por Renato Miranda
O Brasil ainda não solidificou uma possível índole para ser reconhecido como um país que favorece a prática esportiva e a revelação de talentos nos mais variados esportes, em destaque os esportes olímpicos. Esta constatação é fácil de verificação. Basta uma breve checagem nos currículos dos cursos superiores de educação física e nas atividades desenvolvidas com crianças e jovens nas escolas de ensino fundamental e médio no Brasil. Encontraremos muito pouco sobre esporte. Paradoxo!
Rapidamente se observará que ainda temos um caminho árduo pela frente até nos tornarmos um país em que a prática esportiva seja um traço cultural de destaque. Até lá, muitos de nossos cidadãos deixarão de praticar esportes em alto nível. Seja por falta de oportunidade de conhecer e treinar determinado esporte ou por falta de condições gerais (infraestrutura, compatibilidade com estudos, pouca oferta de clubes que investem no esporte competitivo e outros).
Nesse contexto, quando jovens ainda em tenra idade, por volta dos 12 anos começam a despertar sério interesse em praticar algum esporte e ao mesmo tempo revelam ter talento especial, iniciam um difícil processo.
Primeiramente, quando bem orientados descobrirão que somente com o talento não "chegarão muito longe". Fundamental é o trabalho constante, intenso e árduo para o desenvolvimento pleno. Esse trabalho tem no treinamento dentro e fora do lócus da atividade (piscina, quadra, campo, pista, tatame etc) sua melhor expressão. Dentro da quadra: suor! Fora da quadra: cuidado permanente com a saúde e comportamento compatível com a vida atlética (disciplina).
No meu último livro, Reflexões do Esporte para o Desenvolvimento Humano (uma coletânea de textos que escrevi para o Vya Estelar, explico como a busca pelo alto nível em qualquer atividade é um processo de luta. Em nosso caso o esporte é um exemplo marcante.
A motivação, para se dedicar a determinado esporte surge inconscientemente (intrínseco – por isso a expressão motivação intrínseca) e ao se lançar com toda a energia no esporte, o dito talento é revelado. Observe que o despertar do talento é acompanhado por uma combinação espetacular entre a estrutura do esporte (características do esporte) e a estrutura física e psíquica do (a) atleta (morfologia corporal, fácil compreensão cognitiva sobre a prática do esporte e harmonia emocional).
Essa combinação de características compatível com o esporte eleito proporciona uma coerência desejável. É como se esporte e indivíduo se completassem. O exemplo dessa coerência é traduzido na frase muitas vezes dita: "O fulano parece que nasceu para jogar futebol!".
Acontece que jovens que começam a se dedicar seriamente ao esporte competitivo, especialmente após os 14 anos de idade, experimentam as grandes dificuldades para se manter em regime de treinamento a fim de chegar ao nível de excelência. Observe apenas uma dessas barreiras: escola.
"Nossa escola" ainda não aprendeu a conviver com o talento esportivo e, portanto, não consegue se adaptar ao estilo esportivo (rotina e demandas de treino e competições). Em exemplo, veja os talentos para o tênis. Há uma dificuldade enorme de atletas que disputam torneios pelo Brasil (e alguns no exterior) seguirem a rotina escolar sem um apoio especial. O (a) jovem tenista e a família enfrentam a administração de uma dura rotina de forma unilateral. São várias horas de treinos diariamente, viagens para torneios e outros sem nenhum apoio da escola na grande maioria dos casos.
Como resultado, esses talentos abandonam o estudo ou começam a fazer cursos quase que "fictícios". No voleibol, futebol acontece o mesmo fenômeno e também em alguns outros esportes. Digo alguns outros, porque quando o (a) jovem talentoso (a) atinge 17 anos e seu esporte não prevê (em hipótese), retorno financeiro tradicional (exemplo: maioria dos esportes olímpicos), possivelmente a família, o convence que é hora de parar e tentar entrar em uma universidade.
Como nosso esporte universitário é inexistente, muitos desses talentos e futuros promissores profissionais abandonam o esporte.
Essa é apenas uma barreira. Não falei sobre infraestrutura, orientação profissional de qualidade, estímulo financeiro (custos da prática esportiva), reconhecimento e outros. Somadas, todas essas e outras barreiras, aquele que consegue vencer essa etapa e se tornar um atleta em nível de excelência merece (a família também!) todo reconhecimento pelo esforço.
Talvez seja por isso (tantas dificuldades), que nossos atletas de sucesso, sejam considerados heróis! Por um lado, isso não é muito bom, pois se são poucos os heróis é sinal que são poucos atletas, pouco sucesso, pouco incentivo, pouca atração, pouco oferecimento, pouco, pouco, pouco… Brasil!