Por Ângelo Medina
Na primeira parte desta entrevista (veja aqui) o Doutor em Psicologia do Esporte e professor de Educação Física da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Renato Miranda, explicou como a prática esportiva pode te ajudar a vencer na vida.
Nesta segunda parte, ele ensina técnicas para melhorar a concentração e como se preparar psicologicamente para aquela competição que será um grande desafio e muito mais.
Vya Estelar – Até que ponto a concentração influencia no desempenho de uma atleta numa competição? Tem como melhorá-la?
Renato Miranda – Em nosso capítulo sobre concentração no esporte há o seguinte destaque sobre a importância da concentração e o desempenho atlético: o investimento na melhoria da capacidade de concentração é pré-requisito para se obter sucesso em um nível de exigência qualquer e, principalmente, no alto rendimento esportivo. Assim, podemos concluir que tudo aquilo que queremos fazer com alta qualidade só é possível se disponibilizarmos nossa concentração.
Técnicas para melhorar a concentração
Ela é (a concentração) nossa melhor energia para melhorarmos nossa qualidade de execução de tarefas. Sendo assim, propomos que é possível melhorar a concentração desde que, de princípio, atentemos para os seguintes fatores:
– Ter um bom nível de autoconhecimento;
– Reconhecer estratégias e táticas variadas de atuação;
– Controlar interferências do meio ambiente;
– Memorizar um amplo repertório de tomadas de decisão e detectar detalhes que precisam ser focalizados com o máximo de atenção.
Vya Estelar – O que você aconselha a atletas que participam de competições de alto nível para poder lidar com o estresse e a ansiedade?
Primeiro: Lembrar que o esporte existe para divertir as pessoas, portanto, o atleta de alto nível precisa entender que mesmo sendo profissional, o produto de seu esforço é o divertimento, logo, disputar as competições com alegria, entusiasmo, satisfação e motivado. Aceitar que a tensão faz parte do ”jogo”, aliás, se você retira a tensão da disputa ela fica sem graça. Em outras palavras, nos Jogos Olímpicos quanto mais presente o elemento competitivo, mais apaixonante será a disputa;
Segundo: Fazer durante o descanso, exercícios de mentalização e relaxamento;
Terceiro: Acreditar em seus treinamentos e técnico (gera autoconfiança e com isso inocula os efeitos negativos do estresse e a ansiedade);
Quarto: Mobilizar todos seus esforços (físicos, mentais e emocionais) até o fim da competição.
Vya Estelar – Como você avalia hoje o preparo psicológico do atleta brasileiro frente à condução de sua carreira, treinos e competições? Existe algum elemento que precisa ser mais aprimorado?
Renato Miranda – Contrário ao que muitos pensam o atleta brasileiro não deve nada aos outros em termos de pré-requisitos psicológicos. O problema é que nossos atletas não treinam a parte psicológica, é como se fosse uma questão de menos valor em relação à parte física, técnica e tática. Na verdade, todos esses conteúdos, por si só, contêm aspectos psicológicos fundamentais para seu desenvolvimento. Em resumo, falta aos nossos atletas treinamento psicológico de qualidade, permanente e coerente com a atuação do atleta, ou seja, treinos que realmente tenham consequências positivas na melhoria do desempenho esportivo.
Vya Estelar – Para os atletas profissionais em – ascensão e veteranos – qual conselho você daria para cada um deles em relação à condução de vida/carreira?
Renato Miranda – Para esses atletas dou o seguinte conselho: a liberdade de escolha que eles tiveram em ter uma vida de atleta, naturalmente impõe limites em suas vidas. Aceitar esses limites é saber viver melhor suas carreiras. Naturalmente um atleta de alto desempenho deverá ter uma vida social limitada e disciplinada. Toda profissão para se ter sucesso exige sacrifícios, aceitá-los conscientemente e feliz é dar passos para vitórias. E sempre é bom lembrar, a carreira esportiva é curta!
Vya Estelar – Quer dizer então que tanto iniciantes como veteranos devem conduzir vida/carreira do mesmo modo?
Renato Miranda – Sem dúvida. É claro que um veterano (profissional) tem maior responsabilidade porque ele acaba sendo um modelo para os mais jovens, mas desde a tenra idade valores como disciplina, liberdade e limite devem ser estimulados. Afinal de contas, com perdão da metáfora, é na raiz de uma árvore que a qualidade de um fruto é definida, embora a raiz esteja no subsolo. Isso talvez explique as atitudes (boas ou ruins) de muitos atletas adultos. Muitas vezes a explicação está lá na raiz (iniciação) A diferença básica do esporte infantil para o profissional está em sua dimensão, mas as emoções e valores pessoais envolvidos estão presentes em ambas as situações.
Vya Estelar – Sabemos que o dopping é uma praga. De que forma o atleta pode se motivar para não recorrer a essa prática ou não ser influenciado em utilizá-la?
Renato Miranda – Conscientizá-lo de que não basta vencer, é preciso que seja de maneira correta, sem ferir regras esportivas. É fazer o que tem de ser feito da forma tecnicamente perfeita e de maneira limpa. Atletas que sabem encarar os adversários considerando seus próprios limites e reconhecer a realidade tendem a construir uma ética relacionada ao espírito universal do esporte. Ou seja, acreditam que só se atinge o sucesso pretendido por meio das vias legítimas e isso é exatamente o que se convencionou chamar de fair-play. (jogo limpo, em inglês).
Por fim, uma coisa é certa: o doping no esporte de alto nível cria nos torcedores e adversários a realidade do engano e para o atleta dopado a fantasia de um sucesso que na verdade é uma grande mentira. Uma mentira sem graça!