por Roberto Santos
Lembram-se do Grilo Falante, o personagem do clássico desenho animado da Disney, e do Pinóquio? Todos nós temos um desses pequenos seres, que algumas pessoas chamam de Consciência, outras de Intuição e outros temem que seja Loucura e não contam para ninguém.
“A voz de nosso grilo falante nem sempre tem razão pois, como seus ouvintes, é imperfeita. Ela pode, contudo, nos alertar para perigos e apontar caminhos que nossa razão não vislumbra. Entretanto, ela precisa ser adestrada para que não nos iluda com viagens do Ego ou que não cancele nossos voos mais altos, quando ainda estamos planejando a decolagem”
Sócrates, o filósofo grego que viveu há quase 2.500 anos, iniciou sua viagem introspectiva pelo mundo da Filosofia depois de visitar o templo de Apolo e de ter ouvido uma voz interior, que o ajudou a entender a inscrição no portal do templo: “Conhece-te a ti mesmo”. Dessa maneira, percebemos a relação da voz de nosso grilo com a jornada inacabável de procurar se conhecer.
A Voz da Consciência muitas vezes é representada pelos diálogos animados entre anjinho e diabinho, postados ao lado de cada orelha, tendo-nos como espectadores de julgamentos cotidianos: “Devo sucumbir àquela torta de chocolate e começar minha dieta na segunda-feira?” versus “Você sabe que se você não começar já, não vai ser na segunda também.” São vozes censoras que cerceiam nossas ações de natureza mais instintiva, lúdica e prazerosa.
Outros diálogos carregados de dúvidas éticas, cada vez mais raras em meios políticos e empresariais, são escutados com um viés egoísta: “Todo mundo se aproveita quando chega ao Poder, por que vou querer ser o único santo neste bordel?…” e, pronto, nunca mais se volta atrás no uso desonesto dos recursos alheios.
Provavelmente, páginas da História teriam tido destino bem diferente se o vencedor de alguns daqueles diálogos tivesse intenções mais angelicais, altruístas e ancoradas em princípios humanistas mais sólidos.
Também se chama aquela voz interior de intuição, inspiração criativa ou mesmo de manifestações do Divino. “Algo me diz que…” é uma expressão tão comum que nem nos damos conta de seu significado. O que é esse “algo” (ou seria alguém…), que nos diz que devemos aplicar na Bolsa ou no mercado imobiliário? Investir em nossa carreira atual ou dar uma guinada de 180 graus?
Aprendemos que o método correto de decidir as coisas importantes da vida é a Lógica que habita nosso cérebro. Inevitavelmente, ao longo da vida, muitos de nós descobrimos que há decisões que requerem o Sentimento como critério.
Às vezes, ouvimos aquela voz que parece vir de nossas entranhas e nos impulsiona para uma decisão que não veio do coração ou da cabeça. São aquelas ideias que podem ser divulgadas aos quatro cantos do planeta como lampejos de gênio ou caladas pelas mordaças de nossa censura interior.
Para algumas pessoas, a intuição parece algo mágico, um dom que poucos têm acesso, mas ela não depende tanto de gênios da lâmpada. Na maioria das vezes, ela é resultado do uso eficaz de nossa inteligência e experiências. Contudo, estas pouco valem se não tivermos a disposição ou coragem de darmos ouvidos, testarmos e aprendermos com a voz da intuição.
Muito já se falou sobre a importância de nos aquietarmos para ouvirmos nossa voz interior. Essa recomendação é válida tanto para aproveitarmos as mensagens de nossa intuição como para conectarmos nossa identidade — como nos vemos – e nossa reputação – como parecemos ser para as outras pessoas.
A sobrevalorização que às vezes dedicamos àquilo que nossa voz interior mais narcisista nos diz sobre como somos espertos, sensíveis, maravilhosos, pode ser maléfica quando desligada daquilo que os outros estão tentando nos dizer com seus toques de que parecemos ser ingênuos, bregas e convencidos.
Há também aquela voz mais austera e crítica que nos deixa indecisos e inseguros de nossas emoções e escolhas. Esta pode ser implacável em seu poder de nos fazer pensar mais no que pode dar errado, do que no que pode dar certo com nossos planos. Quando, subjugados por um monólogo interno negativo e derrotista, nos desconectamos de nosso potencial de nos transformarmos e de realizarmos aquilo que nossa intuição sabe que somos capazes.
Esta impressão que provocamos nos outros, seja em nossos melhores dias, como naqueles em que derrapamos do sério, é aquilo que pode nos ajudar a encontrarmos o sucesso ou que pode nos empurrar ladeira abaixo às frustrações da vida.
Nesta encruzilhada entre nos acharmos o rei da tapioca da praia ou a mosca do cocô do cavalo do bandido, é saudável recorrermos ao “caminho do meio”. A crença cega e ingênua de “Polyana” de um mundo cor-de-rosa e tudo vai dar certo, de um lado, ou, por outro, a crença cética, de Leis de Murphy (tudo que pode sair errado sairá), não traz a resposta de que muito precisamos.
A voz de nosso grilo falante nem sempre tem razão pois, como seus ouvintes, é imperfeita. Ela pode, contudo, nos alertar para perigos e apontar caminhos que nossa razão não vislumbra. Entretanto, ela precisa ser adestrada para que não nos iluda com viagens do Ego ou que não cancele nossos voos mais altos, quando ainda estamos planejando a decolagem.
A resposta, pelo ideal filosófico de Sócrates, é que o início da Sabedoria advém do “saber que nada sabemos” e, por isso, reconhecendo nossa ignorância essencial, devemos seguir a jornada do autoconhecimento, num diálogo aberto e franco com nossa voz interior, na busca de nossa verdade.
E você, como está escutando sua voz interior?