por Elisandra Villela Gasparetto Sé
Se preocupar com a arquitetura e design do ambiente para o cuidado das pessoas idosas em clinicas geriátricas é também uma forma de intervenção não farmacológica, principalmente no contexto das demências.
A criação de ambientes de alta qualidade, que possam proporcionar o envelhecimento saudável com bem-estar, é um desafio para todas as sociedades que valorizam as pessoas idosas.
O desafio do design de ambientes para pessoas com demência tem o objetivo de proporcionar aos idosos com demência as mesmas oportunidades de envelhecer com qualidade que os idosos saudáveis possuem. Nesse sentido, o design de ambientes para pessoas com demência não deve ser encarado como uma disciplina do design de estabelecimentos de saúde; mas como uma área inserida na abordagem geral para criação de ambientes, que permitam aos seus clientes a satisfação das suas necessidades humanas e do seu direito à dignidade, independências de acordo com suas capacidades, cuidado em todas as suas ações, autorrealização e participação social.
A aplicação do design de ambientes na área de gerontologia tem como consequência a redução dos sintomas geralmente atribuídos à demência. Por esse motivo, planejar o ambiente, pensando na arquitetura e design pode ser considerado uma intervenção não farmacológica.
Os efeitos do ambiente físico são sempre mediados pelas pessoas que os utilizam, pelas características do espaço e pelos programas e rotinas diárias de determinado espaço, quer seja na própria casa do doente, ou em estabelecimento de saúde, centro de dia, ou qualquer outra instituição. Os pacientes idosos são diretamente afetados pelo ambiente, e incluem outras pessoas que partilham o mesmo espaço, cuidadores, família e profissionais da organização.
O ambiente de uma clínica geriátrica ou Instituição de Longa Permanência afeta as pessoas que ali vivem, convivem e trabalham. Os pacientes são afetados pelo design do ambiente e esse também influencia o turno dos profissionais, afetando toda a organização. Por exemplo, a dimensão do local (no caso de uma situação de vida comunitária), influencia a relação proporcional entre os residentes e os funcionários – o número de pessoas que cada funcionário tem à sua responsabilidade é muito importante.
Cuidadores, gestores e o pessoal de manutenção desejam que o ambiente seja solidário, confortável e seguro para as pessoas que são cuidadas, porque toda a interação entre essas pessoas no dia a dia é dinâmica. As pessoas mudam, as estações do ano mudam, o grau de severidade da doença se modifica, etc. Eles também querem que o ambiente os façam sentir bem por terem de cuidar e manter a pessoa lá.
Os edifícios precisam ser projetados ou reformados para satisfazer as necessidades dos idosos de um modo geral, representando um valor agregado para seus clientes.
O ambiente não pode impor barreiras arquitetônicas, como por exemplo: escadas, degraus, desníveis, falta de rampas, obstáculos, pisos escorregadios, iluminação ou sinalização deficiente, e nem barreiras ergonômicas, como por exemplo, móveis inapropriados que dificultam o livre acesso e conforto: sofás excessivamente fundos, fofos e baixos demais, camas altas, cadeiras com área e ângulo do apoio para as costas e para os braços deficientes, armários de parede pendurados muito alto, visores de aparelhos com letras muito pequenas. Pelo contrário, quando as características ambientais não se encaixam com as competências individuais dos pacientes idosos numa clínica ou instituição surgem comportamentos não adaptativos e emoções negativas.
Docilidade ambiental
O pesquisador e gerontólogo *Lawton desenvolveu um modelo conhecido como “docilidade ambiental” que descreve justamente a inter-relação entre as competências individuais e as pressões sociais e físicas. O indivíduo e o ambiente são considerados um sistema interdependente, no qual ambas as variáveis influenciam as características internas da outra. Segundo esse modelo de Lawton, os comportamentos adaptativos ocorrem quando as características individuais e ambientais são congruentes. A aplicação desse modelo de “docilidade ambiental” no design para o paciente com demência leva em conta as capacidades comportamentais, cognitivas e emocionais.
Existem muitas maneiras de se descrever os processos associados ao design de ambientes e todos se referem especificamente ao design de instalações residenciais comunitárias – lares de terceira idade, casas de repouso ou estabelecimentos de saúde.
