por Juliana Zacharias – psicóloga do NPPI
Até bem pouco tempo as fronteiras entre o que era público ou privado estavam claramente estabelecidas, até mesmo por barreiras físicas: os muros de nossas casas.
Cada pessoa sabia quais eram as regras, os riscos, as expectativas, bem como os comportamentos esperados na esfera pública e cada um sabia que, dentro das paredes da sua casa, do seu quarto, esses padrões podiam ser mudados. Obviamente, sempre existiram aqueles que não obedeceram a esses padrões, mas, nesses casos, era evidente a rebeldia ou a excentricidade envolvida nessa atitude. Por exemplo, quando um filho estava na rua, sua mãe sabia exatamente com o que deveria se preocupar: onde ele estaria, com quem, a que horas voltaria. Quando esse filho voltava para a casa, a sensação de tranquilidade e segurança eram imediatas: “agora sei com quem ele está e onde”.
Com o surgimento da internet e sua imensa popularização, essas fronteiras foram e estão sendo questionadas, reposicionadas ou até mesmo derrubadas! Hoje em dia, essa mesma mãe pode ver seu filho dentro das paredes de seu quarto, supostamente em segurança e sob sua supervisão, mas ele está navegando e, se está navegando, está em um espaço PÚBLICO.
Boa parte dos pedidos de orientações que recebemos (contendo temas ligados ao uso da internet) em algum sentido se relaciona com os problemas gerados por essa confusão entre o público e o privado inaugurada recentemente: mães pedem orientação para seus filhos, pessoas com problemas de exposição nas redes sociais, casais confusos quanto aos limites da chamada traição virtual, entre outros.
Claro que cada tema tem sua especificidade e cada caso em particular, também. Entretanto, se entendermos a internet (redes sociais, youtube, sites, twitter, etc.) como um espaço público, como se estivéssemos na rua, numa reunião ou numa festa, essa visão nos ajudará a estabelecer nossos próprios limites bem como as regras a serem seguidas nas nossas relações (com nossos filhos, cônjuges ou conosco mesmos).
Desse modo, ainda que resolvêssemos transgredir esses limites, não seria por confusão, mas por “rebeldia”. A ideia é que a pessoa só se exponha na medida em que suporte as consequências dessa exposição.
Pensar assim pode parecer angustiante e trabalhoso, uma vez que já estamos acostumados a nos sentir “soltos” e “livres” na condição online. Entretanto, a liberdade na net não deve ser a liberdade do “posso tudo”, mas precisa ser entendida exatamente da mesma forma que a liberdade experimentada na vida em geral: aquela que é vivida com responsabilidade, respeito e democracia.
Por falar em democracia, não podia deixar de lembrar, depois do ano de 2011, um aspecto incrível permitido pela mesma quebra de barreiras entre o público e o privado: a possibilidade de democratização de países “fechados”. A chamada Primavera Árabe foi desencadeada nas redes sociais exatamente por serem elas espaços públicos instalados dentro de nossas casas. Nenhum de nós precisou sair de nossas casas e ir fisicamente a nenhum outro país para trocar experiências, possibilidades, ideais de liberdade e de uma vida diferente. Não é à toa que todos os regimes não democráticos lutam pelo controle da internet!
A internet é uma ferramenta muito poderosa! Então, faço minhas as palavras famosas do filme O Homem Aranha I (Dir: Sam Raimi, EUA-2002) : “Com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades”. Vamos usar a WEB com responsabilidade e tirar dela todas as maravilhas que pode nos proporcionar.