por Elisandra Vilella G. Sé
A aposentadoria é um evento de transição. Trata-se de um rito de passagem e por acontecer numa idade avançada, é sempre associada à velhice ou a um momento de redefinição de metas. É um período adaptativo ou uma fase para se ocupar com outras atividades e perspectivas.
Se aposentar pode significar para muitos um período difícil e de tensão, principalmente no contexto da sociedade em que vivemos. Interromper um fluxo de atividades, de anos de dedicação não é tarefa fácil, por mais que se canse do trabalho, do emprego, da rotina. O trabalho é a ação que enobrece o homem e quando chega a aposentadoria, o ser humano vive uma ambiguidade, uma contradição. Todos querem se aposentar, mas continuar na “roda viva” sem vinculação à velhice, a algo descartável, desvalorizado.
O conceito de trabalho tem sido alterado ao longo dos anos. O homem sempre trabalhou e trabalhará, pois o trabalho é uma ação essencialmente humana, faz parte da sobrevivência, do princípio da cooperação, da organização de grupo e da perspectivação da vida. O trabalho associa-se ao momento do plantio, da colheita, da semeadura. E toda ocupação útil é trabalho para quem realiza aquilo que sabe e lhe dá prazer e recompensa.
A aposentadoria nos tempos de hoje ainda se configura como um marco importante na vida adulta. Pessoas idosas, por exemplo, vivem felizes por serem aposentadas, mas muitos precisam ainda se engajar em ocupações para manter seu sustento, ajudar a família, contribuir com o orçamento doméstico. Dessa forma, a economia precisa ser reformulada; necessita-se criar políticas públicas para garantir uma velhice saudável e bem–sucedida à sociedade.
Idosos que não conseguem se engajar em outras atividades ao longo da vida, com significado, podem se deprimir. Isso depende dos valores educacionais para o trabalho, os quais foram formatados pela própria ideologia do mundo do trabalho.
Por muitos anos somos condicionados a um estilo mais “seguro” de trabalhar que é ser um assalariado, com uma rotina, registrado em carteira. E… num belo dia irá se libertar desse trabalho rotineiro, gozar a vida, desfrutar do lazer, aproveitar o tempo com a família com a conquista da aposentadoria. Porém, muitas pessoas e instituições não se preparam para essa fase da vida, para a chegada da aposentadoria, para vivenciar o que chamamos de desengajamento da vida do trabalho. Muitas pessoas enxergam como um momento de ruptura das redes de relações, um momento que terá que se desapegar de seu ambiente e objetos de trabalho, um momento que irá se sentir descartado e inútil.
Muitas vezes esquecemos como a vida se processa e não queremos mudar de idade e de fases, nem de casa, nem de família, nem de deixar de trabalhar. Na engrenagem da vida tudo é um processo adaptativo e isso significa compreender, ajustar os significados, redefinir as metas e propósitos. E para isso muitos precisam de ajuda. Empresas e instituições podem auxiliar com ações voltadas para a preparação da aposentadoria do funcionário.
Quando se é autônomo também torna-se necessário um ajuste, de busca de alternativas de viver bem o trabalho sem se aposentar, dando continuidade àquilo que se conquistou ou criou, seja passando o bastão, contando com as outras gerações ou se ocupando de uma outra forma no mesmo trabalho. O saudável é na medida do possível experimentar alternativas, viver com sentido, mantendo-se ativo, com bom humor, recompensado, desempenhando papéis; sejam simples ou importantes. Isso com autonomia, executando o que gosta e o que vier de forma plena e sem alterar tudo radicalmente.
Se a aposentadoria ocorre aos 60, 65, 70 ou 75 anos, isso não é o essencial e sim estarmos cientes que a vida tem mesmo fases. Mas o mais importante é a reforma íntima de princípios, valores, conceitos que se adquirem por toda uma vida trabalhando, se dedicando com o coração aberto naquilo que gosta ou escolheu fazer. Aposentar pode ser continuidade, renovação, aprendizado, recolocação, porque uma pessoa com bagagem terá sempre habilidades e perspectivas.