Os pontos cruciais são:
– tamanho;
– espaço privado, quartos;
– ambiente familiar e doméstico;
– espaço exterior;
– relação entre os espaços;
– localização em cidades e áreas rurais.
Com relação ao tamanho refere-se especificamente ao tamanho das instalações de prestação de cuidados de saúde. O tamanho de uma instituição tem inúmeras implicações para a gestão, as finanças, o atendimento e muitos outros aspetos. O tamanho tem implicações na experiência dos residentes, da família e da equipe – especialmente o nível de ruído e estímulos com que eles lidam diariamente. Uma instituição de longa permanência de tamanho ideal terá que alocar entre 7 e 10 pacientes, no máximo 12 com a mesma doença e grau de severidade. Mais de 7 pacientes com o mesmo grau de comprometimento já é insuficiente.
As instituições de 30 ou mais pacientes idosos com demência são muito grandes e requerem uma gestão de atividades mais exigente do que no caso de grupos pequenos.
O tamanho também está relacionado com a experiência residencial vivida pelo paciente. E deve-se fazer a distinção entre o tamanho administrativo (número de funcionários, gestão, entre outras coisas) e o tamanho sentido pelos pacientes, familiares e funcionários. Instalações do tipo hotel pequeno de 15 pessoas, ou 6 instalações do tipo hotel familiar de 10 pessoas cada, a experiência dos pacientes, dos familiares e dos funcionários será mais influenciada pelo tamanho do ambiente residencial do que pelo tamanho do edifício como um todo.
Uma forma de simular a experiência de vida num contexto familiar, é reunir os pacientes para se encontrarem num ambiente maior, através das atividades terapêuticas em conjunto, refeições e outros eventos em grupo. Numa residência de 30 pessoas, é essencial que as atividades sejam organizadas em grupos menores para que os pacientes consigam estabelecer relações mais pessoais com os funcionários e outros residentes.
Quanto ao espaço privativo, como os dormitórios e banheiros sem dúvida ter um dormitório privado para os pacientes em todas as instituições de saúde, especialmente hospitais, seria o ideal, principalmente, devido ao melhor controle dos sintomas e promoção de saúde, controle de infecções, privacidade e preservação da autonomia.
Porém, muitas vezes há a necessidade de algumas pessoas partilharem um quarto. Isso pode ser conseguido através da subdivisão do espaço, aumentando a privacidade e o território disponível para os residentes. É importante analisar a quantidade e o tipo de mobília que caberá no quarto. A cama desenhada é, invariavelmente, uma cama de solteiro, mas para aqueles moradores que viveram toda a sua vida numa cama maior, passar para uma cama de solteiro é uma mudança estigmatizante. Sempre que possível, portanto, alguns quartos precisam ser projetados para acomodar uma cama de casal. Os quartos representam o espaço privado de cada residente, o lugar que ainda controlam. O design desse elemento não é, por esse motivo, simplesmente uma questão de eficiência, mas sim um problema de equidade social na qual as definições de privacidade culturalmente relevantes também devem ser consideradas.
Por fim, as residências para pessoas com demência são lugares para elas viverem, onde possam receber os cuidados necessários, e não uma mera casa de prestação de serviços terapêuticos e de cuidados onde também vivem. Isso significa que uma das principais preocupações deve ser a criação de um ambiente familiar em que os cuidados de saúde possam ser prestados como parte da vida.
Os sons e os cheiros de uma residência combinados com os níveis e o tipo de iluminação têm um efeito profundo sobre a experiência e o comportamento das pessoas que vivem, trabalham e visitam o espaço. E isso é conseguido através da dimensão dos espaços, das cores, do mobiliário, da decoração, dos equipamentos… para proporcionar uma sensação familiar a um espaço. As pessoas devem poder decorar os seus quartos: mobília e decoração da parede.
Além do quarto, cozinha, sala de estar e jantar, a área exterior é fundamental. Um jardim, um quintal, um pátio – algum espaço ao ar livre – também é uma exigência para satisfazer as necessidades humanas e os direitos dos residentes num espaço residencial partilhado. O equilíbrio entre a luz natural e artificial, as medidas tomadas para diminuir o ruído e fomentar a comunicação verbal, o fornecimento de ar fresco a uma temperatura confortável, todos esses fatores se combinam para proporcionar um ambiente em que se promova o envelhecimento saudável.
* Lawton MP