por Arlete Gavranic
Essa é uma ilusão ou desculpa usada por muitas pessoas.
Frequentemente ouvimos algumas pessoas insinuando que precisam de novos estímulos ou que a traição pode ser uma forma de despertar e, em consequência, melhorar a vida sexual do casal.
Hoje temos uma perspectiva de que 69% dos homens traem e aproximadamente 46 a 50% das mulheres também. Os motivos são muitos: vingança, distração, autoafirmação, alimentar o papel social frente a amigos, paixão, vício e até neurose.
A traição pode trazer diferentes consequências ao relacionamento “oficial”. Muitos apesar de sentirem-se renascendo, ainda carregam culpa, e passam achar que todos os problemas ou dificuldades vividas sejam um sinal de punição. Com isso, a alegria que havia sido despertada e revigorada pode se tornar uma culposa tristeza ou ansiedade.
Outra consequência da traição pode ser um reforço na autoestima e na autoconfiança. É como se a pessoa que trai, sentisse que ainda é desejada, que ainda ‘tem cacife na praça’ – fala essa de muitas pessoas que atendi. Esse valor pessoal que estava esquecido pode ser resgatado e levar a pessoa a olhar para si mesma, para o quanto precisa valorizar seu prazer. Mas isso pode colocar essas pessoas numa busca de viver o prazer e se cuidar, mas imbuir também uma fase mais egoísta, mais narcisística e comprometer ainda mais a intimidade no relacionamento.
Também vamos encontrar em alguns pares uma atitude mais provedora. É uma forma de aliviar a culpa, não permitindo que haja carências materiais, mas em geral o mesmo não vai acontecer na relação.
No momento de despertar para um caso, uma paquera ou uma saída apenas para um programa, um clima de envolvimento e interesse se instala, e não há como negar que esse é um fator gerador de distanciamento do casal.
É como resgatar a fase de enamoramento. Pensamos muito no encontro, passamos a desejar encontrar, olhamos só para o lado bonito da outra pessoa. Se for mais jovem, só olharemos para a beleza e a jovialidade; se for mais velha, iremos apreciar sua experiência de vida, suas conquistas e superações. Também mostramos o nosso melhor. E aí, como a situação prazerosa de conquista está experimentada, na maioria das vezes o investir no prazer sexual e na libido será vivido e satisfeito na relação ‘extraconjugal’.
Com tudo isso, temos que perceber que nem sempre haverá vontade ou libido para querer olhar para o relacionamento ‘oficial’, que muitas vezes está com seus desgastes acumulados; olhar o que incomoda e precisa mudar, as manias, os defeitos já conhecidos, ou olhar para o que acomodou e o quanto falta de investimento afetivo-sexual no relacionamento.
Resgatar uma sexualidade que reflete o afastamento do casal dá trabalho, e muitas vezes a euforia vivida na nova paquera é tão satisfatória que sobra pouco para investir na relação.
Quero deixar claro que essa não é uma visão pessimista, mas uma leitura de 21 anos de clínica e de experiência de vida!
A ilusão de que uma traição vai apimentar a relação pode aumentar muito mais o distanciamento e machucar mais ainda, ao invés de ajudar a reconstruir muitas relações, que podem ainda ter um caminho ‘feliz’.