por Elisandra Vilella G. Sé
Todos nós sentimos a necessidade de estar no controle dos eventos e situações da nossa vida, principalmente os que afetam nosso bem-estar, nossos objetivos e nossos ideais. Durante todo nosso curso de vida, da infância até a velhice estão presentes o exercício da autonomia, a condição de dependência e independência.
Muitas vezes, no imaginário popular estas condições são tratadas como sendo antagônicas (que se contrapõe), entretanto, na literatura mais recente, esses conceitos são considerados como referentes a uma dinâmica que se exprime de várias formas nas diversas fases da vida.
Autonomia significa o exercício do autogoverno, auto-regulação, livre-escolha, privacidade, liberdade individual e independência moral. Refere-se à liberdade de experenciar os eventos de vida com harmonia com os próprios sentimentos e necessidades.
Independência é a capacidade funcional, isto é a capacidade de realizar as atividades básicas do nosso dia-a-dia (alimentar-se, fazer a higiene pessoal, ir ao toalete, tomar banho, vestir-se, se locomover, etc…) e atividades instrumentais da vida diária (fazer compras, pagar as contas, usar meio de transporte, preparar uma refeição, cozinhar, cuidar da própria saúde, manter sua própria segurança) a ponto de sobreviver sem ajuda para o autocuidado e o manejo instrumental da vida.
Déficits em capacidades funcionais refletem-se em dependência funcional. A independência não é condição necessária para a autonomia, embora seja uma condição freqüentemente presente em pessoas capazes de decidirem por si. A independência está associada à agência, à autonomia, à autoconfiança e ao autocontrole. A dependência significa a incapacidade da pessoa funcionar satisfatoriamente sem ajuda, quer por dificuldades físicas e/ou mentais.
Autonomia, dependência e independência
Assim, autonomia, dependência e independência são condições que se entrelaçam. São condições presentes em nosso curso de vida com diferentes formas de manifestação pelas pessoas e por uma sociedade. É possível que uma pessoa seja dependente mas sem perder sua autonomia.
Na medida que amadurecemos nos libertamos das relações e necessidades de apoio, segurança e assistência dos outros. A natureza da dependência e da autonomia se transforma ao longo da vida e o equilíbrio dessas duas condições vai se alterando. A busca de identidade e individualidade propicia o desenvolvimento da autonomia. A autoconfiança e senso de agenciar a própria vida nos dão a certeza de que não estamos sozinhos.
Existem três dimensões que influenciam a dinâmica autonomia, dependência e independência ao longo da vida, são as dimensões biológicas, sociais e psicológicas. Ou seja, o crescimento e mudanças biológicas, as exigências sociais e antecedentes psicológicos assumem diferentes pesos em diferentes fases na vida de todos nós. Assim, quando bebê, e na infância, somos mais dependentes devido às exigências biológicas, devido às limitações físicas e mentais naturais e na vida adulta nossa autonomia e independência é afetada mais pelas exigências sociais e por metas individuais. Por isso, ser dependente no contexto da vida adulta tem um sentido bem diferente da dependência na infância.
Na vida adulta e na velhice, a adequada fusão da dependência e independência, depende do senso de agência e autonomia. É importante lembrar que existe uma relação entre as competências da pessoa e as exigências de seu ambiente e da sociedade em que se vive.
Muitas vezes a dependência física é confundida com perda de autonomia, por isso vemos freqüentemente que o senso comum considera que com o envelhecimento os idosos são vulneráveis a perder o controle de suas vidas. O ambiente social tem uma grande responsabilidade sobre as condições de autonomia, dependência e independência do indivíduo idoso.
O fato de outras pessoas no ambiente ajudar nas necessidades biológicas de uma pessoa não significa que ela não possa exercer seu papel efetivo em seu próprio desenvolvimento, ou seja, ter um domínio de seu contexto social. Em instituições, por exemplo, como os asilos e casas de repouso, muitas vezes a dependência física é confundida com dependência para a tomada de decisão, o que dá origem à perda da individualidade.
Superproteção e dependência
Ambientes superprotetores e de baixa exigência também geram dependência, indicação para que os cuidadores familiares e profissionais não pensem o cuidado como fazer pelo idoso, mas como dar-lhe a ajuda necessária para que se comporte na medida de suas possibilidades. A perda de domínio sobre a própria vida e sobre o próprio ambiente pode ter conseqüências negativas significativas para a saúde física e mental em todas as idades.
A autonomia é uma necessidade básica do ser humano e essencial ao bem-estar subjetivo dos indivíduos. Torna-se muito importante selecionar eventos na vida que podemos exercer de forma plena e satisfatória nossa autonomia e nelas investir. Aceitar a diminuição do desenvolvimento físico ou mental sem reagir, como aspecto inevitável do declínio biológico pode impedir a pessoa de explorar suas capacidades. Por outro lado, o fato de os idosos também descobrir que podem controlar o ambiente pela dependência também pode ter um efeito benéfico.
O grande exercício da vida é o aprendizado em diferenciar quando o controle da própria vida é compensatória e quando não é. E é assim que todos agem quando pedem forças para modificar aquilo que pode ser modificado, paciência para aceitar aquilo que não pode ser modificado e sabedoria para perceber a diferença, como aborda a prece da Serenidade.