Por Samanta Obadia
“Palavras são palavras e a gente nem percebe o que disse sem querer e o que deixou pra depois”, poetava Roberto Carlos na década de setenta. Palavras soltas impensadas, palavras vazias ecoando solidão. E o mito da “Eco” retrata claramente.
Eco era uma ninfa que adorava sua própria voz. Zeus visitava as ninfas com frequência. Suspeitando dessas ausências do esposo, Hera veio à terra a fim de flagrá-lo. Sendo a prolixa Eco a única do grupo que não divertia-se com Zeus, intentou salvar suas amigas, falando com Hera ininterruptamente, de forma a possibilitar que o deus e as outras ninfas escapassem. Finalmente a deusa conseguiu livrar-se dela e, chegando ao campo onde os amantes estavam, encontrou-o deserto. Percebendo que tinha sido enganada, resolveu castigá-la, tirou-lhe o poder da conversa, deixando-lhe apenas a repetição da última palavra do outro. Solidão sem autonomia. Uma voz sem sentido.
Percebemos nossa necessidade do outro em pequenas ausências do cotidiano. Observo o quanto as pessoas sentem-se acompanhadas ao ouvir a Rádio ou a TV. Nas manhãs de domingo, em meu quadro “Papo de Família” na Rádio Tupi, sinto a alegria e a confiança na troca com os ouvintes.
As palavras carregam imagens e seus sons embalam ideias. Imaginamos, duvidamos, dialogamos. Abrimos espaço para a nobreza da poesia, nas belas construções e rimas, nos castelos de palavras e sílabas.
O canto de ninar acalanta os bebês, vozes doces afagam os sentidos, gritos e palavras ásperas amedrontam. Quanto poder há na voz e na ausência desta. Pessoas isolam seus sentidos com fones de ouvidos. Deixam de ouvir, deixam de ver, deixam de falar. Repetem palavras, letras de música, perdem o contato.
Outro dia, presenciei um motorista conversando com o GPS e aquela situação me remeteu às diversas formas que usamos para disfarçar nossa solidão. A linguagem nos une e nos distancia. Aprendemos a falar para nos comunicar. Desaprendemos a ouvir e nos afastamos uns dos outros. Mas ouvir a voz humana nos acalenta em nosso íntimo, nos faz sentir acolhidos. Em análise, há o tempo de ouvir e de interferir, há o tempo de calar e de sentir. A linguagem se faz na palavra e na pausa. A poesia se faz na escuta. No ócio, ouço Odilon Esteves em seu canal no YouTube e me deleito. Recomendo! Em nossas almas, #espalhemospoesia.