por Monica Aiub
Tenho percebido, não sem algum desgosto, nosso grau de credulidade. Somos de boa fé, acreditamos que o outro diz a verdade, principalmente se esta vier em tom assertivo, com voz pausada e cadenciada, bem empostada, ou seja, se houver uma boa oratória.
Quantas vezes você, leitor, aceitou algo como verdade simplesmente porque seu interlocutor foi suficientemente convincente?
Quantas vezes, antes de aceitar o que lhe estava sendo apresentado, avaliou a validade do argumento, verificando se tais conclusões poderiam ser derivadas de seus pontos de partida ou pesquisou sobre o assunto, buscando certificar-se dos dados que lhe estavam sendo apresentados?
Argumentos pautados na autoridade são absorvidos com mais facilidade. Afinal, se alguém é “autoridade” ou “especialista” em algum assunto, por que não crer em suas afirmações sobre este mesmo assunto?
Muitas vezes acreditamos que a pessoa seja especialista em um assunto pelo simples fato dela afirmar ser. Raramente solicitamos suas credenciais, suas habilitações ou questionamos a qualidade de sua formação ou um possível erro em sua avaliação sobre o assunto – a que todos nós estamos sujeitos.
A lógica é, historicamente, um instrumento muito útil para que possamos verificar a validade de um argumento. Porém, nem sempre fazemos uso dela. Aliás, a cada dia nos distanciamos mais dela, devido, principalmente a uma espécie de “demonização” da lógica no senso comum, como se alguém, por fazer uso dela, fosse retrógrado, rígido, intolerante. Houve uma confusão – talvez proposital – entre o rigor necessário à lógica, que nada mais é do que um método para validação de raciocínios e argumentos, ou seja, rigor metodológico, e a rigidez daquele que não está disposto a pensar junto com o outro, a ver a partir de outra perspectiva. Com o uso da lógica, as perspectivas podem ser vistas e avaliadas com mais precisão, com mais detalhes e os erros de raciocínio – propositais ou não – podem ser facilmente identificados.
Estudar lógica e fazer uso deste instrumento é fundamental para que não sejamos enganados, para que possamos averiguar de onde o interlocutor parte, onde ele chega e, principalmente, se pode derivar de seus pontos de partida (em lógica chamados de premissas) aquela conclusão que nos apresenta. Perguntas fáceis de se fazer: como você chegou a esta conclusão? O que o leva a pensar desta maneira? Que dados você tem sobre o assunto que lhe permitem concluir isto? E as respostas devem nos permitir acompanhar o pensamento do outro passo a passo. Se ele não souber explicar, podemos refazer o caminho percorrido por ele juntos. Podemos? Se não pudermos, como aceitar o que o interlocutor nos diz, ainda que encantadoramente dito?
Além do estudo da lógica, que nos auxilia a observar a validade dos argumentos, é preciso que verifiquemos, também, a verdade das premissas, ou seja, se o ponto de partida daquele que nos fala é ou não uma verdade, pode ou não ser verificado, compreendido ou realizado no real.
Temos, e a cada dia mais, informações sobre todos os assuntos a nosso dispor. Pesquisamos, mas nos contentamos com os primeiros dados encontrados sobre determinado assunto. Como você, leitor, pesquisa os dados que necessita saber para tomar suas decisões? O que ou a quem consulta?
Antes consultávamos livros e nos preocupávamos com a fidedignidade das fontes. Se um autor não apresentava os resultados de suas pesquisas de modo claro, objetivo, com um caminho que pudesse ser percorrido por qualquer um que tentasse refazê-lo, chegando às mesmas conclusões, não o considerávamos uma boa fonte.
Hoje, ouvimos falas no Youtube, muitas delas piadas feitas por pessoas que buscam popularidade para monetizar seus canais, e as assimilamos como verdades. Fechamos nossos grupos, nos quais alimentamos uns aos outros com nossas “verdades”, que não são compartilhadas com qualquer um, mas com aqueles que pensam como nós. E validamos uma “verdade” pelo número de acessos de um determinado post ou canal. Podemos definir uma verdade pelo critério maioria? Ou será preciso verificar comprovações, realizar pesquisas, observar e comparar dados etc. A investigação é cada vez mais necessária e cada vez menos nos dispomos a tal.
Quantas vezes você foi enganado e depois descobriu que poderia ter evitado uma série de problemas se tivesse feito algumas pesquisas sobre o que lhe disseram? Quantas vezes você foi prejudicado por desconhecer uma legislação que está disponível para qualquer cidadão? (Aliás, é obrigação do cidadão conhecê-la). Quantas vezes confiou em alguém e foi enganado? Quantos enganos e sofrimentos poderia ter evitado se buscasse as fontes das informações que lhe foram passadas?
Fica a dica: lógica, pesquisa, investigação nunca são demais.
Se a desconfiança é um padrão construído historicamente, como já apresentado nesta coluna (veja aqui), ele já foi instaurado. Nossa credulidade pode ser uma forma de transformar o padrão instituído, unindo as pessoas, gerando construções compartilhadas, mas também pode ser uma forma de nos alienarmos, de sermos enganados, de nos colocarmos em armadilhas que podem gerar muitas perdas e sofrimento.
Como distinguir entre estas distintas situações? Conhecimento nunca é demais! Mas precisa vir de fontes também confiáveis, pois muitos “edifícios de conhecimento” foram construídos sobre bases falsas e só nos levarão a ruínas. Enfim, caro leitor, pesquise, mas não se contente com respostas convincentes, sem antes avaliar se pode, de fato, ser convencido por elas.