por Danilo Baltieri
"Uso maconha todos os dias há quase cinco anos. Quero engravidar e gostaria de saber quanto tempo antes de começar a tentar, devo para de fumar para não ter nenhum resquício de cannabis no meu organismo que prejudique o feto?"
Resposta: Muitos estudos ao redor do mundo têm revelado associação entre o uso regular de cannabis durante a gestação com prejuízos para o feto em termos de influência negativa sobre o crescimento, circunferência craniana, peso e futuro funcionamento cognitivo.
Grande parte desses estudos demonstra que vários outros fatores se somam para ocasionar danos ao feto, como consumo de tabaco, inabilidades sociais, inadequada alimentação e consumo de outras substâncias como o álcool e outras drogas.
O consumo regular anterior ao início da gestação também tem sido associado com prejuízos ao feto, principalmente devido aos outros fatores associados com esse uso.
Uso de substâncias psicoativas durante a gravidez (e antes dela), infelizmente, é bastante comum. Pesquisas epidemiológicas confirmam esse preocupante fato.
No Canadá, por exemplo, estima-se que 14% das mulheres fizeram uso de bebidas alcoólicas durante a última gestação, bem como que 17% registraram uso de tabaco. Nos Estados Unidos da América, cerca de 5% das mulheres gestantes referiram consumo de drogas ilícitas, e, dentre essas, principalmente a maconha.
Diante de dados como os acima mencionados, bem como das consequências altamente nocivas advindas do consumo de substâncias, tanto para a mãe quanto para o feto, diretrizes têm sido desenvolvidas para padronizar e aperfeiçoar o manejo e tratamento das mulheres que desejam engravidar ou mesmo já se encontram gestantes. Assim, tem sido consenso atualmente que toda mulher gestante ou desejando tornar-se, independentemente do seu nível sócioeconômico, deve ser adequadamente informada sobre o problema do consumo de substâncias e, caso faça uso de alguma, encorajada veementemente a cessar tal uso. Os médicos devem usar meios claros e fidedignos de acessar esse problema entre as suas pacientes gestantes. Se a paciente revelar o consumo de substâncias, o tratamento especializado deve ser instituído para promover a sua interrupção.
Existem alguns fatores, tanto por parte das pacientes, quanto por parte do sistema social onde vivem, que dificultam o manejo do problema do consumo de substâncias entre as gestantes. Dentre os fatores pessoais, podemos citar: vergonha, estigma associado ao status de ser usuária de drogas, culpa, existência de parceiro que também faz uso da substância, medo de “perder” o bebê, etc. Dentre os fatores relacionados ao sistema social, podemos citar: falta de apoio familiar, falta de profissionais altamente especializados na matéria, falta de serviços destinados ao manejo das gestantes com problemas com o uso de substâncias.
A preocupação que você demonstra é bastante oportuna. Antes de engravidar, você deve cessar o consumo de cannabis e de outras substâncias que porventura faça uso, como por exemplo o tabaco, com a finalidade de não causar quaisquer prejuízos ao seu filho. Como você faz uso diário dessa droga há cinco anos, é bastante possível que tenha dificuldades para abandoná-la ou mesmo experimente sintomas desagradáveis quanto das tentativas para suspensão.
Dessa forma, você deve consultar um médico especialista com a finalidade de promover e manter a sua abstinência, bem como prevenir recaídas. Grande parte daqueles que padecem de um quadro de síndrome de dependência apresenta recaídas ao longo do tratamento. Dessa forma, um tratamento iniciado agora, concomitantemente a um seguimento ginecológico, seguramente a ajudarão a decidir qual o melhor momento para planejar sua gestação saudável. O ideal é que você inicie a sua gestação livre de qualquer substância psicativa, como a maconha, e possa manter esse status durante a gravidez, período de amamentação e, seguramente, durante os próximos anos da sua vida.
Abaixo, forneço importante referência sobre o tema:
Wong S, Ordean A, Kahan M. (2011). SOGC clinical practice guidelines: Substance use in pregnancy. International journal of gynaecology and obstetrics: the official organ of the International Federation of Gynaecology and Obstetrics;114(2):190-202.