por Angelo Medina
“A primeira ideia que precisa ser lembrada é que a dor passa. Pode demorar, mas um dia terá passado. Ou, pelo menos, diminuiu a ponto de não incomodar mais”
“Há formas mais ou menos sadias, ou seja mais ou menos realistas no sentido de entender que perdas fazem parte da vida.”
O experiente psiquiatra Luiz Alberto Py (71) acaba de lançar o livro Amor e Superação (Editora Rocco), onde aborda um tema difícil e desafiador como diz o próprio subtítulo do livro: Como enfrentar perdas e viver lutos.
Py iniciou sua prática clínica ainda na faculdade em 1962. Ele completa em 2012 cinquenta anos de atuação em psiquiatria, psicoterapia e psicanálise. Há quase 25 anos no mercado editorial, Luiz Alberto Py já publicou oito livros, parte deles com edições já esgotadas. Nos cinco últimos lançamentos ultrapassou a casa dos 53 mil exemplares vendidos. Ele prepara para 2011 uma autobiografia voltada para sua vida profissional, ainda sem título.
Nesta entrevista inédita e exclusiva ao Vya Estelar, o psicanalista aponta caminhos de esperança para quem enfrenta esse difícil momento de luto e perda. Ele traz uma luz de tranquilidade para quem está nessa situação e sofre.
Vya Estelar – A perda de um ente querido, por ser ligada diretamente à morte, é um problema insolúvel. Por que você decidiu escrever um livro sobre um tema tão difícil? Isso foi um desafio para você?
Luiz Alberto Py – Fui motivado pelo grande numero de cartas e apelos que recebo de pessoas passando por crises de perdas amorosas e também por ter sofrido pessoalmente grandes perdas. Minha experiência me ensinou bastante e achei que escrever sobre este tema poderia ajudar muitas pessoas.
Vya Estelar – Dia 08 de dezembro fez exatos trinta anos que John Lennon foi assassinado. Tive a oportunidade de ver um relato de Yoko Ono. Ela disse que quando soube da notícia teve um surto, não acreditava no que havia ocorrido e se debatia no chão muito desesperada. Mas em meio a essa terrível crise, teve um lampejo de racionalidade e pediu para que a mídia televisiva segurasse a notícia por uma hora, para que seu filho Sean de cinco anos não visse a notícia pela TV. Pode-se dizer que a autoestima a manteve “minimamente erguida” naquele momento?
Luiz Alberto Py – Eu prefiro dizer que foi o amor de mãe, mais do que a autoestima que a ajudou nesse terrível momento.
Vya Estelar – De que forma a autoestima nos ajuda a lidar com o luto e a perda?
Luiz Alberto Py – É uma longa reflexão. Toda a parte final de meu livro se ocupa disso. Sinto-me incapaz de resumir sem dar falsas impressões, mas posso dizer que a autoestima é crucial para nossa sobrevivência, principalmente nas horas mais difíceis.
Vya Estelar – Por que temos tanto medo de perder quem amamos?
Luiz Alberto Py – Muitas razões. Basicamente temos medo de perda em geral. Medo de mudança também. Por vezes isto é resultado da tendência que temos de valorizar o externo em detrimento do interno. Ou seja, damos mais valor ao “ter” do que ao “ser” e isto tem a ver com baixa autoestima.
Luiz Alberto Py: “É preciso recolocar a dor da perda em seu devido lugar. Não se trata de banalizar, mas de aceitar os sofrimentos que fazem parte da vida de todos”
Vya Estelar – Exemplo de uma perda de um ente querido com uma “tragédia mais grave”, pode ser reconfortante para outrem que perde seu ente querido por morte natural? Ou só mesmo a pessoa pode medir a sua dor que é única?
Luiz Alberto Py – A noção – falsa – de que nossa tragédia é única, ajuda a agravar a dor. Quando percebemos que todos, mas todos mesmos, têm histórias de perdas entendemos que é preciso recolocar a dor da perda em seu devido lugar. Não se trata de banalizar, mas de aceitar os sofrimentos que fazem parte da vida de todos nós.
