por Karina Simões
Recentemente, tive a oportunidade de assistir à peça de teatro (Teatro da Vila/SP): "Fale mais sobre isso", da maravilhosa atriz Flávia Garrafa. Trata-se do cotidiano de uma psicóloga que, em meio à sua vida de mãe e esposa, atende a quatro pacientes (dois homens e duas mulheres) em seu consultório; e todos trazem como queixa o desejo de mudança.
Quero, neste espaço, ressaltar três realidades que fazem parte do universo feminino, as quais foram destacadas pela personagens da peça – a psicóloga e suas duas pacientes femininas – mas que ainda alojam-se em tabus ou realidades culturais nem sempre permissivas às mulheres no meio social:
1 – A mulher sair do romantismo de ser mãe para poder também expressar as dores de uma maternagem pelas dificuldades e contrariedades que um filho gera;
2 – Uma senhora idosa falar palavrão;
3 – Uma mulher que não pode alegrar-se porque o seu casamento acabou e, por esse fato, tem que mostrar tristeza para não ser criticada pelos conhecidos.
Ser mãe é maravilhoso, mas nem tudo são flores nessa caminhada da maternagem. Há grandes renúncias e lamentar-se parece um sacrilégio para a sociedade que condena esse gesto. É uma verdade que, muitas vezes, precisa ser silenciada para não ser alvejada pelas pedras de quem parece não ter esse "pecado" e nem aceita entrar em contato com essa verdade. Ser mãe é dom que nem todas as mulheres têm, e ter o direito de lamentar-se pelo fato de ser mãe, em determinadas horas, é natural e não demoníaco.
Ouvir uma mulher, e de idade, falar palavrão, como expressão de revolta com a vida que se finda, é violência aos ouvidos de quem a escuta, ou melhor, de quem a julga. Isto é, se for uma mulher, porque se for um homem, mesmo que idoso, nada parece de errado. Afinal, isso é a coisa mais comum que existe. Não causa perplexidade ouvir um homem pronunciar palavras chulas, mas uma mulher… E se for de idade então… Dercy Gonçalves bem sabe o preço que pagou por se permitir expressar-se!
Acabar um casamento traz em si a ideia do trágico. E se uma mulher ficar feliz porque o seu martírio (vivido à guisa de casamento) acabou, ela estará condenada a julgamentos e culpas que a reduzirão a conceitos e preconceitos quase que irreparáveis. A mulher precisa mostrar-se sofrida com o término da relação, embora o consultório se torne até um espaço de celebração pelo fim de sua opressão.
Disso tudo, pergunta-se: por que é tão comum vermos no consultório o que secretamente as mulheres negam socialmente quando se irritam com seus filhos, quando expressam suas iras em palavrões ou se alegram com o fim do casamento? Seria preconceito?
Enfim, não pretendo aqui invalidar a plena satisfação das mulheres que só sentem alegria com seus filhos. Não pretendo recriminar as mulheres que não necessitam falar palavras de baixo calão para expressarem suas revoltas e, nem muito menos, desejo dizer que as mulheres que se separam têm que sair sorrindo diante da separação. Longe disso! Quero questionar um padrão de comportamento que, cada vez mais, tem aparecido na clínica e a dificuldade dessas mesmas mulheres revelarem seus sentimentos em outros espaços sociais.
Indubitavelmente, estamos em tempos de "mudanças". Se for certo ou errado, um ou outro comportamento, não é esse o objeto deste artigo.
O que é certo ou errado fica na cabeça de cada um, de acordo com seus valores enquanto ser, mas não pela condição de gênero: homem ou mulher. É o que penso.
Estamos vivendo novos tempos de "mudanças", e o fato é que precisamos "falar mais sobre isso!"