Cartão de visitas ou de identidade?

por Roberto A. Santos

Vivemos a realidade das redes sociais. No entanto, não dispensamos o bom e velho cartão de visita: aquele em papel de diferentes gramaturas, cores e fontes; sóbrios ou bregas, mas com uma só finalidade: mostrar que temos uma identidade!

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Esses cartões começaram na Corte Francesa nos tempos de Luis XIV, e depois foram exportados para outros países da Europa, Estados Unidos e nós. Em sua origem, havia uma distinção muita clara entre os cartões de "visitas" e os "de negócios". Por isso, em inglês, se fala em "Business Cards", quando se refere àqueles milhões de cartões que as pessoas trocam diariamente entre si. A maioria deles com um único destino: um breve estágio numa caixa ou gaveta e depois o lixo. A não ser que possuam alguma obsessão doentia e façam parte de uma Associação de Colecionadores de Cartões de Visita dos Estados Unidos (claro…) que tem, inclusive, suas convenções anuais. Se você não acreditar, visite www.watervalley.net/users/jgurner/bizcards

Mesmo sabendo-se daquele destino, o momento de troca de cartões é indispensável na etiqueta dos negócios, tanto que poderia afirmar que: O primeiro cartão de visitas, a gente nunca se esquece!… Nas empresas, a outorga daquele pedacinho de papel, com o logotipo e outros dados da empresa, o nome do portador e, mais importante, seu cargo no organograma, é um sinal de distinção que poucos recebem. E, cada troca de cartão por um novo, com cargo mais importante, é um símbolo de nosso progresso na vida profissional e social.

Por isso, quando um profissional recebe uma promoção, pouco tempo depois de saborear a notícia, o aumento salarial, etc, ele já liga para Compras para encomendar seu "novo" cartão, turbinado pelo degrau que subiu na escalada corporativa. Logo que pode, prazerosamente, destrói o passado e passa a portar sua nova identidade profissional: "Agora sou um Analista Sênior!" — não mais aquele simples Analista Pleno que me humilhava perante meus contatos mais afortunados.

Não é por menos, que algumas empresas economizam um bom dinheiro com remuneração direta e indireta, dando títulos e, claro, cartões de visita com um "Vice-Presidente de Assuntos Aleatórios" bem reluzente, quando sua autonomia para tomar decisões, não ultrapassa da compra da pizza para acompanhar sua horas extras. Assim como os títulos da nobreza e de "Comendador", os títulos de cargos definem a identidade das pessoas, sua posição na Sociedade.

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Contudo, nem tudo na vida são flores, ou melhor, podem até ser, mas para um funeral. Quando um funcionário é demitido de sua empresa, mesmo que, geralmente, não lhe peçam de volta seus cartões de visita, como tiram seu crachá (primo plástico do Cartão), seu acesso à rede, ele será impedido moralmente de ostentar aquele cartão que lhe dava uma identidade: "Eu sou o Alberto da XPTO." De repente, ele é "apenas" o Alberto – em busca de uma recolocação, buscando novos desafios, passando por um período sabático (esse é o mais chique de todos…) e outros eufemismos para o Alberto Desempregado, na Rua da Amargura, sem título, sem sobrenome, sem identidade.

O mundo de hoje não é mais aquele do emprego do "berço à sepultura" de nossos avós, em que mudar mais de duas vezes de emprego em toda vida útil era um sinal de instabilidade profissional, escrutinado nas entrevistas de seleção, sinal de lealdade imperdoável. Hoje em dia, quase que ao contrário, desconfia-se daquele que trabalhou apenas em uma ou duas empresas. "Será que ele tem a flexibilidade que precisamos?"

Além disso, vivemos num mundo em que o mais prevalente são mais "ocupações" do que os "antigos" empregos. Somos terceirizados, free-lancers, micro-empresários, autônomos, navegando e sobrevivendo na crescente Economia Informal. Muitos profissionais assumem, temporária ou definitivamente, esses "apelidos profissionais", sem aquele charme e poder dos títulos que aparecem nos organogramas e se refletem nos Cartões.

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Some-se ainda, o frenético ritmo das Fusões e Aquisições. Nunca se sabe quem poderá comprar a empresa para a qual se trabalha ou qual poderá ser adquirida pela sua… Por conseqüência, empregar-se e desempregar-se passam a ser eventos, mais e mais rotineiros na vida dos bons profissionais do mercado.

Então, como fica a questão da identidade? Como conviver com aqueles lapsos de tempo em que não temos Nome e Sobrenome Profissionais, isto é, título de cargo e nome de empregador? Quando não temos um Cartão com patrocinador!

1. Sua identidade vem antes do cargo

Segundo Robert Hogan, uma das maiores autoridades em Psicologia da Personalidade, nossa personalidade é uma mescla da Identidade e Reputação. Nossa identidade é constituída por nossos valores, nossos interesses, preferências, vocações, etc que se forma muito antes de ocuparmos um cargo numa empresa. Boa parte de nossa identidade já está formada ao final da adolescência, é a base de nosso caráter. A outra parte é aquela que se forma através de nossas interações sociais. Nossa reputação de uma pessoa extrovertida ou retraída, prudente ou atirada, sensível ou duro e franco e assim por diante.

Este segundo ingrediente pode tomar uma forma ou outra através das experiências profissionais que temos ao longo da carreira. Entretanto, ambas formam nossa Personalidade, o quê não tem nada a ver com a empresa para a qual trabalhamos e o cartão de visitas que carregamos em nossas carteiras. Esta "pessoa" precisa ser resgatada e valorizada, principalmente, nos momentos de crise, para nós mesmos. Daí, nestes momentos, precisamos esquecer aquele "sobrenome empresarial" e refletir sobre quem somos e o que queremos ser em nossas vidas.

2. Cartões de visita são ferramentas – use-os como tal

Além da baboseira da etiqueta originada na Corte Francesa, os Cartões de Negócios ou de Visitas, que sobrevivem até o presente, devem ser encarados como uma simples ferramenta para "networking" com os contatos que potencialmente nos serão úteis em nossas interações. Eles não definem quem você é! Afinal, quando você está filiado a uma empresa, você não controla quando terá um cartão e o que será escrito neles, certo? Sua ferramenta deve conter, essencialmente, seu nome e como contatá-lo. O resto é temporário… Mais importante do que o que está impresso no cartão, são as impressões que você provoca em cada contato interpessoal, em que solidifica sua reputação pessoal e profissional, positiva ou negativa.

Tirante esta reflexão sobre os cartões de identidade, restam as questões menores sobre a etiqueta do uso de cartões de visita – cartão maior ou menor, alto relevo, fundo colorido, com foto, em braile, em que momento entregar, etc. Prefiro deixar estes temas para os especialistas em design gráfico, marketing e mestres da etiqueta social. Minha mensagem é a de se conhecer para definir sua identidade e saber sobre sua reputação pois, no longo prazo, é isso que vai definir o futuro de sua carreira e sua realização pessoal.