por Patricia Gebrim
Não há nada mais lindo e nobre do que o perdão, mas eu tenho visto esse termo exposto de uma maneira que, a meu ver, pode conduzir muitos a um lugar de perigo e muita dor.
Vejo pessoas sendo repetidamente agredidas, humilhadas, maltratadas, sem se moverem do lugar, amparadas por essa ideia equivocada do que seria o perdão. Ficam porque acreditam que o perdão seja uma espécie de aceitação incondicional de tudo, e esse é um erro que ampara uma crueldade que entristece a todos nós, basta ver as estatísticas de violência doméstica.
Perdoar não é uma atitude, é uma elevação em nosso nível de consciência e tem a ver com compreendermos que tudo o que acontece foi de certa forma atraído por nós para nosso próprio crescimento. Perdoar é olhar com os olhos da alma, e não do ego. Perdoar é aprender e seguir adiante. Perdoar muitas vezes não requer uma ação externa. É algo que se passa dentro de nós, naquele lugar sagrado onde o amor acontece. Perdoar é aceitar a humanidade imperfeita que existe em nós e no outro.
No entanto, mais do que saber o que é perdoar, penso ser de suma importância perceber que muitas vezes, amparados pelo que muitas religiões pregam, achamos que estsamos perdoando alguém quando na verdade estamos agindo com uma profunda falta de amor por nós mesmos.
Olhemos juntos para o que o perdão "não é":
1º) Perdoar não é um ato de sacrifício onde nos oferecemos para que a crueldade alheia nos abata dia após dia.
2º) Perdoar não significa desculpar repetidas vezes atos de crueldade e continuar permitindo que pessoas ou situações nos firam.
3º) Perdoar não significa ser obrigado a conviver com pessoas que nos fazem mal.
4º) Perdoar não significa esquecer.
5º) Perdoar não significa, de forma alguma, concordarmos em sofrer.
Muitas vezes alguém nos fere, e conscientemente percebe o mal que nos causou, expressando verdadeiramente, do fundo de seu ser, um desejo de repará-lo. Se isso for verdadeiro, essa pessoa passará a agir de forma diferente, respeitosa, cuidadosa, transformando de fato a atitude que causava mal. Suas atitudes mostrarão que realmente se arrependeu. Nesse caso o perdão pode e deve vir, livre, generoso, das profundezas do nosso coração.
Da mesma forma, é uma atitude das mais transformadoras quando perdoamos a nós mesmos por algo que cometemos e que sabemos, com toda a nossa alma, ter sido danoso, para nós mesmos ou alguém mais. É um ato de cura perdoarmos a nós mesmos ou a outro alguém, desde que exista consciência e aprendizado envolvidos.
Desculpas verdadeiras vão muito além das palavras e têm a ver com uma expressão do verdadeiro arrependimento, que vem da alma.
Mas muitas vezes, apesar das desculpas, o outro continua agindo de maneira prejudicial, repetindo de novo e de novo as ações que nos causaram e continuam causando mal. As desculpas, meras palavras vazias, talvez tenham o intuito de manter algum ganho, manter uma máscara social, ou satisfazer o ego. Nesse caso, esse "perdão" caricato, como costuma ser indevidamente incentivado, é a pior coisa que podemos oferecer. Não podemos, através desse "perdão", ser cúmplices em atos de crueldade. Não é justo com quem está sendo ferido. Tampouco é justo com quem fere. Essa pessoa talvez precise viver a dor de perceber o quanto cria de destruição ao agir assim.
Infelizmente, muitas pessoas, buscando ser espiritualmente superiores, buscando ser bondosas, colocam a si mesmas no lugar de serem feridas repetidas vezes, acreditando assim estarem perdoando, quando na verdade elas estão fazendo uma parceria com o mal.
Não digo que devam retribuir ou agredir o outro. Ou fechar a ele seu coração. Não. Mas nesse caso tem todo o direito, e eu diria a obrigação de se afastar, mantendo em seu coração uma compaixão por aquela pessoa que insiste em causar o mal. Esse é o perdão possível. O verdadeiro perdão. Não julgar o outro. Compreender que naquele momento essa pessoa não consegue contatar o amor em seu próprio coração. Compreender que aquela pessoa ainda não é capaz de sair dessa distorção. E impedir que o mal continue sendo causado. Essa parte final é fundamental.
O perdão requer que sejamos capazes de tratarmos a nós mesmos com amor. Se não aprendermos a fazer isso, não seremos jamais capazes de verdadeiramente perdoar ou amar alguém.