técnicos, táticos e psicológicos, ditos anteriormente, mas aqui há de se ter pré-requisitos para adquirir tais condicionamentos e com isso o “cenário”.
Assim sendo, são pré-requisitos para vencer obstáculos e gerar condição para facilitar a fluência:
Pré-requisitos para gerar o fluir:
a) Autodisciplina: é desenvolver a autoconsciência para assimilar responsabilidades pessoais como um hábito natural sem a necessidade de controle externo. A autodisciplina é responsável pela tranquilidade em assumir desafios e tomar atitudes positivas.
b) Autoconsciência: é saber exatamente aquilo que tem que ser feito e como fazê-lo;é dominar técnicas, táticas e as emoções.
c) Treinar corpo e mente: é entender que corpo e mente são unos e para toda ação física há uma consequência simultânea mental e vice-versa. É preparar as capacidades físicas e psicológicas para exigentes demandas. Tanto no aspecto mental (cognição – por exemplo, compreensão das táticas) propriamente dito como emocional.
d) Ter consciência do fenômeno do fluir e os fatores que conduzem a ele: Conhecer, gerar consciência, a respeito daquilo que pode ser útil ao próprio atleta desenvolve e facilita desempenhos a partir de treinamentos espontâneos. Portanto, o atleta que deseja facilitar o fluir, de uma forma ou de outra, precisa conhecer o fenômeno. E assim gerar uma confiança inquebrantável!