por Elisandra Vilella G. Sé
Vivemos um momento caracterizado pelo rápido envelhecimento populacional. O envelhecer é um processo normal que caracteriza uma etapa da vida do homem. O aumento do número de pessoas idosas tem sido observado em Grupos de Terceira Idade, no ambiente familiar, nas grandes cidades, clubes e também nos locais que prestam serviços de saúde (hospitais, prontos-socorros, centros de saúde, clínicas particulares e ambulatórios).
Mas a maior parte da vida, as pessoas passam mesmo é no contexto da família. É no seio familiar que vivem os idosos saudáveis, com velhice bem-sucedida, velhice normal e também os idosos com algum tipo de fragilidade. O cuidado da saúde das pessoas idosas geralmente envolve companhia de amigos, familiares, serviço de um profissional, ajuda e apoio emocional e instrumental, situações em que surgem muitas dúvidas e dificuldades.
Os cuidados com idosos em casa, principalmente quanto esses se encontram mais dependentes, freqüentemente ficam sob a responsabilidade do cônjuge, de filhas, noras, netas, e outras, as quais enfrentam situações difíceis.
O cuidador que irá dar assistência ao idoso, quer seja em casa, em instituições de longa permanência, casas de repouso ou hospitais, é uma pessoa que deve ter um preparo para o cuidado com a pessoa idosa.
Cuidado: cogitare
A palavra “cuidado” deriva do latim “cogitare”, que significa imaginar, pensar, refletir, ter cuidado consigo mesmo e com sua saúde e sua aparência. Refere-se a atenção, proteção, preocupação, cautela, zelo, responsabilidade, atitudes e sentimentos que podem levar a uma relação entre as pessoas, isto é, a práticas e ações sociais, comandadas por representações simbólicas acerca da solidariedade.
O cuidado prestado à pessoa idosa no contexto da família é influenciado por muitos fatores, tais como valores, crenças, número de membros na família, recursos socioeconômicos, idade, gênero, educação. Desde o início do século passado, a sociedade tem passado por transformações em suas formas de organização. A relação entre o idoso e sua família é muito influenciada pelos modelos de família existentes na sociedade. O processo de cuidar da pessoa idosa depende da integração das relações familiares da disponibilidade de tempo e recursos pessoais e externos e da história de relacionamento com o idoso. E a família moderna está cada vez mais restrita ao grupo conjugal e aos filhos, devido às novas formas de união conjugal, a opção de casamento sem filhos, filhos sem casamento, divórcio, experiência de vários casamentos, inserção da mulher no mercado de trabalho, etc. E essa configuração familiar atual tem impacto no cuidado das pessoas idosas.
Famílias multigeracionais, por serem tradicionais, tendem a proteger e a respeitar mais seus idosos, principalmente quando esses mantêm o papel de chefe da casa, tendo assim mais autonomia, respeito e reconhecimento. Nos arranjos multigeracionais, os relacionamentos são intensos, pois as famílias são extensas, muitas vezes ainda o idoso consegue manter seu papel de conselheiro e são respeitados no grupo familiar.
A mudança significativa do papel da mulher na família refletiu na formação e em modificações nos papéis dos outros membros familiares. A mulher exercia papel central na família e atualmente ela administra outros papéis sociais, estabelecendo vínculos profissionais, de amizade e de lazer. As mudanças ocorridas na sociedade impossibilitam identificar um modelo ideal de família, sobretudo de cuidado com os membros. E essa carÊncia de modelos estáveis de estrutura familiar gera insegurança, dúvidas e conflitos, tendo os idosos que se posicionar de maneira flexível na vida para se adaptarem às mudanças.
As mudanças na dinâmica familiar ao cuidar do idoso, principalmente fragilizado e dependente podem ter efeitos positivos ou negativos para o cuidador e para o idoso que está recebendo cuidados, dependendo de como a família administra ou maneja as responsabilidades e de como enfrenta as dificuldades e situações de pressão relativas ao seu papel. Isso vai depender do estilo de vida, educação, expectativas sociais, crenças, experiências em cuidar de pessoas idosas, tomadas de decisões, capacidade de resolução de problemas práticos do dia-a-dia e situação econômica.
É importante avaliar e compreender as relações entre o idoso e sua família, os afetos compartilhados, como está a relação do idoso com o cuidador e outros membros da família. Qual o grau de aceitação da doença? Que tipo de doença e como é seu curso e prognóstico? Quais são as expectativas da família? Essas são algumas questões que afetam diretamente o contexto familiar e a prática das tarefas relativas ao cuidado desempenhadas pelos cuidadores. Diferentes tipos de doenças e de graus de fragilidade causam diferentes graus de dependência funcional ou mental, quer ocorrendo em conjunto ou isoladamente. A dependência física ou mental dos idosos acarreta forte carga de exigências para os familiares cuidadores.
De acordo com pesquisa desenvolvida pelas psicólogas e gerontólogas Cinara Sommerhalder e Anita Liberalesso Nerida Unicamp (2002), a avaliação que os cuidadores fazem do cuidado como algo oneroso não depende apenas do grau de incapacidade do idoso, mas também do tipo de doença, de seu grau de cronicidade, do seu grau de parentesco com o idoso, da história passada de relacionamento entre os cuidadores e o idoso, das relações familiares atuais e dos comprometimentos financeiros e instrumentais da família.
Importância dos grupos de apoio ao cuidador familiar
Nos países desenvolvidos, ocorrem investimentos sociais para a construção e manutenção de redes de apoio a cuidadores familiares, que amenizem o estresse causado pela atividade do cuidado, orientando os cuidadores com relação às tarefas do cuidado e apoiando nas questões emocionais. Os grupos de apoio que fornecem ajuda instrumental, cognitiva (mental) e emocional a cuidadores e familiares favorecem o seu bem-estar e a qualidade do cuidado aos idosos.
No Brasil, as famílias se organizam informalmente criando estratégias para cuidar dos seus membros idosos. As próprias famílias buscam suporte social e emocional para poder enfrentar as dificuldades em relação ao cuidado.
A importância dos grupos de apoio aos cuidadores familiares tem sido bastante documentada na literatura gerontológica. E tem sido implantado em algumas cidades brasileiras para oferecer apoio principalmente para cuidadores de pacientes com doença de Alzheimer, seja em centros de saúde ou hospitais. Esses grupos podem oferecer ajuda nas tarefas do dia-a-dia, treinamentos e orientações práticas e apoio emocional para a família que vivencia uma situação de fragilidade, dependência e cuidado. Nos grupos de apoio, as famílias trocam experiências afetivas. Isso favorece o aprendizado, o crescimento pessoal, a solução de conflitos, a tomada de decisões, etc.
É importante ressaltar que nem sempre as famílias atuando isoladamente conseguem dar conta dos desafios gerados pelas circunstâncias do cuidado e, assim, seria ideal que pudessem contar com ajuda de profissionais especializados que as assessorassem na tarefa de cuidar, visando a melhoria da qualidade do cuidado à pessoa idosa e ao bem-estar do cuidador.