por Danilo Baltieri
"Minha irmã é usuária de cocaína e ganhou neném recentemente, a criança não para de colocar a língua pra fora, mexe muito e às vezes chora por motivo algum visível por aproximadamente uns 20 minutos. Isso tem a ver com o uso da droga durante a gestação?"
Resposta: Existem várias evidências científicas sobre os malefícios provocados pelo consumo materno de cocaína/ crack sobre os infantes tanto durante a gestação quanto após o parto.
Seguramente, as mães que padecem de quadros de uso, abuso ou dependência de cocaína/crack deveriam ser tratadas com a máxima rapidez e efetividade possível, objetivando a interrupção do consumo da droga, o seu próprio bem-estar, a saúde e segurança dos seus filhos. Caso a mãe dependente não manifeste desejo para tratar-se, seus familiares e amigos devem, de forma rápida e efetiva, procurar ajuda especializada imediatamente.
As taxas de consumo de cocaína/crack entre gestantes têm variado entre 2 e 10%, dependendo das amostras investigadas. Prejuízos sobre o crescimento, ganho ponderal e funções cognitivas (atenção, memória, concentração, inteligência) têm sido reportados em diferentes estudos.
Existem inúmeras complicações associadas ao uso da cocaína pelas mães, tanto durante a gestação quanto na amamentação. Seguramente, essas mulheres NÃO DEVEM, SOB QUALQUER CIRCUNSTÂNCIA, AMAMENTAR SEUS FILHOS, enquanto ainda estiverem fazendo uso de cocaína/crack. Além disso, é tremendamente comum que mulheres dependentes de cocaína/crack também façam uso concomitante de outras substâncias, como álcool, nicotina e maconha.
O consumo de cocaína/crack durante a gestação está associado com várias complicações ao feto/bebê, tais como: malformações congênitas, diminuição do crescimento fetal, convulsões, infartos cerebrais e hemorragia, déficits no sistema auditivo, morte súbita, arritmias cardíacas, enterocolites (inflamação do intestino delgado e do cólon), e alterações comportamentais diversas.
De fato, a exposição dos bebês à cocaína provoca graves alterações do funcionamento cerebral, seja como resultado da hipoxemia (redução da oferta de oxigênio às células neurais) causada diretamente pelo consumo da droga, ou mesmo como resultado da reatividade cerebral modificada pela exposição a essa substância. Filhos de mães usuárias de cocaína durante a gestação podem apresentar, tardiamente, retardo do desenvolvimento mental e motor.
Também, crianças convivendo com mães usuárias de cocaína/crack constituem um grupo de alto risco para futuramente tornarem-se também usuárias de substâncias. Essas famílias frequentemente vivem em lares estressantes, recheados de fatores negativamente relacionados com a formação e desenvolvimento de vínculos saudáveis. Mulheres dependentes de crack frequentemente engajam-se em comportamentos de alto risco, expondo seus filhos a situações também ameaçadoras, vexatórias e permeadas por privações afetivas e econômicas.
É importante ressaltar também que mães usuárias de crack comumente padecem de outros transtornos mentais e do comportamento, como depressão, ansiedade e aqueles relacionados com o controle dos impulsos. Combinados os transtornos, os filhos estão expostos a um ambiente, a uma situação e a “cuidadores” que precisam receber intervenção rápida, eficaz e adequada.
Não raras vezes, o abuso materno de crack revela um “guarda-chuva” de outros problemas complexos, incluindo violência doméstica ou outras formas de violência, abuso de outras substâncias, negligência e abusos físico e sexual, pobreza, desemprego etc.
Às vezes, tenho recebido perguntas de leitoras que questionam sobre qual a quantidade de cocaína que poderia ser consumida com segurança durante a gestação. Certamente, a resposta é NENHUMA !!!! NÃO HÁ DOSE SEGURA!!! A resposta sempre é: por favor, procure profissionais especializados para realizar o seu tratamento e consequentemente resultar na interrupção imediata do consumo da (s) substância (s).
Diante de tantas complicações possíveis advindas do consumo de cocaína/crack por mães durante a gestação e na amamentação, certamente os seus filhos precisam receber cuidados especiais por médicos pediatras adequadamente familiarizados com tais problemas. Também, a mãe e demais cuidadores deverão realizar tratamento médico e psicossocial adequado para promover a tão desejada (e necessária) abstinência completa.