por Danilo Baltieri
"Minha mãe é usuária de crack há sete meses e soropositiva há cinco anos. Quais as consequências devido à baixa imunidade do corpo?"
Resposta: Infelizmente, a sua mãe tem dois problemas crônicos que não raras vezes se superpõem. Geralmente, pacientes usuários de substâncias psicoativas, como o crack e infectados com o vírus causador da AIDS tendem a mostrar baixa aderência tanto ao tratamento do abuso/dependência das drogas quanto ao próprio manejo clínico da doença infecto-contagiosa. Isso é uma preocupação constante dos serviços médicos especializados.
Características como a própria desorganização pessoal, ausência de suporte familiar e social, pobreza, altos níveis de impulsividade, negação de problemas de saúde, experiências prévias de fracasso no tratamento e insatisfação com os serviços de saúde especializados colaboram com a dificuldade na adesão e manutenção do tratamento.
É importante salientar que, frequentemente, os pacientes soropositivos que abusam ou são dependentes de drogas, além do HIV, estão também infectados por outros agentes, como pelo vírus da hepatite B e/ou C. Dessa forma, os serviços especializados no manejo de pacientes portadores de HIV/AIDS devem estar capacitados para o manejo complexo dos seus pacientes através de equipe multi e interdisciplinar.
Além disso, ambas as doenças, abuso/dependência de drogas e HIV/AIDS têm aspectos em comum, tais como:
a) cronicidade – Aqui, é importante ressaltar que a prevalência de transtornos mentais e do comportamento, particularmente depressão, em portadores de doenças crônicas é maior do que na população geral;
b) incurabilidade – Embora haja tratamentos específicos para ambas as condições, não há cura para as mesmas;
c) limitações impostas pelas doenças;
d) estigmas associados com as doenças.
De fato, o consumo de crack pode aumentar o risco de infecção e de reinfecção pelo HIV de formas diversas. Abusuários e dependentes da droga comumente procuram pela substância repetidamente em razão da própria alteração neurobiológica causada pelo crack, possibilitando práticas sexuais inseguras e outros comportamentos de risco.
A perturbação na capacidade de julgamento e tomada de decisão, um dos sintomas de intoxicação por uso de crack, também colabora com a prática de comportamentos arriscados, como o sexo desprotegido. Também, a droga exerce influência negativa sobre o sistema imunológico, debilitando o organismo e deixando-o mais suscetível à ação do vírus, especialmente naqueles que não estão seguindo um tratamento médico adequado.
Na verdade, existem evidências de que o consumo de cocaína/crack colabora tanto com a maior exposição ao vírus causador da AIDS quanto com a progressão da doença. O sistema imunológico é composto de uma complexa rede de células e substâncias com a função primária de prevenir infecções. De fato, estudos mostram que drogas de abuso, como cocaína/crack, influenciam a ação de importantes células que compõem o sistema imunológico, como os linfócitos, os macrófagos e células dendríticas.
Também, em estudos “in vitro”, a cocaína/crack aumenta a replicação (multiplicação) do vírus nas células. Em estudos experimentais feitos em ratos, essa droga também aumenta a carga viral e diminui a capacidade do corpo em reagir contra agentes infecciosos.
A sua mãe deve e merece receber tratamento médico bastante adequado e especializado. Quanto maior for o apoio de familiares e amigos, melhor será a adesão da paciente ao tratamento. A inserção dos amigos e familiares no tratamento médico sempre será bem-vinda.
Abaixo, forneço interessante referência sobre o assunto:
Friedman H, Pross S, Klein TW. Addictive drugs and their relationship with infectious diseases. FEMS immunology and medical microbiology. 2006;47(3):330-42.