Vya Estelar – Já vi psicólogos explicarem que o processo de perda e luto tem cinco etapas. O senhor concorda com isso?
Luiz Alberto Py – Concordo, mas tenho observado que essas etapas (negação, negociação, tristeza, revolta e aceitação) se alternam. As pessoas geralmente oscilam entre essas diferentes fases e mesmo quando atingem a aceitação, costumam regredir para fases anteriores até que, aos poucos, conseguem – nem todos – solidificar a aceitação.
Vya Estelar – Como lidar com esse luto ou perda num primeiro momento (dias e primeiros meses) e depois a médio prazo?
Luiz Alberto Py – Cada um de nós tem seus métodos aprendidos dos exemplos observados ou os constrói intuitivamente. A primeira ideia que precisa ser lembrada é que a dor passa. Pode demorar, mas um dia terá passado. Ou, pelo menos, diminuiu a ponto de não incomodar mais. Outro ponto importante para ser lembrado é que a gente não merece o sofrimento, ninguém merece, mas ele existe assim mesmo. No livro “Amor e Superação”, procuro sistematizar as formas saudáveis de lidar com as perdas e com o sofrimento que elas nos causam.
Vya Estelar – Quanto tempo uma pessoa leva para superar essa perda? Esse tempo pode ser aumentado quando a morte é inesperada, por acidente e tragédia? A abordagem terapêutica é diferente em função do tipo de morte?
Luiz Alberto Py – Quanto mais inesperada for a perda, maior o tempo necessário para superá-la. A abordagem terapêutica varia em função da personalidade da pessoa e da forma como ela procura conduzir seu luto e administrar seu sofrimento. Há formas mais ou menos sadias, ou seja mais ou menos realistas no sentido de entender que perdas fazem parte da vida.
Vya Estelar – O término de um relacionamento amoroso – seja namoro ou casamento – pode ser comparado realmente ao luto de quem de fato morreu?
Luiz Alberto Py – Na minha experiência, muitas vezes o término de um relacionamento representa uma dor maior do que a da morte de uma pessoa querida. Um dos elementos importantes para que isto aconteça, é o fato de que existe uma expectativa otimista quanto à relação. Outro elemento também importante consiste no fato de que quando uma pessoa abandona a relação com a outra, o abandonado se sente negativamente julgado por quem o deixou e valoriza a opinião de alguém que foi tão próximo. Sente-se, portanto, mal avaliado, desvalorizado o que reflete negativamente na autoestima.
Vya Estelar – Até que ponto a fé e a religião ajudam a reconfortar quem perdeu alguém? Inclusive é muito comum pessoas se tornarem espíritas kardecistas depois que têm essa perda. Já que essa religião até possibilita um vínculo com o “outro lado”. Concluindo a pergunta: um ateu sofreria mais que uma pessoa que tem fé e religião?
Luiz Alberto Py – A fé ajuda muito, em todos os sentidos. Kenneth Cooper – o famoso criador do método de corrida que leva seu nome – escreveu um livro cujo título é: “E melhor acreditar” onde mostra estatisticamente que as pessoas que possuem fé vivem mais e melhor. É pena que fé não seja algo fácil de ser adquirido ou desenvolvido.
Bibliografia de Luiz Alberto Py
1. Grupo sobre grupo – editor – Rocco, 1987 (esgotado)
2. A linguagem da saúde – parceria com Haroldo Jacques – Elsevier (Campus), 1998 (esgotado)
3. O caminho da longevidade – parceria com Jairo Mancilha – Rocco, 2001
4. Olhar acima do horizonte – Rocco, 2002
5. A felicidade é aqui – Rocco, 2003
6. Saber amar – Rocco, 2006
7. Mistérios da alma – Best Seller (Record), 2007
8. Amor e superação – Rocco, 2010
Amor e Superação mostra importância da autoestima para poder lidar com a perda e o luto