Aprender com o trivial: cozinhar

Toda oportunidade de desenvolvimento deve ser aproveitada – e pode estar escondida nas entrelinhas do seu cotidiano


Parábolas e metáforas evidenciam muito do trivial da vida. Não sem frequência são guias de reflexões profundas, mesmo que traduzam o óbvio contido em nosso cotidiano. Muitas vezes precisamos não somente desses guias reflexivos, mas também do aprendizado oculto em aspectos práticos de nosso dia a dia, nas minúsculas decisões. Para o primeiro caso, não subestime os mestres orientais sobre isso, nem o poder de um livro de autoajuda calcado nesses recursos (claro que isso vai muito da qualidade do autor, da publicação – mas convém não criticar generalizadamente esse tipo de literatura ou sua utilidade para muitos). Para o segundo, basta observar…

Por esses dias me peguei atenta ao fato de que tarefas ordinárias, e às vezes consideradas maçantes, ou exercidas por necessidade desses novos tempos, contêm muito daquilo que pode nos mover em direção a nosso crescimento e nos conectar com nossa realidade. Uma das atividades que mais me gerou insights foi cozinhar, diariamente, pensando um menu, os gostos da família, as restrições de cada um e a rotina em torno das refeições.


Cozinhar é vida

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Há quem adore. Eu não posso dizer que ame fazê-lo, mas percebi que sinto prazer na tarefa de preparar a comida em casa e ainda não sei ao certo a razão dessa minha descoberta. O que mais me surpreendeu, no entanto, não foi estar diante de uma novidade inusitadamente agradável em minha rotina. Foi, sim, entender o quanto cozinhar se assemelha à nossa própria existência.

Preparar um prato para outras pessoas requer considerações: gostos, necessidades, sanar desejos ocultos ou escancarados. Comida é algo que aguça os sentidos tanto quanto dá energia, ao mesmo tempo em que pode ser o amor encarnado na forma de temperos, lembranças, apresentações, cuidados na escolha dos ingredientes. É como nos relacionamentos pessoais, profissionais… há o pisar em ovos para atender expectativas, o negociar o menu para agradar o maior número de pessoas, a surpresa que demonstra o afeto. O esmero para demonstrar competência e dedicação.



Paciência para o ponto certo

Cozinhar nos ensina, ainda, sobre planejar, seguir à risca receitas bem-sucedidas, ter paciência para o ponto e a textura certos (como em muitos momentos de nossa existência, em que não é possível seguir atalhos, nem apressar o passo). Nos mostra, também, que sem os melhores utensílios e recursos um prato pode ser arruinado, e, ainda, que nessa hora o improviso pode ser a salvação – criatividade e amor podem salvar o dia, ou melhor, a refeição.

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Os excessos, na cozinha como na vida, deveriam passar longe… em nome da saúde física e da saúde mental, respectivamente.

Mais do que qualquer coisa, preparar a comida nos conecta com o próprio corpo e com o momento presente, um caminho para o autoconhecimento, o bem-estar e o fim da angústia pelo passado e pelo futuro. Pois se não cuidar ali, naquele momento, em que já não importa mais a etapa anterior do cozimento, vai queimar, passar, se tornar difícil de digerir…