por Regina Wielenska
Segundo a mitologia grega, quando nasceu Narciso, o filho de um deus que se uniu a uma ninfa, consultou-se um oráculo para se conhecer o que estava reservado para o futuro da bela criança. Pois bem, seu destino seria viver muito, desde que jamais conhecesse seu próprio rosto.
O menino cresceu, deixou infinitas mulheres caídas de paixão por ele. Indiferente a todas, ele acabou morto por fascinar-se ao fitar a própria imagem, ao debruçar-se sobre um lago para beber da água, no calor de um dia de caçada.
A sociedade contemporânea especializou-se no cultivo ao narcisismo. Vejam as revistas femininas, cheias de manchetes como: "makeup de arrasar"; "torne-se uma musa para seu gato"; "perca medidas com a dieta das estrelas" etc. A indústria da moda não brinca em serviço, dos segmentos mais populares até o seleto universo dos estabelecimentos de luxo. Bilhões giram nesses mercados, alimentados pelo massacre da mídia sobre homens e mulheres. Cuidar de si virou um dever ilimitado, uma espécie de religião, que chega aos extremos de múltiplas cirurgias estéticas e procedimentos caríssimos desde a tenra idade.
As pessoas, nas gerações particularmente após a metade do século vinte, apreenderam rapidamente a mensagem de que mais alegrias estão reservadas aos belos, bem-vestidos, almofadinhas, boas-pintas, gatos e gatas. Os feios, malvestidos, descuidados, fora de moda e desencanados com o visual estão todos fritos, arriscados a terem de conviver com rejeições, críticas, insucessos, todos esses processos aversivos baseados na rejeição da aparência física supostamente fora dos padrões.
Na escola, o bullying exercido pelos narcisistas sobre os supostamente mais frágeis recai frequentemente nas costas de crianças desajeitadas nos esportes, obesas, com óculos, portadoras de gagueira etc. Exclusão e maldades são coisas que fazem parte do assédio físico e moral nas escolas.
Tem saída pra tudo isso? Tenho esperança que sim. Primeiro, vamos reconhecer que felizmente nem todo mundo pensa apenas em roupas, músculos, pele sem rugas, acessórios da moda. Podemos escolher partilhar do convívio com quem aceita a diversidade, com quem olha as pessoas através de seus olhos, preocupados com valores, emoções, necessidades íntimas, ideais de vida.
Na cidade de New York há tentativas interessantes de modificar o panorama socialmente desfavorável. Para ajudar as crianças a se aceitarem como elas são, a valorizarem o de melhor em cada um, transcendendo uma aparência específica, formatada pela mídia como valor supremo, construíram uma campanha educacional bem interessante. Examinem este link da proposta, infelizmente não tenho como traduzir este material para facilitar a leitura.
http://www.nyc.gov/html/girls/html/home/home.shtml
Se em cada família, sala de aula, grupo de praticantes de algum esporte ou outro contexto qualquer, procurar aplicar sobre suas ações os valores promovidos nesta e em outras campanhas, teremos chance de criar para crianças e adultos um ambiente sociocultural que promova a diversidade, a bondade, amor pelo próximo, visando uma cultura de paz e crescimento coletivo, estimulando o que de melhor houver em cada indivíduo.